Passagens sobre Deuses

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Frases sobre deuses, poemas sobre deuses e outras passagens sobre deuses para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Da Verdade não Quero Mais que a Vida

Sob a leve tutela
De deuses descuidosos,
Quero gastar as concedidas horas
Desta fadada vida.
Nada podendo contra
O ser que me fizeram,
Desejo ao menos que me haja o Fado
Dado a paz por destino.
Da verdade não quero
Mais que a vida; que os deuses
Dão vida e não verdade, nem talvez
Saibam qual a verdade.

Saber Estar

És impaciente e difícil de contentar. Se estás só, queixas-te da solidão; se na companhia dos outros, tu os chamas de conspiradores e de ladrões, e achas defeitos nos teus próprios pais, filhos, irmãos e vizinhos. No entanto, quando estás sozinho, deves falar em tranquilidade e liberdade e te considerares igual aos deuses. E quando estás em companhia numerosa, não a deves chamar de turba aborrecida ou ruidosa, mas de assembleia e tribunal, dessarte aceitando tudo com contentamento.

Todos sabem que errar é humano. Mas insistimos em sermos deuses, temos a necessidade neurótica de sermos perfeitos.

A Opinião Pura e Elevada

A opinião que se emite ou a regra que se estabelece não tem que se importar com as circunstâncias em que se encontram os homens nem com as possibilidades de acolhimento ou recusa que o mundo lhe oferece; o que é hoje grão seco levanta-se amanhã sobre as ondas do campo como a espiga mais alta e mais cheia; o culto da verdade não se compadece com a adoração dos deuses que presidem aos dias nem com a vã agitação que é de regra no formigueiro humano; cada um tomará o que se diz como quiser; a sua atitude, porém, só interessará enquanto fenómeno base para uma nova legalidade.
Não há aqui nem indiferença, nem egoísmo; é mais larga a alma que a par do amor dos homens actuais sente vibrar o amor dos homens do futuro, mais forte o espírito que se orienta para o eterno; a justiça sempre o terá a seu lado armado de todas as armas, não porque sinta para ela um impulso momentâneo mas porque a defende em qualquer tempo; e sempre se há-de recusar, sejam quais forem as razões, a passar em claro uma injustiça ou a servir-se de qualquer meio, apenas porque tal proceder se aparenta vantajoso aos seus interesses ou aos interesses dos seus amigos.

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Vibra o Passado em Tudo o que Palpita

Vibra o passado em tudo o que palpita
qual dança em coração de bailarino
ao regressar já mudo o violino
e há nuvens sobre o bosque em que transita

À paz dos seres a morte em seu contínuo
crescer em ramos de coral incita
a bem da noite negra e infinita
ser um raro instrumento é seu destino:

O ceptro dos eleitos que não cansam
o corpo que este tempo já não quebra
é como a cruz que os astros quando avançam

sobre o sul traçam por medida e regra
Os deuses têm-no em suas mãos cativo
risível é quem eles mandam vivo.

Tradução de Vasco Graça Moura

Século XXI

Falam de tudo como se a razão
lhes ensinasse desesperadamente
a mentir, a lançar
sem remorso nem asco um novo isco
à espera que alguém morda
e acredite nessa liturgia
cujos deuses são fáceis de adorar
e obedecem às leis do mercado.

Falam desse ludíbrio a que chamam
o futuro
como se ele existisse
e as suas palavras ecoam
em flatulentas frases
sempre a favor do vento que as agita
ao ritmo dos sorrisos ou das entrevistas
em que tudo se vende
por um preço acessível: emoções
& sexo & fama & outros prometidos
paraísos terrestres em horário nobre
– matéria reciclável
alimentando o altar do esquecimento.

O poder não existe, como sabes
demasiado bem – apenas uma
inútil recidiva biológica
de hormonas apressadas que procuram
ser fiéis aos comércio
dos sonhos sempre iguais, reproduzindo
sedutoras metástases do nada
nos códigos de barras ou nos cromossomas
de quem já pouco espera dos seus genes.

