Partido político é um agrupamento de cidadãos para defesa abstracta de princípios e elevação concreta de alguns cidadãos.
Passagens sobre Defesa
87 resultadosDesarmar e Esgotar o Sofrimento
A literatura é uma defesa contra as ofensas da vida. A primeira diz à segunda: «Não me levas à certa; sei como te comportas, sigo-te e prevejo-te, gozo até ao ver-te agir, e roubo-te o segredo ao recriar-te em hábeis construções que travam o teu fluxo.» À parte este jogo, a outra defesa contra as coisas é o silêncio em que nos recolhemos antes de dar o salto. Mas é preciso que sejamos nós a escolhê-lo, e não deixar que no-lo imponham. Nem mesmo a morte. Escolhermos um mal é a única defesa contra esse mal. Isto significa aceitar o sofrimento. Não resignação, mas força. Digerir o mal de uma só vez. Têm vantagem os que, por índole, sabem sofrer de um modo impetuoso e total: assim se desarma o sofrimento e o transformamos em criação, escolha, resignação. Justificação do suicídio.
Aqui não há lugar para a Caridade.
É uma dificuldade minha, a de fazer diálogos. Como sou um lírico, faço tudo carregado de autobiografia. Às vezes o que as pessoas pensam que é bom tem a ver com estratagemas nossos. No fundo não é uma técnica, é uma defesa das nossas dificuldades.
As Máscaras e a Guerra
… A minha casa ficou entre os dois sectores… De um lado avançavam mouros e italianos… Do outro lado avançavam, retrocediam ou aguentavam-se os defensores de Madrid… Pelas paredes tinham entrado as granadas da artilharia… As janelas desfizeram-se em estilhaços… Encontrei restos de chumbo no chão, entre os meus livros… Mas as minhas máscaras tinham desaparecido… As minhas máscaras trazidas do Sião, de Bali, de Samatra, do arquipélago malaio, de Bandung. Douradas, cinzentas, cor de tomate, com sobrancelhas prateadas ou azuis, infernais, ensimesmadas, as minhas máscaras eram a única lembrança daquele primeiro Oriente aonde cheguei solitário e que me tinha acolhido com o seu odor de chá, de esterco, de ópio, de suor, de jasmins intensos, de frangipana, de fruta podre pelas ruas… Aquelas máscaras, memória de puríssimas danças, dos bailes defronte do templo… Gotas de madeira coloridas pelos mitos, restos daquela floral mitologia que traçava no ar sonhos, costumes, demóniosi mistérios incompatíveis com a minha natureza americana… E então… Talvez os militantes tenham assomado às janelas da minha casa com as máscaras postas, talvez tenham assustado os mouros entre dois disparos… Muitas deles ficaram em estilhas e sangrentas, ali mesmo… Outras teriam rolado desde o meu quinto andar, arrancadas por um tiro…
Abelhas e ovelhas, em suas defesas.
Abelhas e ovelhas têm suas defesas.
Em Louvor das Crianças
Se há na terra um reino que nos seja familiar e ao mesmo tempo estranho, fechado nos seus limites e simultaneamente sem fronteiras, esse reino é o da infância. A esse país inocente, donde se é expulso sempre demasiado cedo, apenas se regressa em momentos privilegiados — a tais regressos se chama, às vezes, poesia. Essa espécie de terra mítica é habitada por seres de uma tão grande formosura que os anjos tiveram neles o seu modelo, e foi às crianças, como todos sabem pelos evangelhos, que foi prometido o Paraíso.
A sedução das crianças provém, antes de mais, da sua proximidade com os animais — a sua relação com o mundo não é a da utilidade, mas a do prazer. Elas não conhecem ainda os dois grandes inimigos da alma, que são, como disse Saint-Exupéry, o dinheiro e a vaidade. Estas frágeis criaturas, as únicas desde a origem destinadas à imortalidade, são também as mais vulneráveis — elas têm o peito aberto às maravilhas do mundo, mas estão sem defesa para a bestialidade humana que, apesar de tanta tecnologia de ponta, não diminui nem se extingue.
O sofrimento de uma criança é de uma ordem tão monstruosa que,
Sou Lúcido
Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa
Aquele homem mal vestido, pedinte por profissão que se lhe vê na cara,
Que simpatiza comigo e eu simpatizo com ele;
E reciprocamente, num gesto largo, transbordante, dei-lhe tudo quanto tinha
(Exceto, naturalmente, o que estava na algibeira onde trago mais dinheiro:
Não sou parvo nem romancista russo, aplicado,
E romantismo, sim, mas devagar…).Sinto uma simpatia por essa gente toda,
Sobretudo quando não merece simpatia.
Sim, eu sou também vadio e pedinte,
E sou-o também por minha culpa.
Ser vadio e pedinte não é ser vadio e pedinte:
É estar ao lado da escala social,
É não ser adaptável às normas da vida,
‘As normas reais ou sentimentais da vida –
Não ser Juiz do Supremo, empregado certo, prostituta,
Não ser pobre a valer, operário explorado,
Não ser doente de uma doença incurável,
Não ser sedento da justiça, ou capitão de cavalaria,
Não ser, enfim, aquelas pessoas sociais dos novelistas
Que se fartam de letras porque tem razão para chorar lagrimas,
E se revoltam contra a vida social porque tem razão para isso supor.
