Todos os juízos em geral são cobardes e imperfeitos.
Passagens sobre Cobardes
78 resultadosCoragem Ilusória
Há cinco espécies de coragem, assim denominadas segundo a semelhança: suportam as mesmas coisas, mas não pelos mesmos motivos. Uma é a coragem política: provém da vergonha; a segunda é própria dos soldados: nasce da experiência e do facto de conhecer, não – como dizia Sócrates – os perigos, mas os recursos contra eles; a terceira brota da falta de experiência e da ignorância, e por ela são induzidas as crianças e os loucos, estes quando enfrentam a fúria dos elementos, aquelas quando pegam em serpentes. Outra espécie é a de quem tem esperança: graças a ela, arrostam os perigos aqueles que, muitas vezes, tiveram sorte (…) e os ébrios; o vinho, de facto, excita a confiança.
Outra ainda dimana da paixão irracional, por exemplo, do amor e da ira.
Se alguém está enamorado, é mais temerário que cobarde e enfrenta muitos perigos, como aquele que no Metaponto matou o tirano, ou o cretense de que fala a lenda; o mesmo se passa com a cólera e com a ira. Pois a ira é capaz de nos pôr fora de nós. Por isso, se afiguram também corajosos os javalis, embora não sejam; quando fora de si, têm uma qualidade semelhante,
Não sejamos cobardes para com as nossas acções!, não as enjeitemos depois de cometidas! – O remorso de consciência é indecoroso.
Um conservador é um homem cobarde demais para se bater e gordo demais para correr.
Uma das maiores desgraças dos homens de bem é serem cobardes. Gemem, calam-se e esquecem.
Não há animal mais abjecto, estúpido, cobarde, lamentável, egoísta, rancoroso, invejoso, ingrato, que o público. É o maior dos cobardes, porque de si mesmo tem medo.
Mania da Dúvida
Tudo para mim é um duvidar
Com a normalidade sempre em cisão,
E o seu incessante perguntar
Cansa meu coração.
As coisas são e parecem e o nada sustém
O segredo da vida que contém.A presença de tudo sempre perguntando
Coisas de angústia premente,
Em terrível hesitação experimentando
A minha mente.
É falsa a verdade? Qual o seu aparentar
Já que tudo são sonhos e tudo é sonhar?Perante o mistério vacila a vontade
Em luta dividida dentro do pensar,
E a Razão cede, qual cobarde,
No encontrar
Mais do que as coisas em si revelam ser,
Mas que elas, por si só, não deixam ver.
Poucas pessoas têm a coragem de ser cobardes diante de testemunhas.
Nós Trazemos na Alma uma Bomba
A causa depois do efeito. A minha tese é esta, minha querida – nós trazemos na alma uma bomba e o problema está em alguém fazer lume para a rebentar. Nós escolhemos ser santos ou heróis ou traidores ou cobardes e assim. O problema está em vir a haver ou não uma oportunidade para isso se manifestar. Nós fizemos uma escolha na eternidade. Mas quantos sabem o que escolheram? Alguns têm a sorte ou a desgraça de alguém fazer lume para rebentarem o que são, ver-se o que estava por baixo do que estava por cima. Mas outros vão para a cova na ignorância. Às vezes fazem ensaios porque a pressão interior é muito forte. Ou passam a vida à espera de um sinal, um indício elucidativo. Ou passam-na sem saberem que trazem a bomba na alma que às vezes ainda rebenta, mesmo já no cemitério. Ou quem diz bomba diz por exemplo uma flor para pormos num sorriso. Ou um penso para pormos num lanho. Mas não sabem.
Nunca em amor danou o atrevimento
Nunca em amor danou o atrevimento;
Favorece a Fortuna a ousadia;
Porque sempre a encolhida cobardia
De pedra serve ao livre pensamento.Quem se eleva ao sublime Firmamento,
A Estrela nele encontra que lhe é guia;
Que o bem que encerra em si a fantasia,
São u~as ilusões que leva o vento.Abrir-se devem passos à ventura;
Sem si próprio ninguém será ditoso;
Os princípios somente a Sorte os move.Atrever-se é valor e não loucura;
Perderá por cobarde o venturoso
Que vos vê, se os temores não remove.
Cobarde é o homem que numa emergência perigosa pensa com as pernas.
Só um Mundo de Amor pode Durar a Vida Inteira
Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro. Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo.
O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixonade verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.
Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em “diálogo”. O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios.Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões.
