É mais por estima pelos nossos sentimentos que exageramos as boas qualidades dos outros, que pelo seu mérito, e apenas desejamos receber elogios quando aparentamos dá-los.
Passagens sobre Estima
104 resultadosAquele que pode negar Deus diante de uma noite estrelada, diante da sepultura das pessoas que mais estima, diante do martírio, é muito infeliz ou muito culpado.
Quem Jaz no Grão Sepulcro
Quem jaz no grão sepulcro, que descreve
Tão ilustres sinais no forte escudo?
Ninguém, que nisso, enfim, se torna tudo;
Mas foi quem tudo pôde e quem tudo teve.Foi Rei? Fez tudo quanto a Rei deve:
Pôs na guerra e na paz devido estudo.
Mas quão pesado foi ao Mouro rudo,
Tanto lhe seja agora a terra leve.Alexandre será? Ninguém se engane:
Mais que o adquirir, o sustentar estima.
Será Adriano grão senhor do mundo?Mais observante foi da Lei de cima.
É Numa? Numa não, mas é Joane
De Portugal Terceiro sem Segundo.
Perde a estima o que pouco custa.
As Três Fases da Moralidade
Temos o primeiro sinal de que o animal se tornou homem, quando a sua actuação já não se relaciona com o bem-estar momentâneo, mas com o duradouro, prova de que o homem adquire o sentido do “útil”, do “adequado”: é então que, pela primeira vez, irrompe o livre senhorio da razão. Um estádio ainda mais elevado é alcançado, quando ele age consoante o princípio da honra; graças ao mesmo, ele adapta-se, submete-se a sentimentos comuns, e isso ergue-o muito acima da fase, em que só a utilidade entendida em termos pessoais o guiava: ele respeita e quer ser respeitado, isto é, entende o proveito como dependente do que ele opina acerca dos outros, do que os outros opinam acerca dele. Finalmente, na fase mais elevada da moralidade em uso até agora, ele age segundo o seu critério quanto às coisas e às pessoas, ele próprio determina para si e para outros o que é honroso, o que é útil; tornou-se o legislador das opiniões, em conformidade com o conceito cada vez mais desenvolvido do útil e do honroso. O conhecimento habilita-o a preferir o mais útil, ou seja, a colocar o proveito geral e duradouro à frente do pessoal, a respeitosa estima de valia geral e duradoura à frente da momentânea;
Sinceridade Proscrita
A verdade permanece sepultada sob as máximas de uma falsa delicadeza. Chama-se saber viver à arte de viver com baixeza. Não se põe diferença entre conhecer o mundo e enganá-lo; e a cerimónia, que deveria ater-se inteiramente ao exterior, introduz-se nos nossos costumes mesmos.
A ingenuidade deixa-se aos espíritos pequenos, como uma marca da sua imbecilidade. A franqueza é olhada como um vício na educação. Nada de pedir que o coração saiba manter o seu lugar; basta que façamos como os outros. É como nos retratos, aos quais não se exige mais do que parecença. Crê-se ter achado o meio de tornar a vida deliciosa, através da doçura da adulação.
Um homem simples que não tem senão a verdade a dizer é olhado como o perturbador do prazer público. Evitam-no, porque não agrada; evita-se a verdade que anuncia, porque é amarga; evita-se a sinceridade que professa porque não dá frutos senão selvagens; temem-na porque humilha, porque revolta o orgulho que é a mais cara das paixões, porque é um pintor fiel, que faz com que nos vejamos tão disformes como somos.
Não há por que nos espantarmos, se ela é rara: é expulsa, proscrita por toda a parte.
