Bondade e Sabedoria devem ser Inocentes
Quando a bondade se mostra abertamente já não é bondade, embora possa ainda ser útil como caridade organizada ou como acto de solidariedade. Daí: «Não dês as tuas esmolas diante dos homens, para seres visto por eles». A bondade só pode existir quando não é percebida, nem mesmo por aquele que a faz; quem quer que se veja a si mesmo no acto de fazer uma boa obra deixa de ser bom; será, no máximo, um membro útil da sociedade ou zeloso membro de uma igreja. Daí: «Que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua mão direita.»
(…) O amor à sabedoria e o amor à bondade, que se resolvem nas actividades de filosofar e de praticar boas acções, têm em comum o facto de que cessam imediatamente – cancelam-se, por assim dizer – sempre que se presume que o homem pode ser sábio ou ser bom. Sempre houve tentativas de dar vida ao que jamais pode sobreviver ao momento fugaz do próprio acto, e todas elas levaram ao absurdo.
Passagens sobre Ação
780 resultadosCerto dia, atrasei-me ao voltar da escola e meus pais pensaram que eu havia sido seqüestrado. E aí entraram imediatamente em ação: alugaram meu quarto.
A ação põe o ardor no trabalho, mas é a palavra que a suscita.
Cada homem age por si, segundo um plano próprio, mas o resultado é uma acção social, em que outro plano, externo a ele, se realiza; e com os fios crus, finos e desfeitos da vida de cada um, se tece a teia de pedra da história.
A Fidelidade é a mais Integral de todas as Virtudes Humanas
A fidelidade (…) é a mais integral de todas as virtudes humanas. O homem participa numa batalha e, sem a fidelidade, não conhece a sua luta; apenas usa da violência, interpreta uma vontade, é instrumento de uma opinião. A fidelidade move-o desde a sua origem, é a primeira condição da consciência. Não se efectuam coisas novas sem fidelidade. Não se engrandece a piedade ou se priva com o mais simples sentimento, sem a fidelidade. Uma acção progressiva tem que ter raízes tumulares, raízes naquilo que encerrámos definitivamente – uma era, um conhecimento, uma arte, uma maneira de viver. A fidelidade, disse eu, assegura-nos o tempo de criar e o tempo de destruir o que se tornou inconforme à imagem do homem. Nada é digno de valor, sem fidelidade.
O erro consiste em supormos que a acção tende para o prazer, pois o prazer acompanha a acção.
O anônimo tem possibilidades infinitas de ação — se os famosos o permitirem.
Não te Arrependas
Não te arrependas, Amada, porque a mim tão depressa
te deste!
Podes crer, nem por isso de ti penso coisas insolentes
e vis!
Vária é a acção das setas do Amor: algumas arranham,
E do rastejante veneno languesce pra anos o peito.
Mas, com penas potentes e gume afiado de fresco,
Outras penetram até ao tutano e rápido inflamam
o sangue.
Nos tempos heróicos, quando Deuses e Deusas amavam,
Ao olhar seguia o desejo, ao desejo o prazer.
Crês tu que a Deusa do Amor pensou muito tempo
Quando no bosque de Ida um dia Anquises lhe
agradou?
Se Luna tardasse a beijar o belo dormente,
Auiora, invejosa, em breve o teria acordado.
Hero descobriu Leandro no festim ruidoso, e ligeiro,
Ardente saltou o amante pra a corrente nocturna.
Rhea Sílvia, a virgem princesa, vai descuidosa
Buscar água ao Tibre, e o Deus dela se apossa.
Assim Marte gerou os seus filhos! — Uma loba
amamenta
Os Gémeos, e Roma nomeia-se princesa do mundo.Tradução de Paulo Quintela
O Homem de Carácter
Os homens de carácter são a consciência da sociedade a que pertencem. A medida natural dessa força é a resistência às circunstâncias. Os homens impuros julgam a vida pela versão reflectida nas opiniões, nos acontecimentos e nas pessoas. Não são capazes de prever a acção até que ela se concretize. Todavia, o elemento moral da acção preexistia no autor e a sua qualidade, boa ou má, era de fácil predição. Tudo na natureza é bipolar, ou tem um pólo positivo e um pólo negativo. Há um macho e uma fêmea, um espírito e um facto, um norte e um sul. O espírito é o positivo, o facto é o negativo. A vontade é o norte, a acção é o pólo sul. O carácter pode ser classificado como tendo o seu lugar natural no norte. Distribui as correntes magnéticas do sistema. Os espíritos fracos são atraídos para o pólo sul, ou pólo negativo. Só vêem na acção o lucro, ou o prejuízo que podem encerrar.