O amor civiliza o homem mais embrutecido,
faz falar com elegância quem antes era mudo,
faz do cobarde um atrevido,
transforma o preguiçoso em lesto e activo.
Todas as virtudes são coragem; eis porque a palavra cobarde é a mais grave das injúrias.
Ode Marítima
Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de Verão,
Olho pro lado da barra, olho pro Indefinido,
Olho e contenta-me ver,
Pequeno, negro e claro, um paquete entrando.
Vem muito longe, nítido, clássico à sua maneira.
Deixa no ar distante atrás de si a orla vã do seu fumo.
Vem entrando, e a manhã entra com ele, e no rio,
Aqui, acolá, acorda a vida marítima,
Erguem-se velas, avançam rebocadores,
Surgem barcos pequenos de trás dos navios que estão no porto.
Há uma vaga brisa.
Mas a minh’alma está com o que vejo menos,
Com o paquete que entra,
Porque ele está com a Distância, com a Manhã,
Com o sentido marítimo desta Hora,
Com a doçura dolorosa que sobe em mim como uma náusea,
Como um começar a enjoar, mas no espírito.Olho de longe o paquete, com uma grande independência de alma,
E dentro de mim um volante começa a girar, lentamente,Os paquetes que entram de manhã na barra
Trazem aos meus olhos consigo
O mistério alegre e triste de quem chega e parte.
Para cada mulher, a população feminina é um exército de rivais. Os homens são mais cobardes – não aguentam mais do que quatro ou cinco rivais. As mulheres podem com a terra toda.
O Costume Constrange a Natureza
A coisa mais importante de toda a vida é a escolha do ofício: o acaso prepara-a. O costume faz os pedreiros, soldados, empalhadores. «E um excelente empalhado», diz-se; e, falando dos soldados: «Eles são loucos», diz-se; e outros pelo contrário: «Não há nada maior do que a guerra; o resto dos homens são uns cobardes». À força de ouvir louvar na infância estes ofícios e desprezar todos os outros, escolhe-se; pois naturalmente ama-se a virtude, e detesta-se a loucura; estas palavras emocionam-nos: só se peca na aplicação. É tão grande a força do costume que, daqueles que a natureza fez apenas homens, se fazem todas as condições dos homens; pois há regiões onde são todos pedreiros, noutras todos soldados, etc. Certamente que a natureza não é tão uniforme. É portanto o costume que faz isto, porque constrange a natureza; e algumas vezes a natureza supera-o, e conserva o homem no seu instinto, apesar do costume, bom ou mau.
A Cobardia como Pilar da Civilização
Costuma-se jogar na cara dos marxistas, com a sua concepção materialista da História, que eles subestimam certas qualidades espirituais do homem que não dependem de quanto ele ganhe ou deixe de ganhar. O argumento é o de que essas qualidades colorem as aspirações e actividades do homem civilizado tanto quanto são coloridas pela sua condição material, tornando assim impossível simplesmente
reduzir o homem a uma máquina económica. Como exemplos, os antimarxistas citam o patriotismo, a piedade, o senso estético e a vontade de conhecer Deus. Infelizmente, os exemplos são mal escolhidos. Milhões de homens não ligam para o patriotismo, a piedade ou o senso estético, não têm o menor interesse activo em conhecer Deus. Por que é que os antimarxistas não citam uma qualidade espiritual que seja verdadeiramente universal? Pois aqui vai uma. Refiro-me à cobardia. De uma forma ou de outra, ela é visível em todo o ser humano; serve também para separar o homem de todos os outros animais superiores. A cobardia, acredito, está na base de todo o sistema de castas e na formação de todas as sociedades organizadas, inclusive as mais democráticas. Para escapar de ir à guerra ele próprio, o camponês deva de mão beijada certos privilégios aos guerreiros – e destes privilégios brotou toda a estrutura da civilização.
As Aparências Dizem Aquilo Que Quisermos
Cada boa qualidade humana está relacionada com uma má, na qual ameaça transformar-se; e cada má qualidade está, de uma forma semelhante, relacionada com uma boa. O motivo por que tantas vezes não compreendemos as pessoas é que, quando as conhecemos, confundimos as suas más qualidades com as boas com elas relacionadas, ou vice-versa: assim, um homem prudente pode parecer-nos cobarde, um homem poupado, avarento; ou um perdulário, liberal, uma pessoa grosseira franca e directa, um sujeito imprudente cheio de nobre autoconfiança, e assim por diante.
Apoiada, a coragem nasce até mesmo naqueles que são muito cobardes.