Pacto Das Almas (III) Alma Da Almas
Alma da almas, minha irmĂŁ gloriosa,
Divina irradiação do Sentimento,
Quando estarás no azul Deslumbramento,
Perto de mim, na grande Paz radiosa?!Tu que és a lua da Mansão de rosa
Da Graça e do supremo Encantamento,
O cĂrio astral do augusto Pensamento
Velando eternamente a FĂ© chorosa,Alma das almas, meu consolo amigo,
Seio celeste, sacrossanto abrigo,
Serena e constelada imensidade,Entre os teus beijos de eteral carĂcia,
Sorrindo e soluçando de delĂcia,
Quando te abraçarei na Eternidade?!
Passagens de Cruz e Souza
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Grande, grande Ilusão morta no espaço,
Perdida nos abismos da memĂłria,
Dorme tranqĂĽila no esplendor da glĂłria,
Longe das amarguras do cansaço…IlusĂŁo, Flor do sol, do morno e lasso
Sonho da noite tropical e flĂłrea,
Quando as visões da névoa transitória
Penetram na alma, num lascivo abraço…Ă“ IlusĂŁo! Estranha caravana
de águias, soberbas, de cabeça ufana,
De asas abertas no clarão do Oriente.Não me persiga o teu mistério enorme!
Pelas saudades que me aterram, dorme,
Dorme nos astros infinitamente…
Nerah
(Inspirado no elegante conto de VirgĂlio Várzea)
A VĂtor LobatoNerah nĂŁo brinca mais, nĂŁo dança mais. — E agora
Que vĂŁo-se apropinquando os tempos invernosos,
Nerah traz uns receios tĂmidos, nervosos,
De quem teme mudar-se em noite, sendo aurora.Seus sonhos de cristal, translĂşcidos, antigos
Se vĂŁo embora, embora Ă vinda dos invernos,
Seguindo em debandada os Ăşmidos galernos —
— lembrando um roto bando informe de mendigos.NĂŁo canta o sabiá que triste na gaiola,
Parece, com o olhar, pedir-lhe a casta esmola
De um riso — aquela flor que esvai-se, branca e fria.Em tudo a fina seta aguda de aflições!
Na própria atmosfera um caos de interjeições!
Em tudo uma mortalha, em tudo uma agonia.
Renascimento
A Alma nĂŁo fica inteiramente morta!
Vagas Ressurreições do Sentimento
Abrem já, devagar, porta por porta,
Os palácios reais do Encantamento!Morrer! Findar! Desfalecer! que importa
Para o secreto e fundo movimento
Que a alma transporta, sublimiza e exorta,
Ao grande Bem do grande Pensamento!Chamas novas e belas vĂŁo raiando,
VĂŁo se acendendo os lĂmpidos altares
E as almas vĂŁo sorrindo e vĂŁo orando…E pela curva dos longĂnquos ares
Ei-las que vĂŞm, como o imprevisto bando
Dos albatrozes dos estranhos mares…
Sentimento Esquisito
Ó céu estéril dos desesperados,
Forma impassĂvel de cristas sidĂ©reo,
Dos cemitérios velho cemitério
Onde dormem os astros delicados.Pátria d’estrelas dos abandonados,
Casulo azul do anseio vago, aéreo,
Formidável muralha de mistério
Que deixa os corações desconsolados.Céu imóvel milênios e milênios,
Tu que iluminas a visĂŁo dos GĂŞnios
E ergues das almas o sagrado acorde.Céu estéril, absurdo, céu imoto,
Faz dormir no teu seio o Sonho ignoto,
Esta serpente que alucina e morde…
Os Mortos
Ao menos junto dos mortos pode a gente
Crer e esperar n’alguma suavidade:
Crer no doce consolo da saudade
E esperar do descanso eternamente.Junto aos mortos, por certo, a fé ardente
NĂŁo perde a sua viva claridade;
Cantam as aves do céu na intimidade
Do coração o mais indiferente.Os mortos dão-nos paz imensa à vida,
Dão a lembrança vaga, indefinida
Dos seus feitos gentis, nobres, altivos.Nas lutas vĂŁs do tenebroso mundo
Os mortos sĂŁo ainda o bem profundo
Que nos faz esquecer o horror dos vivos.
Sonho Branco
De linho e rosas brancas vais vestido,
Sonho virgem que cantas no meu peito!…
És do Luar o claro deus eleito,
Das estrelas purĂssimas nascido.Por caminho aromal, enflorescido,
Alvo, sereno, lĂmpido, direito,
Segues radiante, no esplendor perfeito,
No perfeito esplendor indefinido…As aves sonorizam-te o caminho…
E as vestes frescas, do mais puro linho
E as rosas brancas dĂŁo-te um ar nevado…No entanto, Ă“ Sonho branco de quermesse!
