W.C.
Neste paĂs onde ninguĂ©m sabe
como obram as musas,
já dizia o outro,
fazer versos realmente versos,
que sigam o espasmo do ânus provecto
dessas criaturas fĂşteis, decantadas,
ainda Ă© e será muito difĂcil.Existe sempre um braço etĂ©reo
que puxa o autoclismo
no momento exacto da defecação.
Ouve-se um ruĂdo,
alguém pergunta ao outro o que se passa:
«É o som das águas que bate na garganta.»
Aliviados então os corações repousam
na sala de visitas da casa devassada
a que chamam d’alma.
Passagens de Armando Silva Carvalho
3 resultadosVaranda de Pilatos
Não há tempo. Há o espaço. O sol e as nossas voltas.
Os bocejos da lua, o clĂŁ dos astros.
Os buracos negros.
Ă“ mĂŁe! Para onde foram os seres vivos de ainda
Há pouco em todo o seu esplendor?
Mortos como tu, a natureza recebe-os.
A Terra, essa criança atroz, destrói os seus brinquedos
Numa rotina mecânica.
Quantas noites me faltam? Quantos beijos no escuro?
Quanta luz me cabe ainda nas pupilas?
Os anos nĂŁo me matam, nĂŁo me ferem os meses,
As horas nĂŁo me guilhotinam.
As células vão ardendo nos seus mapas
De nervos, o sangue demora sempre mais um pouco
A chegar ao seu destino orgânico.
Devagar, devagar, a cabeça amolece.
Devagar no colo do sono.
Ă“ mĂŁe. Um ninho. Uma cama macia no teu ventre.
Uma exposição de sinais. Uma geometria
Que me liga ao saber acumulado.
Entre Dentes
Deitado sobre ti
ensinas-me a sair
da treva.Com a boca dorida
por tanta palavra
ensanguentada
devoro o teu cabelo
ouro que se desfaz
por entre os dentes.E o teu sorriso
quando te penetro
ilumina sĂşbito
a noite do meu corpo