Glória é Vaidade
A glória repousa propriamente sobre aquilo que alguém é em comparação com os outros. Portanto, ela é essencialmente relativa; por isso, só pode ter valor relativo. Desapareceria inteiramente se os outros se tornassem o que o glorioso é. Uma coisa só pode ter valor absoluto se o mantiver sob todas as circunstâncias; aqui, contudo, trata-se daquilo que alguém é imediatamente e por si mesmo. Consequentemente, é nisso que tem de residir o valor e a felicidade do grande coração e do grande espírito. Logo, valiosa não é a glória, mas aquilo que faz com que alguém a mereça, pois isso, por assim dizer, é a substância, e a glória é apenas o acidente. Ela age sobre quem é célebre, sobretudo como um sintoma exterior pelo qual ele adquire a confirmação da opinião elevada de si mesmo. Desse modo, poder-se-ia dizer que, assim como a luz não é visível se não for reflectida por um corpo, toda a excelência só adquire total consciência de si própria pela glória. Mas o sintoma não é sempre infalível, visto que também há glória sem mérito e mérito sem glória. Eis a justificativa para a frase tão distinta de Lessing: Algumas pessoas são famosas, outras merecem sê-lo.
Soneto XXXIII
Nunca se viu tão duro coração
Que sentindo chorar não distilasse
Lágrimas fervorosas, nem mostrasse
Que tinha do que via compaixão.Não espalhou Orfeu seus ais em vão,
Mas antes acabara que chorasse,
E que outro novo pranto levantasse,
Quem nunca se doera de aflição.Como não chorará com larga veia
Meu mal quem mo causou, e pouco o estima,
Pois chorá-lo te vê tão tristemente,Sendo mui natural que mais lastima
Quem chora como sua a pena alheia,
Que quem a pena própria chora, e sente.
Não Louvar nem Censurar
Parece-me que quando se relata uma acção boa ou má não se deve nem louvá-la, nem censurá-la, pois ela faz sentir muito bem o que é, sendo melhor deixar livre o julgamento a seu respeito. E, depois, como a maior parte dos louvores provêm da adulação, a sociedade raramente se compraz com isso, e a maledicência leva a pensar que se é invejoso ou maldoso. É bem possível exaltar as pessoas que se ama, sem falar muito do seu mérito; e para os outros que não se estima, é um favor não dizer nada deles.
Acho também que todo o tipo de gente, mesmo a mais modesta, estima que a consideremos e que a tratemos afavelmente. Há poucas pessoas, não obstante, que toleram ser louvadas quando estão presentes, pois, normalmente, procede-se desastradamente, expondo-as e embaraçando-as. Mas os louvores que honram aquele que os faz, assim como aquele que os recebe, agradam muito quando são descobertos por meio de alguém que os relata, e quando não são suspeitos nem de interesse, nem de adulação e particularmente se são de boa origem. Pois, assim como o afecto é bem acolhido apenas quando vem de uma pessoa amável, também é necessário ter mérito,
O Substrato Afectivo Eterno
A familiaridade com um autor é a adesão ao mundo por ele criado. Podemos esquecer – e esquecemos – as subtilezas de estilo, o virtuosismo da composição, mas perdura por anos e anos, e às vezes para sempre, uma certa personagem, um certo lance, uma frase que nos faz estremecer, pois é predominantemente a este nível que um texto revela a sua comunicabilidade essencial. Isto é: a estima por um autor resulta sobretudo de ingredientes que nos impressionaram a sensibilidade, o que equivale a dizer: o privilégio de durar na memória dos homens tem, em regra, um substrato afectivo.
Em alguma preferência uma estima é baseada,
E estimar todo o mundo é não estimar nada.
A estima das coisas consiste muito em carecer delas.
O amor, (…), como tu sabes é feito de muitos sentimentos diferentes. Alguém escreveu, creio que até fui eu – que era uma bela flor com raízes diversas. Ora quando uma dessas raízes é a estima absoluta pode ele ao fim de longos anos secar pelas outras raízes mas permanecer vivo por essa.
O Verdadeiro e o Falso Ciúme
O ciúme é uma espécie de temor, que se relaciona com o desejo de conservarmos a posse de algum bem; e não provém tanto da força das razões que levam a julgar que podemos perdê-lo, como da grande estima que temos por ele, a qual nos leva a examinar até os menores motivos de suspeita e a tomá-los por razões muito dignas de consideração.
