Passagens sobre Amargos

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Frases sobre amargos, poemas sobre amargos e outras passagens sobre amargos para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Canção do Amor-Perfeito

Eu vi o raio de sol
beijar o outono.
Eu vi na mão dos adeuses
o anel de ouro.
Não quero dizer o dia.
Não posso dizer o dono.

Eu vi bandeiras abertas
sobre o mar largo
e ouvi cantar as sereias.
Longe, num barco,
deixei meus olhos alegres,
trouxe meu sorriso amargo.

Bem no regaço da lua,
já não padeço.
Ai, seja como quiseres,
Amor-Perfeito,
gostaria que ficasses,
mas, se fores, não te esqueço.

Plano

Trabalho o poema sobre uma hipótese: o amor
que se despeja no copo da vida, até meio, como se
o pudéssemos beber de um trago. No fundo,
como o vinho turvo, deixa um gosto amargo na
boca. Pergunto onde está a transparência do
vidro, a pureza do líquido inicial, a energia
de quem procura esvaziar a garrafa; e a resposta
são estes cacos, que nos cortam as mãos, a mesa
da alma suja de restos, palavras espalhadas
num cansaço de sentidos. Volto, então, à primeira
hipótese. O amor. Mas sem o gastar de uma vez,
esperando que o tempo encha o copo até cima,
para que o possa erguer à luz do teu corpo
e veja, através dele, o teu rosto inteiro.

As verdades são amargas e bebem-se gota a gota. Mas a mentira, que nos lisonjeia como se fôssemos o sal da terra, engolimo-la às golfadas.

Os Homens Gloriosos

Sentei-me sem perguntas à beira da terra,
e ouvi narrarem-se casualmente os que passavam.
Tenho a garganta amarga e os olhos doloridos:
deixai-me esquecer o tempo,
inclinar nas mãos a testa desencantada,
e de mim mesma desaparecer,
— que o clamor dos homens gloriosos
cortou-me o coração de lado a lado.

Pois era um clamor de espadas bravias,
de espadas enlouquecidas e sem relâmpagos,
ah, sem relâmpagos…
pegajosas de lodo e sangue denso.

Como ficaram meus dias, e as flores claras que pensava!
Nuvens brandas, construindo mundos,
como se apagaram de repente!

Ah, o clamor dos homens gloriosos
atravessando ebriamente os mapas!

Antes o murmúrio da dor, esse murmúrio triste e simples
de lágrima interminável, com sua centelha ardente e eterna.

Senhor da Vida, leva-me para longe!
Quero retroceder aos aléns de mim mesma!
Converter-me em animal tranquilo,
em planta incomunicável,
em pedra sem respiração.

Quebra-me no giro dos ventos e das águas!
Reduze-me ao pó que fui!
Reduze a pó minha memória!

Reduze a pó
a memória dos homens,

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Trazes-me em Tuas Mãos de Vitorioso

Trazes-me em tuas mãos de vitorioso
Todos os bens que a vida me negou,
E todo um roseiral, a abrir, glorioso
Que a solitária estrada perfumou.

Neste meio-dia límpido, radioso,
Sinto o teu coração que Deus talhou
Num pedaço de bronze luminoso,
Como um berço onde a vida me pousou.

O silêncio, ao redor, é uma asa quieta…
E a tua boca que sorri e anseia,
Lembra um cálix de tulipa entreaberta…

Cheira a ervas amargas, cheira a sândalo…
E o meu corpo ondulante de sereia
Dorme em teus braços másculos de vândalo…

Piedade

O coração de todo o ser humano
Foi concebido para ter piedade,
Para olhar e sentir com caridade
Ficar mais doce o eterno desengano.

Para da vida em cada rude oceano
Arrojar, através da imensidade,
Tábuas de salvação, de suavidade,
De consolo e de afeto soberano.

Sim! Que não ter um coração profundo
É os olhos fechar à dor do mundo,
ficar inútil nos amargos trilhos.

É como se o meu ser campadecido
Não tivesse um soluço comovido
Para sentir e para amar meus filhos!

A alma da mocidade, arrancando voo, liba em todas as flores, experimenta todas as sensações, saboreia de todas as taças, quer doces quer amargas, e, só à custa de experimentar, saberá o que é a vida.

Algum dia, em algum lugar – em qualquer lugar, infalivelmente, você vai encontrar-se, e aquilo, e só isso, pode ser a hora mais feliz ou mais amargo da sua vida.

Sepultura Romântica

Ali, onde o mar quebra, n’um cachão
Rugidor e monótono, e os ventos
Erguem pelo areal os seus lamentos,
Ali se há-de enterrar meu coração.

Queimem-no os sóis da adusta solidão
Na fornalha do estio, em dias lentos;
Depois, no inverno, os sopros violentos
Lhe revolvam em torno o árido chão…

Até que se desfaça e, já tornado
Em impalpavel pó, seja levado
Nos turbilhões que o vento levantar…

Com suas lutas, seu cansado anseio,
Seu louco amor, dissolva-se no seio
D’esse infecundo, d’esse amargo mar!