Não podem vislumbrar um princípio, a não ser que este se abrigue noutra pessoa. Não desejam ser amáveis mas amados. Os de carácter gostam de ouvir falar dos seus defeitos; aos outros aborrecem as faltas;
Engana-se quem pensa que só as paixões violentas como a ambição e o amor triunfam sobre as outras. A preguiça, por lânguida que seja, nem por isso deixa de se impor; sobrepõe-se a todos os desígnios e a todas as acções da nossa vida; destrói e consome insensivelmente as paixões e as virtudes.
Um grama de ação vale mais do que uma tonelada de teoria.
Pretensos Graus de Verdade
Uma das frequentes conclusões falsas é esta: como alguém é verdadeiro e sincero para connosco, pois diz a verdade. Assim, a criança acredita nos juízos dos pais, o cristão nas afirmações do fundador da Igreja. Do mesmo modo, não se quer admitir que tudo aquilo, que os homens, com sacrifício da felicidade e da vida, defenderam em séculos anteriores, nada mais era do que erros: talvez se diga que tenham sido graus da verdade. Mas, no fundo, acha-se que se alguém acreditou honestamente em alguma coisa e combateu e morreu pela sua crença, seria, contudo, por de mais injusto se, efectivamente, apenas um erro o tivesse inspirado. Um caso assim parece contradizer a eterna justiça; por isso, o coração das pessoas sensíveis decreta constantemente contra a sua cabeça a seguinte norma: entre acções morais e juízos intelectuais tem de haver um nexo necessário. Infelizmente, não é assim, pois não há justiça eterna.
O Inventário da Nossa Civilização
Fazer o inventário ou uma análise da nossa civilização, quer dizer o quê? Procurar esclarecer, de uma maneira rigorosa, a armadilha que fez do homem escravo das suas próprias criações. Por onde se infiltrou a inconsciência entre a acção e o pensamento metódicos? Na vida selvagem, a evasão constitui uma solução preguiçosa. É preciso reencontrar, na própria civilização em que vivemos, o pacto original entre o espírito e o mundo. De resto, trata-se de uma tarefa impossível de concretizar, por causa da brevidade da vida e da impossibilidade da colaboração e da sucessão. O que não é razão para não a empreender. Estamos todos em situação análoga à de Sócrates, o qual, enquanto esperava a morte na prisão, aprendeu a tocar lira… pelo menos, teremos vivido…
Da Liberdade
A: Eis uma bateria de canhões que atira junto aos nossos ouvidos; tendes a liberdade de ouvi-la e de a não ouvir?
B: É claro que não posso evitar ouvi-la.
A: Desejaríeis que esse canhão decepasse a vossa cabeça e as da vossa mulher e da vossa filha que estivessem convosco?
B: Que espécie de proposição me fazeis? Eu jamais poderia, no meu são juízo, desejar semelhante coisa. Isso é-me impossível.
A: Muito bem; ouvis necessariamente esse canhão e, também necessariamente, não quereis morrer, vós e a vossa família, de um tiro de canhão; não tendes nem o poder de não o ouvir nem o poder de querer permanecer aqui.
B: Isso é evidente.
A: Em consequência, destes uma trintena de passos a fim de vos colocardes ao abrigo do canhão: tivestes o poder de caminhar comigo estes poucos passos?
B: Nada mais verdadeiro.
A: E se fôsseis paralítico? Não teríeis podido evitar ficar exposto a essa bateria; não teríeis o poder de estar onde agora estais: teríeis então necessariamente ouvido e recebido um tiro de canhão e necessariamente estaríeis morto?
B: Nada mais claro.
A: Em que consiste, pois,
Sempre considerei as acções dos homens como as melhores intérpretes dos seus pensamentos.
Há grandeza mais verdadeira numa boa acção do que num bom poema ou numa grande vitória.
Desejos em simetria, pensamentos uníssonos, ações coordenadas, direcionadas ao mesmo alvo: eis a diferença entre um casal de sucesso e um casal comum!
Os sonhos dos filósofos têm, em todos os tempos, animado homens de acção que puseram mãos à obra para realizá-los.
Uma mulher é apedrejada pela acção que poderia ter sido praticada por um homem perfeito.
A virtude de uma pessoa mede-se não por ações excepcionais, mas pelos hábitos cotidianos.