E como devemos empenhar-nos mais em conservar os bens que são muito grandes do que os que são menores, em algumas ocasiões essa paixão pode ser justa e honesta. Assim, por exemplo, um chefe de exército que defende uma praça de grande importãncia tem o direito de ser zeloso dela, isto é, de suspeitar de todos os meios pelos quais ela poderia ser assaltada de surpresa; e uma mulher honesta não é censurada por ser zelosa de sua honra, isto é, por não apenas abster-se de agir mal como também evitar até os menores motivos de maledicência.
Mas zombamos de um avarento quando ele é ciumento do seu tesouro, isto é, quando o devora com os olhos e nunca quer afastar-se dele, com medo que ele lhe seja furtado; pois o dinheiro não vale o trabalho de ser guardado com tanto cuidado.
Soneto XI
Lá nua estranha e solitária terra,
De gente e nação bárbara habitada,
O metal nobre não se estima em nada
Que embalde seu valor e preço encerra.Ouro, com que se arrea e move guerra
A corações, a Dama delicada,
Serve lá de grilhão, que em apertada
Corrente a malfeitores fecha e cerra.Nace esta confusão e diferença
Do muito que uns o seu valor alcançam,
E do pouco que de outros se conhece.Julguem do Sol, e sua glória imensa
Os olhos d’Águia, já que todos cansam,
Que só para tais olhos resplandece.
Incontentado
Paixão sem grita, amor sem agonia,
Que não oprime nem magoa o peito,
Que nada mais do que possui queria,
E com tão pouco vive satisfeito.Amor, que os exageros repudia,
Misturado de estima e de respeito,
E, tirando das mágoas alegria,
Fica farto, ficando sem proveito.Viva sempre a paixão que me consome,
Sem uma queixa, sem um só lamento!
Arda sempre este amor que desanimas!Eu eu tenha sempre, ao murmurar teu nome,
O coração, malgrado o sofrimento,
Como um rosal desabrochado em rimas.
Quando os povos deixam de ter estima, deixam de obedecer. Regra geral as nações que os reis reúnem ou consultam começam por votos e acabam por vontades.
Achar a Chave para Cada Um
É a arte de mover vontades; mais consiste em destreza do que em resolução: saber por onde entrar em cada um. Não há vontade sem pendor especial, diferente segundo a variedade dos gostos. Todos são idólatras, uns da estima, outros do interesse, a maioria do deleite. A manha está em conhecer esses ídolos para motivar; conhecer o impulso eficaz de cada um é como ter a chave do querer alheio. Deve-se ir ao primeiro móbil, que nem sempre é o supremo; o mais das vezes é o ínfimo, porque no mundo são mais os desregrados que os subordinados. Primeiro há de se prevenir o génio, depois tocar-lhe o verbo, para atacar a afeição, que infalivelmente porá em mate o arbítrio.
Amizade Sem Sinceridade
Acredita-se ter encontrado um meio de tornar a vida deliciosa através da bajulação. Um homem simples que apenas diz a verdade é visto como o perturbador do prazer público. Foge-se dele porque não agrada a ninguém; foge-se da verdade que ele enuncia, porque é amarga; foge-se da sinceridade que proclama porque apenas traz frutos selvagens; tem-se receio dela porque humilha, porque revolta o orgulho que é a mais estimada das paixões, porque é um pintor fiel que nos faz ver quão disformes somos.
Não admira que seja tão rara: em toda a parte (a sinceridade) é perseguida e proscrita. Coisa maravilhosa, ela encontra a custo um refúgio no seio da amizade.
Sempre seduzidos pelo mesmo erro, só fazemos amigos para ter pessoas particularmente destinadas a nos agradarem: a nossa estima resume-se à sua complacência; o fim dos consentimentos acarreta o fim da amizade. E quais são esses consentimentos? O que é que mais nos agrada nos amigos? São os contínuos elogios que lhes cobramos como tributos.
A que se deve que já não haja verdadeira amizade entre os homens? Que esse nome não seja mais do que uma armadilha que empregam com vileza para seduzir? «É, diz um poeta (Ovídio),
Passamos a vida a mentir, até, sobretudo, talvez apenas, àqueles que amamos. Com efeito, somente esses podem pôr em perigo os nossos prazeres e fazer-nos desejar a sua estima.