Nessa alegria em que tu vais, parece
Que vais infantilmente amortalhado!
Quando Eu Partir
Quando eu partir, que eterna e que infinita
Há de crescer-me a dor de tu ficares;
Quanto pesar e mesmo que pesares,
Que comoção dentro desta alma aflita.Por nossa vida toda sol, bonita,
Que sentimento, grande como os mares,
Que sombra e luto pelos teus olhares
Onde o carinho mais feliz palpita…Nesse teu rosto da maior bondade
Quanta saudade mais, que atroz saudade…
Quanta tristeza por nós ambos, quanta,Quando eu tiver já de uma vez partido,
Ă“ meu amor, Ăł meu muito querido
Amor, meu bem, meu tudo, Ăł minha santa!
Aleluia! Aleluia!
Dentre um cortejo de harpas e alaĂşdes
Ă“ Arcanjo sereno, Arcanjo nĂveo,
Baixas-te Ă terra, ao mundanal convĂvio…
Pois que a terra te ajude, e tu me ajudes.Que tu me alentes nas batalhas rudes,
Que me tragas a flor de um doce alĂvio
Aos báratros, Ă s brenhas, ao declĂvio
Deste caminho de ânsias e ataĂşdes…Já que desceste das regiões celestes,
Nesse clarĂŁo flamĂvomo das vestes,
Através dos troféus da EternidadeTraz-me a Luz, traz-me a Paz, traz-me a Esperança
Para a minh’alma que de angĂşstias cansa,
Errando pelos claustros da Saudade!
Livre!
Livre! Ser livre da materia escrava,
Arrancar os grilhões que nos flagelam
E livre, penetrar nos Dons que selam
A alma e lhe emprestam toda a etérea lava.Livre da humana, da terrestre bava
Dos corações daninhos que regelam
Quando os nossos sentidos se rebelam
Contra a Infâmia bifronte que deprava.Livre! bem livre para andar mais puro,
Mais junto Ă Natureza e mais seguro
Do seu amor, de todas as justiças.Livre! para sentir a Natureza,
Para gozar, na universal Grandeza,
Fecundas e arcangélicas preguiças.
SĂmiles
(Desterro)
Pedro traiu a fé do Apostolado.
Madalena chorou de arrependida;
E nessa mágoa triste e indefinida
Havia ainda uns laivos de pecado.Tudo que a BĂblia tinha decretado,
Tudo o que a lenda humilde e dolorida
De Jesus Cristo apregoou na vida,
Cumpriu-se à risca, foi executado.O filho-Deus da cândida Maria,
Da flor de JericĂł, na cruz sombria
Os seus dias amáveis terminou.Pedro traiu a fé dos companheiros.
Madalena chorou sob os olmeiros
Jesus Cristo sofreu e… perdoou.
Supremo Verbo
– Vai, Peregrino do caminho santo,
Faz da tu’alma lâmpada do cego,
Iluminando, pego sobre pego,
As invisĂveis amplidões do Pranto.Ei-lo, do Amor o Cálix sacrossanto!
Bebe-o, feliz, nas tuas mĂŁos o entrego…
És o filho leal, que eu não renego,
Que defendo nas dobras do meu manto.Assim ao Poeta a Natureza fala!
Enquanto ele estremece ao escutá-la,
Transfigurado de emoção, sorrindo…Sorrindo a cĂ©us que vĂŁo se desvendando,
A mundos que vĂŁo se multiplicando,
A portas de ouro que vĂŁo se abrindo!
Primeira ComunhĂŁo
Grinaldas e véus brancos, véus de neve,
Véus e grinaldas purificadores,
VĂŁo as Flores carnais, as alvas Flores
Do Sentimento delicado e leve.Um luar de pudor, sereno e breve,
De ignotos e de prĂ´nubos pudores,
Erra nos pulcros virginais brancores
Por onde o Amor parábolas descreve…Luzes claras e augustas, luzes claras
Douram dos templos as sagradas aras,
Na comunhĂŁo das nĂveas hĂłstias frias…Quando seios pubentes estremecem,
Silfos de sonhos de volĂşpia crescem,
Ondulantes, em formas alvadias…
ĂŠxtase
Quando vens para mim, abrindo os braços
Numa carĂcia lânguida e quebrada,
Sinto o esplendor de cantos de alvorada
Na amorosa fremência dos teus passos.Partindo os duros e terrestres laços,
A alma tonta, em delĂrio, alvoroçada,
Sobe dos astros a radiosa escada
Atravessando a curva dos espaços.Vens, enquanto que eu, perplexo d’espanto,
Mal te posso abraçar, gozar-te o encanto
Dos seios, dentre esses rendados folhos.Nem um beijo te dou! abstrato e mudo
Diante de ti, sinto-te, absorto em tudo,
Uns rumores de pássaros nos olhos.