Respiro o teu corpo

Respiro o teu corpo:
sabe a lua-de-água
ao amanhecer,
sabe a cal molhada,
sabe a luz mordida,
sabe a brisa nua,
ao sangue dos rios,
sabe a rosa louca,
ao cair da noite
sabe a pedra amarga,
sabe à minha boca.

Sinceridade Proscrita

A verdade permanece sepultada sob as máximas de uma falsa delicadeza. Chama-se saber viver à arte de viver com baixeza. Não se põe diferença entre conhecer o mundo e enganá-lo; e a cerimónia, que deveria ater-se inteiramente ao exterior, introduz-se nos nossos costumes mesmos.
A ingenuidade deixa-se aos espíritos pequenos, como uma marca da sua imbecilidade. A franqueza é olhada como um vício na educação. Nada de pedir que o coração saiba manter o seu lugar; basta que façamos como os outros. É como nos retratos, aos quais não se exige mais do que parecença. Crê-se ter achado o meio de tornar a vida deliciosa, através da doçura da adulação.
Um homem simples que não tem senão a verdade a dizer é olhado como o perturbador do prazer público. Evitam-no, porque não agrada; evita-se a verdade que anuncia, porque é amarga; evita-se a sinceridade que professa porque não dá frutos senão selvagens; temem-na porque humilha, porque revolta o orgulho que é a mais cara das paixões, porque é um pintor fiel, que faz com que nos vejamos tão disformes como somos.
Não há por que nos espantarmos, se ela é rara: é expulsa, proscrita por toda a parte.

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Confissão

Vivo um drama interior.
Já nele pouco a pouco me consumo.
E de tanto te buscar,
Mas sem nunca te encontrar,
Sou como um barco sem leme,
Que perdesse o rumo,
No alto mar.

Da minha vida, assim,
O que vai ser nem sei!
Dias alegres houvesse…
E os dias são para mim
Rosas mortas de um jardim
Que um vendaval desfizesse.

Tenho horas bem amargas.
Eu o confesso,
Eu o digo.
E se tudo passa e esqueço,
Esquecer o teu perfil
É coisa que eu não consigo.

Sofro por ti. O frio do que morre
Amortalha a minha alma em saudade.
Atrás de uma ilusão a minha vida corre,
Como se fora atrás de uma verdade.

A Deus peço, por fim, o meu sossego antigo.
Não me persiga mais o teu busto delgado.
Passo os dias e as noites a sonhar contigo,
Na cruz da tua ausência estou crucificado.

A tua falta sinto. Não o oculto.
Ocultá-lo seria uma mentira.
Vejo por toda a parte a sombra do teu vulto,

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Noite Fechada

L.

Lembras-te tu do sábado passado,
Do passeio que demos, devagar,
Entre um saudoso gás amarelado
E as carícias leitosas do luar?

Bem me lembro das altas ruazinhas,
Que ambos nós percorremos de mãos dadas:
Às janelas palravam as vizinhas;
Tinham lívidas luzes as fachadas.

Não me esqueço das cousas que disseste,
Ante um pesado tempo com recortes;
E os cemitérios ricos, e o cipreste
Que vive de gorduras e de mortes!

Nós saíramos próximo ao sol-posto,
Mas seguíamos cheios de demoras;
Não me esqueceu ainda o meu desgosto
Nem o sino rachado que deu horas.

Tenho ainda gravado no sentido,
Porque tu caminhavas com prazer,
Cara rapada, gordo e presumido,
O padre que parou para te ver.

Como uma mitra a cúpula da igreja
Cobria parte do ventoso largo;
E essa boca viçosa de cereja
Torcia risos com sabor amargo.

A Lua dava trêmulas brancuras,
Eu ia cada vez mais magoado;
Vi um jardim com árvores escuras,
Como uma jaula todo gradeado!

E para te seguir entrei contigo
Num pátio velho que era dum canteiro,

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Passei o Dia Ouvindo o que o Mar Dizia

Eu hontem passei o dia
Ouvindo o que o mar dizia.

Chorámos, rimos, cantámos.

Fallou-me do seu destino,
Do seu fado…

Depois, para se alegrar,
Ergueu-se, e bailando, e rindo,
Poz-se a cantar
Um canto molhádo e lindo.

O seu halito perfuma,
E o seu perfume faz mal!

Deserto de aguas sem fim.

Ó sepultura da minha raça
Quando me guardas a mim?…

Elle afastou-se calado;
Eu afastei-me mais triste,
Mais doente, mais cansado…

Ao longe o Sol na agonia
De rôxo as aguas tingia.

«Voz do mar, mysteriosa;
Voz do amôr e da verdade!
– Ó voz moribunda e dôce
Da minha grande Saudade!
Voz amarga de quem fica,
Trémula voz de quem parte…»
. . . . . . . . . . . . . . . .

E os poetas a cantar
São echos da voz do mar!