O Amor é um Exagerador
As coisas boas, como o amor e a sabedoria, não trazem a felicidade pela simples razão que as coisas boas têm, para ser boas, de ser «boas por si mesmas». Não podem ser boas por aquilo que trazem. Pelo contrário, têm um preço. O mais das vezes, o preço do amor e da sabedoria, ambos artigos finos, artigos de luxo, coisas boas, é a infelicidade. Quando se ama, ou quando se estuda muito, fica-se sujeito às vontades e às verdades mais alheias. Nada depende quase nada de nós. E sofre-se. Irritam as pessoas que esperam que o amor traga a felicidade. É como esperar que os morangos tragam as natas. O amor não é um meio para atingir um fim — não é através do amor que se chega à felicidade. O amor é um exagerador — exagera os êxtases e as agonias, torna tudo o que não lhe diz respeito (o mundo inteiro) numa coisa pequenina. Assim como a arte tem de ser pela arte e a ciência pela ciência (seria um horror ouvir alguém dizer «Eu quero ser pintor ou biólogo para ganhar muito dinheiro e ir a muitas festas e ter duas carrinhas Volvo com galgos do Afeganistão lá dentro»),
Passagens sobre Alheio
370 resultadosFeliz aquele que atravessou a vida ajudando o seu semelhante, que não conheceu o medo e se manteve alheio à agressividade e ao ressentimento! É dessa madeira que são esculpidas as figuras ideais, que consolam a Humanidade nas situações de sofrimento que ela própria criou.
Quiseste expor teu coração a nu. E assim, ouvi-lhe todo o amor alheio. Ah, pobre amigo, nunca saibas tu Como é ridículo o amor… alheio!
Aprende a Ser como os Outros
Não precisamos de ler, estudar ou conhecer ninguém, quando produzimos nós próprios. Pois não basta que produzamos nós próprios? E gostemos de nós próprios? Que nos pode dar o espírito alheio, quando sobre o próprio nosso desceu em línguas de fogo a sabedoria de tudo? Melhor: A verdade é que nem precisamos nós próprios de produzir (toda a produção é uma limitação), ou mal precisamos de produzir, para usufruirmos as vantagens do criador e produtor. (…) Aprende a contar uma anedota; duas anedotas; três anedotas; quatro anedotas… uma anedota diverte muita gente; quatro anedotas divertem muito mais… aprende a polvilhar de blague todas essas ideias sérias, pesadas, profundas, obscuras, – ao cabo simplesmente maçadoras – com que pretendes sufocar (…); aprende a cultivar aquele subtil espírito de futilidade que ligeiramente embriaga como um champanhe, e a toda a gente agrada, lisonjeia todos, por a todos nos dar a reconfortante impressão de pertencermos ao mesmo meio… estarmos ao mesmo nível; não queiras ser nem sobretudo sejas mais inteligente ou mais sensível, mais honesto ou mais sincero, mais trabalhador ou mais culto, mais profundo ou mais agudo… numa palavra: superior. Sim, homem! aprende a ser como os outros, dizendo bem ou mal de tudo e todos –
A verdadeira humildade é audaciosa e não encolhida, é generosa e não cobarde. Os humildes não são os tímidos, mas os artífices das grandes obras, precisamente porque sabem pouca coisa e, por isso, são capazes de aprender e de arriscar, sem receio da opinião alheia ou do fracasso.
O que os outros pensam de nós teria pouca importância se não influenciasse tão profundamente o que pensamos de nós mesmos quando tomamos conhecimento da opinião alheia.
O mal alheio não pesa a quem o não tem.
Quase todos os jovens têm a coragem das opiniões alheias.
Vivemos de Matar
Os vivos alimentam-se e engordam às custas dos mortos. É a essência da natureza. Basta ver os documentários sobre a vida selvagem na televisão, aves corpulentas arrancando com o bico as tripas das vítimas, disputando-as entre si; a leoa de focinho enterrado na carne ensanguentada da zebra. Mas nem é preciso ir tão longe: as prateleiras dos supermercados são deprimentes cemitérios: paletes de cordeiro morto, ossos e costeletas de boi esfaqueado, vísceras de vaca sacrificada, lombo de porco eletrocutado, tudo isso em embalagens fabricadas com restos de árvores abatidas. Vivemos do que matamos. Vivemos de matar, ou do que nos é servido morto: os herdeiros consomem os despojos do predecessor, e isso nutre-os, fortalece-os no momento de levantar voo. Quanto maior a quantidade de carne consumida, mais alto e majestoso o voo. E mais elegante, claro. Nada que seja alheio às regras da natureza.