À Vaidade do Mundo
É a vaidade, Fábio, desta vida
Rosa que na manhã lisonjeada
Púrpuras mil com ambição coroada
Airosa rompe, arrasta presumida;É planta que de Abril favorecida
Por mares de soberba desatada,
Florida galera empavezada,
Surca ufana, navega destemida;É nau, enfim, que em breve ligeireza,
Com presunção de fénix generosa,
Galhardias apresta, alentos preza.Mas ser planta, rosa e nau vistosa
De que importa, se aguarda sem defesa
Penha a nau, ferro a planta, tarde a rosa?
Conheci um tipo muito débil, mas essa era a sua defesa. Conheci um tipo muito forte e essa era a sua defesa. Conheci um tipo da classe média física e esse fartava-se de levar porrada.
A Dieta do Génio
Os meios de que Júlio César se serviu para se defender das doenças e das dores de cabeça: grandes caminhadas, um modo de vida simplíssimo, permanência constante ao ar livre, fadigas contínuas — estas são, em grandes traços, as regras de conservação e defesa geral contra a extrema vulnerabilidade dessa máquina subtil, e que trabalha a uma altíssima pressão, chamada génio.
Aquilo a que chamamos recordações são os nossos pensamentos de agora, as nossas exprobrações de agora, a nossa defesa de agora.
Tenho que aprender o que ainda não sei: a ser humilde e modesta. Perdoe sempre o meu ridículo orgulho de pobre soberba; mas o orgulho tem sido a minha suprema defesa, tem sido o meu amparo e a minha força. Devo-lhe tantos e tão bons serviços!
Feminismo é odiado porque as mulheres são odiadas. Antifeminismo é uma expressão direta de misoginia; é a defesa política do ódio às mulheres.
Passa-se a Vida Temendo ou Desejando a Morte
A morte pode dar ensejo a dois sentimentos opostos: ou fazer pensar que morrer é tornar-se o mais vulnerável dos seres, sem defesa contra o desconhecido; ou que é tornar-se invulnerável e afastado de todos os males possíveis. Em quase todos, esses dois sentimentos existem e alternam-se. Passa-se a vida temendo ou desejando a morte.
Os modos de guerrear são tantos, quantos tem inventado o amor para a defesa própria, e o ódio para a ruína do inimigo.
A Melhor Defesa
Como me sinto fraco, vulnerável e aberto por todos os lados ao espanto, quando me vejo diante de pessoas que não falam por falar e que estão sempre dispostas a confirmar pela acção o que dizem por palavras!… Mas existirão mesmo pessoas assim? Não me consideraram mesmo a mim como um homem firme?
A máscara é tudo. Tenho de confessar, no entanto, que os temo – e haverá algo de mais aviltante do que o medo? O homem mais forte por natureza torna-se um poltrão, se as suas ideias forem flutuantes – e o sangue-frio, a primeira das nossas defesas, deriva apenas do facto de uma alma já endurecida pela experiência não poder ser colhida de surpresa. Bem sei que esta minha determinação é ambiciosa, mas ir inisitindo nela apesar de tudo é já meio caminho andado.
Carta
(digo dos que se ditam:
a minha defesa
são os vossos punhais)Quando me disseram «não se vem à vida para sonhar» passei a odiar-vos. Para vos matar escolhi materiais inacessíveis ao meu ódio. Em mim fizestes despertar a irreparável urgência de ferir.
Descobri a vossa intenção: decepar as minhas raízes mais profundas, obrigar-me à cerimónia das palavras mortas. Preferi reiniciar-me: na solidão me apaguei. Estava só para me encher de gente, para me povoar de ternura. Eu queria simplesmente olhar de frente a verdade das pequenas coisas: esta água vem de onde, quem teceu este linho, que mãos fizeram este pão?
Desloquei-me para tudo ver de um outro lado: levei o meu olhar, o desejo de um princípio infinitamente retomado. Ganhei sonoridade nas vozes que me habitavam silenciosamente. Entre mar e terra eu preferia ser espuma, ter raiz e poente entre oceano e continente.
O tempo, por vezes, morria de o não semear. Terras que golpeava com ternura eram feridas que em mim se abriam para me curar. Eram terras suspeitas, acusadas de futuro. Outras vezes eram mãos de um corpo que ainda me não nascera. Surgiam da obscuridade para afastar a água e nela me deixar tombar.
A melhor defesa é o ataque.
As Boas Resoluções
As boas resoluções são sempre tentativas de interferir com as leis científicas. Provêm da pura vaidade. O seu resultado é absolutamente nulo. Proporcionam-nos, uma vez por outra, uma dessas voluptuosas emoções estéreis que produzem um certo encanto nos fracos. É tudo o que podemos dizer em sua defesa. Não passam de cheques que os homens sacam sobre um banco onde não têm conta aberta.