Quem afasta a amizade da vida parece que arranca o sol do mundo, pois os deuses imortais não nos deram nada melhor nem mais doce.

O Futuro de Portugal

O que calcula que seja o futuro da raça portuguesa?
— O Quinto Império. O futuro de Portugal — que não calculo, mas sei — está escrito já, para quem saiba lê-lo, nas trovas do Bandarra, e também nas quadras de Nostradamus. Esse futuro é sermos tudo. Quem, que seja português, pode viver a estreiteza de uma só personalidade, de uma só nação, de uma só fé? Que português verdadeiro pode, por exemplo, viver a estreiteza estéril do catolicismo, quando fora dele há que viver todos os protestantismos, todos os credos orientais, todos os paganismos mortos e vivos, fundindo-os portuguesmente no Paganismo Superior? Não queiramos que fora de nós fique um único deus! Absorvamos os deuses todos! Conquistamos já o Mar: resta que conquistemos o Céu, ficando a terra para os Outros, os eternamente Outros, os Outros de nascença, os europeus que não são europeus porque não são portugueses. Ser tudo, de todas as maneiras, porque a verdade não pode estar em faltar ainda alguma cousa! Criemos assim o Paganismo Superior, o Politeísmo Supremo! Na eterna mentira de todos os deuses, só os deuses todos são verdade.

No campo daqueles que procuram a verdade, não existe nenhuma autoridade humana. Todo aquele que se fizer de magistrado encontrará imediatamente a risada dos deuses.

A Melhoria dos Povos Melhora os seus Deuses

À medida que os povos se tornam melhores, os Deuses melhoram também. Mas como não se lhes pode eliminar, imediatamente, as particularidades humanas que tempos mais grosseiros lhes atribuiram, as pessoas sensatas têm durante um certo tempo ainda, muitas coisas como incompreensíveis ou explicam-nas por meio de símbolos.

Aproveitar o Tempo

Aproveitar o tempo!
Mas o que é o tempo, que eu o aproveite?
Aproveitar o tempo!
Nenhum dia sem linha…
O trabalho honesto e superior…
O trabalho à Virgílio, à Mílton…
Mas é tão difícil ser honesto ou superior!
É tão pouco provável ser Milton ou ser Virgílio!

Aproveitar o tempo!
Tirar da alma os bocados precisos – nem mais nem menos –
Para com eles juntar os cubos ajustados
Que fazem gravuras certas na história
(E estão certas também do lado de baixo que se não vê)…
Pôr as sensações em castelo de cartas, pobre China dos serões,
E os pensamentos em dominó, igual contra igual,
E a vontade em carambola difícil.
Imagens de jogos ou de paciências ou de passatempos –
Imagens da vida, imagens das vidas. Imagens da Vida.

Verbalismo…
Sim, verbalismo…
Aproveitar o tempo!
Não ter um minuto que o exame de consciência desconheça…
Não ter um acto indefinido nem factício…
Não ter um movimento desconforme com propósitos…
Boas maneiras da alma…
Elegância de persistir…

Aproveitar o tempo!

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Podemos Crer-nos Livres

Aqui, Neera, longe
De homens e de cidades,
Por ninguém nos tolher
O passo, nem vedarem
A nossa vista as casas,
Podemos crer-nos livres.

Bem sei, é flava, que inda
Nos tolhe a vida o corpo,
E não temos a mão
Onde temos a alma;
Bem sei que mesmo aqui
Se nos gasta esta carne
Que os deuses concederam
Ao estado antes de Averno.

Mas aqui não nos prendem
Mais coisas do que a vida,
Mãos alheias não tomam
Do nosso braço, ou passos
Humanos se atravessam
Pelo nosso caminho.

Não nos sentimos presos
Senão com pensarmos nisso,
Por isso não pensemos
E deixemo-nos crer
Na inteira liberdade
Que é a ilusão que agora
Nos torna iguais dos deuses.

Tão correto e tão bonito o infinito é realmente um dos Deuses mais lindos, sei que às vezes uso palavras repetidas mas quais são as palavras que nunca são ditas?