Passou a DiligĂȘncia pela Estrada
Passou a diligĂȘncia pela estrada, e foi-se;
E a estrada nĂŁo ficou mais bela, nem sequer mais feia.
Assim é a acção humana pelo mundo fora.
Nada tiramos e nada pomos; passamos e esquecemos;
E o sol Ă© sempre pontual todos os dias.
Passagens sobre DiligĂȘncia
31 resultadosA diligĂȘncia nĂŁo perde a ocasiĂŁo, a pressa nĂŁo espera por ela.
Cobiça com diligĂȘncia, nem vergonha, nem consciĂȘncia.
As primeiras horas da manhĂŁ de um dia de julho, uma diligĂȘncia saiu ruidosamente de N., capital da provĂncia de Z., e seguiu pela estrada da mala-posta.
A Roda da Fortuna
NĂŁo se move a roda, sem que a parte que virou para o cĂ©u seja maior repuxo para tocar na terra, e a parte que se viu no ar erguida se veja logo da mesma terra pisada, sem outro impulso para descer, mais que com o mesmo movimento com que subiu; por isso a fortuna fez trono da sua mesma roda, porque, como na figura esfĂ©rica se nĂŁo conhece nela primeiro nem Ășltimo lugar, nas felicidades andam sempre em confusĂŁo as venturas. Na dita com que se sobe, vai sempre entalhado o risco com que se desce. NĂŁo hĂĄ estrela no cĂ©u que mais prognostique a ruĂna de um grande, que o levantar de sua estrela. Mais depressa se move aos afagos da grandeza que nos lisonjeia, do que aos desfavores com que a fortuna nos abate.
Quanto trabalharam os homens para subir, tantas foram as diligĂȘncias que fizeram para se arruinarem; porque, como a fortuna (falo com os que nĂŁo sĂŁo benemĂ©ritos) nĂŁo costuma subir a ninguĂ©m por seus degraus, em faltando degraus para a descida, tudo hĂŁo-de ser precipĂcios; e diferem muito entre si o descer e o cair. Se perguntarmos o por que caiu Roma, o maior impĂ©rio do Mundo,
Ă Virtude Dissimular a Virtude
– Vede, caro Roberto, o senhor de Salazar nĂŁo diz que o sensato deve simular. Sugere-vos, se bem entendi, que deve aprender a dissimular. Simula-se o que nĂŁo se Ă©, dissimula-se o que se Ă©. Se vos gabardes do que nĂŁo fizestes, sois um simulador. Mas se evitardes, sem fazĂȘ-lo notar, mostrar em pleno o que fizestes, entĂŁo dissimulais. Ă virtude acima de todas as virtudes dissimular a virtude. O senhor de Salazar estĂĄ a ensinar-vos um modo prudente de ser virtuoso, ou de ser virtuoso de acordo com a prudĂȘncia. Desde que o primeiro homem abriu os olhos e soube que estava nu, procurou cobrir-se atĂ© Ă vista do seu Fazedor: assim a diligĂȘncia no esconder quase nasceu com o prĂłprio mundo. Dissimular Ă© estender um vĂ©u composto de trevas honestas, do qual nĂŁo se forma o falso mas sim dĂĄ algum repouso ao verdadeiro.
A rosa parece bela porque à primeira vista dissimula ser coisa tão caduca, e embora da beleza mortal costume dizer-se que não parece coisa terrena, ela não é mais do que um cadåver dissimulado pelo favor da idade. Nesta vida nem sempre se deve ser de coração aberto, e as verdades que mais nos importam dizem-se sempre até meio.
Formar Conceito
Formar conceito, e mais do que mais importa. Por nĂŁo pensarem perdem-se todos os nĂ©scios: nunca concebem nas coisas nem a metade; e, como nĂŁo percebem o dano nem a conveniĂȘncia, tampouco aplicam a diligĂȘncia. Alguns fazem muito caso do que pouco importa, e pouco caso do que importa muito, ponderando sempre Ă s avessas. Muitos, por serem faltos de senso, nĂŁo o perdem. Coisas hĂĄ que se deveriam observar com todo o empenho, e conservar na profundidade da mente. O sĂĄbio forma conceito de tudo, ainda que, discernindo, cave onde haja fundo e reparo, pensando Ă s vezes que haja mais do que pensa; de tal sorte que a reflexĂŁo chega aonde nĂŁo chegou a apreensĂŁo.
A boa diligĂȘncia Ă© mĂŁe de boa fortuna (ventura).
Passagem das Horas
Trago dentro do meu coração,
Como num cofre que se nĂŁo pode fechar de cheio,
Todos os lugares onde estive,
Todos os portos a que cheguei,
Todas as paisagens que vi através de janelas ou vigias,
Ou de tombadilhos, sonhando,
E tudo isso, que Ă© tanto, Ă© pouco para o que eu quero.A entrada de Singapura, manhĂŁ subindo, cor verde,
O coral das Maldivas em passagem cĂĄlida,
Macau Ă uma hora da noite… Acordo de repente
Yat-iĂŽ–ĂŽ-ĂŽ-ĂŽ-ĂŽ-ĂŽ-ĂŽ-ĂŽ-ĂŽ … Ghi-…
E aquilo soa-me do fundo de uma outra realidade
A estatura norte-africana quase de Zanzibar ao sol
Dar-es-Salaam (a saĂda Ă© difĂcil)…
Majunga, Nossi-BĂ©, verduras de Madagascar…
Tempestades em torno ao Guardaful…
E o Cabo da Boa Esperança nĂtido ao sol da madrugada…
E a Cidade do Cabo com a Montanha da Mesa ao fundo…Viajei por mais terras do que aquelas em que toquei…
Vi mais paisagens do que aquelas em que pus os olhos…
Experimentei mais sensaçÔes do que todas as sensaçÔes que senti,
Porque, por mais que sentisse, sempre me faltou que sentir
E a vida sempre me doeu,
A diligĂȘncia Ă© a mĂŁe da prosperidade.
Da Leitura
NĂŁo leiais para refutar ou contradizer, para aceitar ou aquiescer, para perorar ou discursar, mas para ponderar e considerar. Certos livros devem ser provados; outros engolidos; uns poucos mastigados e digeridos. Quer dizer: devemos ler certos livros apenas parceladamente; outros incuriosamente, e uns poucos da primeira Ă Ășltima pĂĄgina, com diligĂȘncia e atenção. Alguns livros podem mesmo ser lidos por terceiros, que nos farĂŁo deles um apanhado, mas isso somente no caso de assuntos desimportantes, e de livros medĂocres, pois livros resumidos sĂŁo como ĂĄgua destilada: insĂpidos.
O ler faz um homem completo, o conferir destro, o escrever exacto. Bem por isso, se alguĂ©m escreve pouco, deve ter boa memĂłria; se confere pouco, muita sagacidade; se lĂȘ pouco, muita manha para afectar saber o que nĂŁo sabe.