O Selvagem
Eu não amo ninguem. Tambem no mundo
Ninguem por mim o peito bater sente,
Ninguem entende meu sofrer profundo,
E rio quando chora a demais gente.Vivo alheio de todos e de tudo,
Mais callado que o esquife, a Morte e as lousas,
Selvagem, solitario, inerte e mudo,
– Passividade estupida das Cousas.Fechei, de ha muito, o livro do Passado
Sinto em mim o despreso do Futuro,
E vivo só commigo, amortalhado
N’um egoismo barbaro e escuro.Rasguei tudo o que li. Vivo nas duras
Regiões dos crueis indifferentes,
Meu peito é um covil, onde, ás escuras,
Minhas penas calquei, como as serpentes.E não vejo ninguem. Saio sómente
Depois de pôr-se o sol, deserta a rua,
Quando ninguem me espreita, nem me sente,
E, em lamentos, os cães ladram à lua…
Uma conduta irrepreensível consiste em manter cada um a sua dignidade sem prejudicar a liberdade alheia.
Economista: pessoa que traça planos para fazer alguma coisa com dinheiro alheio.
A Arte de Citar
Bem ao lado do criador de uma grande frase figura aquele a quem primeiro ocorre citá-la. Muitos lerão um livro antes que alguém pense em citar certa passagem. Mas, assim que isso é feito, aquela linha será citada de leste a oeste. […] De facto, é tão difícil nos apropriarmos dos pensamentos dos outros como inventá-los. Pois sempre alguma transição abrupta, alguma mudança repentina de temperatura ou de ponto de vista trai a inserção do alheio.
Nada há que tão notavelmente determine o auge de uma civilização, como o conhecimento, nos que a vivem, da esterilidade de todo o esforço, porque nos regem leis implacáveis, que nada revoga nem obstrui. Somos, porventura, servos algemados ao capricho de deuses, mais fortes porém não melhores que nós, subordinados, nós como eles, à regência férrea de um Destino abstracto, superior à justiça e à bondade, alheio ao bem e ao mal.
A Tua Importância na Tua Vida
É fundamental reconheceres a tua importância na tua vida. Por algum motivo nasceste, aprendeste a respirar e tiveste direito a um nome, nome esse que, em conjunto com as tuas características, te identificará eternamente como um ser individual, único e livre. Haverá algo mais especial e precioso que isso? Estou em crer que não; ainda assim, encontro muitas pessoas a quererem ser outras e outras ainda a querer acabar com elas próprias na esperança de, imediatamente, poderem vir a ser outro alguém. É o teu caso? Se for deve ser uma chatice, mas, também, se não te dás qualquer importância, que importância te darei eu? Já calculaste o perigo em que incorres por pensar desta maneira? Em menos de nada, estarás sozinho ou rodeado de gente como tu, ausente e que meteu férias no inferno para sempre. Bom, mas alegrem-se os corações porque acredito que não lerias estas linhas iniciais se nada estivesse a borbulhar aí dentro, se não existisse, pelo menos, uma fugaz esperança e uma enorme vontade de mudar. Está atento, o passado só influencia o presente se mantiveres o mesmo comportamento, por isso liberta-te dessa dor por uns instantes e lê em voz alta a próxima frase tantas vezes quantas achares necessário.
A Virtude Pura não Existe nos Dias de Hoje
Numa época tão doente como esta, quem se ufana de aplicar ao serviço da sociedade uma virtude genuína e pura, ou não sabe o que ela é, já que as opiniões se corrompem com os costumes (de facto, ouvi-os retratarem-na, ouvi a maior parte glorificar-se do seu comportamento e formular as suas regras: em vez de retratarem a virtude, retratam a pura injustiça e o vício, e apresentam-na assim falsificada para educação dos príncipes), ou, se o sabe, ufana-se erradamente e, diga o que disser, faz mil coisas que a sua consciência reprova.
(…) Em tal aperto, a mais honrosa marca de bondade consiste em reconhecer o erro próprio e o alheio, empregar todas as forças a resistir e a obstar à inclinação para o mal, seguir contra a corrente dessa tendência, esperar e desejar que as coisas melhorem.
Não conheci ninguém em minha vida que não tivesse conseguido suportar como um perfeito cristão as desgraças alheias.
Ler quer dizer pensar com uma cabeça alheia, em lugar da própria.
Sonho De Um Monista
Eu e o esqueleto esquálido de Esquilo
Viajávamos, com urna ânsia sibarita,
Por toda a pró-dinâmica infinita,
Na inconsciência de um zoófito tranqüilo.A verdade espantosa do Protilo
Me aterrava, mas dentro da alma aflita
Via Deus – essa mônada esquisita –
Coordenando e animando tudo aquilo!E eu bendizia, com o esqueleto ao lado,
Na guturalidade do meu brado,
Alheio ao velho cálculo dos dias,Como um pagão no altar de Proserpina,
A energia intracósmica divina
Que é o pai e é a mãe das outras energias!
Primeiro, aos meus; depois, aos alheios.