Delicadeza
Essa delicadeza, cada vez mais difĂcil, pela qual se perde
a vida, como a entendo,
pratico.
Essa subtileza de pesadelo branco, como a sinto
extrema sempre,
Ă s vezes.
IngĂ©nua – um animal discreto; sem dono
e sem direitos.
Por ela arrisco um aceitar alguém
que nunca foi
criança.
Um ler que me não prende mais a atenção, um ser gentil
para com uma pessoa ingrata
– um cultivar uma paixĂŁo isenta
“dos cardos do contacto”.
Um nĂŁo precisar esclarecer seja o que for,
pois tudo na vida Ă© afinal
bem mais sério
do que parece.
É por essa gentileza
que se um grito me chega ao ouvido
prefiro escutar nele o cheiro de um corpo que se perdeu
do meu
e ainda assim dizer
Deus seja louvado,
oxalá ele consiga agora ficar
silencioso qual rasto de leitura sem palavra.
Sim, Ă© por essa gentileza, mulher poeta ou homem sensĂvel
– nĂŁo me distingo nem de um nem do outro -,
que muito embora as minhas esperanças
se tenham desfeito há muito
me permito,
Passagens de Eduarda Chiote
3 resultadosFica Comigo
MĂŁe,
arqueia os joelhos
para que o crepĂşsculo do medo
possa ceder ao berço
onde repouse.
E nĂŁo me toques. NĂŁo me toques,
nĂŁo me beijes.
Deixa-me permanecer aninhado no vazio
qual bicho de
sono.
NĂŁo me despertes.
MĂŁe, sou um menino de leite.
Apaga o seio.
Fica comigo: a noite
começa.
Uma Beleza DificĂlima
O silĂŞncio
abre
o coração das sombras.
Por tal sossego, as árvores
caminham. Mas sĂŁo as mulheres quem lhes assegura
a elegância do porte.A harmonia vem do peso da luz
sob a cabeça. Das mãos em arco: os ramos seguram.
Altas sĂŁo as folhas. Simples.
Lisa a copa.Não há rumor na terra.
As feras nĂŁo nasceram ainda. Apenas os peixes.
Fora de água
respiram.Sim.
O mundo pode ser belo,
apesar de sĂł.Basta-lhe o fulgor no mais escalvado da noite
e meninos esbeltos e
gelados no sol.
E uma beleza dificĂlima. E um cauteloso
azul nas garças abatidas pelo céu.
E um primeiro espanto,
uma primeira alegria nas fendas
em direcção
ao pĂł.