Ilusões Mortas
A VirgĂlio Várzea
Os meus amores vĂŁo-se mar em fora,
E vĂŁo-se mar em fora os meus amores,
A murchar, a murchar, como essas flores
Sem mais orvalho e a doce luz da aurora.E os meus amores nĂŁo virĂŁo agora,
NĂŁo baterĂŁo as asas multicores,
Como as aves mansas — dentre os esplendores
Do meu prazer, do meu prazer de outrora.Tudo emigrou, rasgando a esfera branca
Das ilusões, — tudo em revoada franca
Partiu — deixando um bem-estar saudosoNo fundo ideal de toda a minha vida,
Qual numa taça a gota indefinida
De um bom licor antigo e saboroso.
Canção De Abril
Vejo-te, enfim, alegre e satisfeita.
Ora bem, ora bem! — Vamos embora
Por estes campos e rosais afora
De onde a tribo das aves nos espreita.Deixa que eu faça a matinal colheita
Dos teus sonhos azuis em cada aurora,
Agora que este abril nos canta, agora,
A florida canção que nos deleita.Solta essa fulva cabeleira de ouro
E vem, subjuga com teu busto louro
O sol que os mundos vai radiando e abrindo.E verás, ao raiar dessa beleza,
Nesse esplendor da virgem natureza,
Astros e flores palpitando e rindo.
Imortal Atitude
Abre os olhos Ă Vida e fica mudo!
Oh! Basta crer indefinidamente
Para ficar iluminado tudo
De uma luz imortal e transcendente.Crer Ă© sentir, como secreto escudo,
A alma risonha, lĂşcida, vidente…
E abandonar o sujo deus cornudo,
O sátiro da Carne impenitente.Abandonar os lânguidos rugidos,
O infinito gemido dos gemidos
Que vai no lodo a carne chafurdando.Erguer os olhos, levantar os braços
Para o eterno Silêncio dos Espaços
E no SilĂŞncio emudecer olhando…
VĂŁo-Se De Todo Os Pardacentos Nimbos
VĂŁo-se de todo os pardacentos nimbos…
Chovem da luz as nĂtidas faĂscas
E no esplendor de irradiações mouriscas,
Abrem-se as flores em gentis corimbos.Muito mais lestas do que amigos fimbos,
Do Azul cortando as bordaduras priscas,
Pombas do mato esvoaçando, ariscas,
Do cĂ©u se perdem nos profundos limbos.A natureza pulsa como a forja…
Pássaros vibram no clarim da gorja,
As retumbantes, fortes clarinadas.A grande artĂ©ria dos assombros pula…
E do oxigênio, a força que regula
Enche os pulmões a largas baforadas.
Lágrimas Da Aurora, Poemas Cristalinos
Lágrimas da aurora, poemas cristalinos
Que rebentais das cobras do mistério!
Aves azuis do manto auri-sidĂ©rio…
Raios de luz, fantásticos, divinos!…Astros diáfanos, brandos, opalmos,
Brancas cecens do ParaĂso etĂ©reo,
Canto da tarde, lĂmpido, aĂ©reo,
Harpa ideal, dos encantados hinos!…Brisas suaves, virações amenas,
LĂrios do vale, roseirais do lago,
Bandos errantes de sutis falenas!…Vinde do arcano n’um potente afago
Louvar o Gênio das mansões serenas,
Esse ProdĂgio singular e mago!!…
Ă€ Revolta
A Cassiano César
O sĂ©culo Ă© de revolta — do alto transformismo,
De Darwin, de LittrĂ©, de Spencer, de Laffite —
Quem fala, quem dá leis é o rubro niilismo
Que traz como divisa a bala-dinamite!…Se Ă© força, se Ă© preciso erguer-se um evangelho,
Mais reto, que instrua — estĂ©tico — mais novo
Esmaguem-se do trono os dogmas de um Velho
E lance-se outro sangue aos mĂşsculos do povo!…O vĂcio azinhavrado e os cĂ©rebros raquĂticos,
É pĂ´-los ao olhar dos sĂ©rios analĂticos,
Na ampla, social e esplĂŞndida vitrine!…Ă€ frente!… — Trabalhar a luz da idĂ©ia nova!…
— Pois bem! Seja a idĂ©ia, quem lance o vĂcio Ă cova,
— Pois bem! — Seja a idĂ©ia, quem gere e quem fulmine!…