Duvide que as estrelas sejam fogo, Duvide que o Sol se mova, Duvide que verdade seja mentira; Mas não duvide que eu te amo!
Passagens sobre Fogo
465 resultadosAmor é fogo que arde sem se ver
Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Sem um Filho te Apagarás no Poente
A luz real ergueu-se a oriente
com a coroa de fogo na cabeça:
e o nosso olhar, vassalo obediente,
ajoelha ante a visão que recomeça.Enquanto sobe, Sua Majestade,
a colina do céu a passos de oiro,
adoramos-lhe a adulta mocidade
que fulge com as chamas dum tesoiro.Mas quando o carro fatigado alcança
o cume e se despenha pela tarde,
desviamos os olhos já sem esperança:no crepúsculo estéril nada arde.
Assim tu, meio dia ainda ardente,
sem um filho te apagarás no poente.Tradução de Carlos de Oliveira
Não se apaga o fogo com resinas, nem a cólera com más palavras.
Pelos Extremos Raros Que Mostrou
Pelos extremos raros que mostrou
em saber, Palas, Vénus em fermosa,
Diana em casta, Juno em animosa,
África, Europa e Asia as adorou.Aquele saber grande que ajuntou
esprito e corpo em liga generosa,
esta mundana máquina lustrosa,
de só quatro Elementos fabricou.Mas mor milagre fez a natureza
em vós, Senhoras, pondo em cada üa
o que por todas quatro repartiu.A vós seu resplandor deu Sol e Lüa,
a vós com viva luz, graça e pureza,
Ar, Fogo, Terra e Água vos serviu.
Metempsicose
Ausentes filhas do prazer: dizei-me!
Vossos sonhos quais são, depois da orgia?
Acaso nunca a imagem fugidia
Do que fostes, em vós se agita e freme?N’outra vida e outra esfera, aonde geme
Outro vento, e se acende um outro dia,
Que corpo tinheis? que matéria fria
Vossa alma incendiou, com fogo estreme?Vós fostes nas florestas bravas feras,
Arrastando, leôas ou pantheras,
De dentadas de amor um corpo exangue…Mordei pois esta carne palpitante,
Feras feitas de gaze flutuante…
Lobas! leôas! sim, bebei meu sangue!
Os Únicos Casamentos Felizes
É evidente que os únicos casamentos felizes são os de conveniência, funcionam às mil maravilhas, sem conflitos, porque cada um sabe que a realização das suas ambições depende da aliança com o outro. Dá gosto ver como trabalham em equipa os casais que entenderam essa ideia (casamento = sociedade limitada). Desenvolvem-se como uma empresa, apoiando-se um ao outro sem hesitar, cada um deles especializado numa determinada atividade para obterem o máximo rendimento do seu investimento, pois sabem que os ganhos de um beneficiarão os dois. As discussões em público, as desavenças, os anúncios de separação fazem cair as ações da bolsa social e prejudicam a economia doméstica, há que evitar toda essa merda que os jovens e alguns imbecis publicitam aos quatro ventos, sem se darem conta de que estão a desvalorizar-se. Acreditam no amor e no desamor, na traição e no ciúme, sem entenderem que, quando se mete de permeio isso a que os romances e as revistas cor-de-rosa chamam amor, está tudo fodido. É o fim da paz. Quando alguém te diz que te amará para sempre, a história já começou a meter água. O montanhista não pode ficar eternamente parado no cume que conquistou. Já alcançou o topo.
Sou como bombeiro. Quando saio num chamado, eu quero apagar um grande fogo, eu não quero apagar um fogo numa caçamba.
Devemos desconfiar do amor que nasce antes de criar raízes: o fogo incipiente apaga-se com pouca água.
Seus Olhos
Seus olhos – que eu sei pintar
O que os meus olhos cegou –
Não tinham luz de brilhar,
Era chama de queimar;
E o fogo que a ateou
Vivaz, eterno, divino,
Como facho do Destino.Divino, eterno! – e suave
Ao mesmo tempo: mas grave
E de tão fatal poder,
Que, um só momento que a vi,
Queimar toda a alma senti…
Nem ficou mais de meu ser,
Senão a cinza em que ardi.
Amo a guerra, adoro o fogo, elemento natural do jogo, senhores: Jamais me revelarei.
Spleen De Deuses
Oh! Dá-me o teu sinistro Inferno
Dos desesperos tétricos, violentos,
Onde rugem e bramem como os ventos
Anátemas da Dor, no fogo eterno…Dá-me o teu fascinante, o teu falerno
Dos falernos das lágrimas sangrentos
Vinhos profundos, venenosos, lentos
Matando o gozo nesse horror do Averno.Assim o Deus dos Páramos clamava
Ao Demônio soturno, e o rebelado,
Capricórnio Satã, ao Deus bradava.Se és Deus-e já de mim tens triunfado,
Para lavar o Mal do Inferno e a bava
Dá-me o tédio senil do céu fechado…
O Remorso
Cometi o pior desses pecados
Que podem cometer-se. Não fui sendo
Feliz. Que os glaciares do esquecimento
Me arrastem e me percam, despiedados.Plos meus pais fui gerado para o jogo
Arriscado e tão belo que é a vida,
Para a terra e a água, o ar, o fogo.
Defraudei-os. Não fui feliz. CumpridaNão foi sua vontade. A minha mente
Aplicou-se às simétricas porfias
Da arte, que entretece ninharias.Valentia eu herdei. Não fui valente.
Não me abandona. Está sempre ao meu lado
A sombra de ter sido um desgraçado.Tradução de Fernando Pinto do Amaral
Quimeras
Há na minha vida quimeras distantes,
Quais nuvens errantes, em dias atrozes.
Eu corro atrás delas, mas elas, por fim,
Perdem-se de mim, no horizonte, velozes.Há no meu diário silenciosas dores,
Quais flores que o vento desfaz de manhã.
Com elas me embalo nos dias soturnos,
Dir-se-iam «Nocturnos», como os de Chopin.Há no meu caminho nem sei bem o quê.
Alguém que me vê e que eu não visiono.
São meus dias passados, meus dias de infância,
Sabendo à fragrância das tardes de Outono.Saudades, saudades, sentido da vida,
Um dia vivida e que não volta mais.
Meus dias passados, sobre eles me debruço,
No eterno soluço das coisas mortais.Há na minha vida um viver fictício,
Fogo de artifício, esplendente e altivo.
Eu vejo-o enlevado, um instante fugaz,
Depois se desfaz na noite em que eu vivo.Há na minha vida ignotas tristezas,
Pequenas certezas a que me apeguei.
Com elas eu vivo, com elas eu morro,
Para meu socorro é que eu as criei.Quimeras, quimeras,
Amor é um Arder
Amor é um arder que se não sente;
É ferida que dói, e não tem cura;
É febre, que no peito faz secura;
É mal, que as forças tira de repente.É fogo, que consome ocultamente;
É dor, que mortifica a Criatura;
É ânsia, a mais cruel e a mais impura;
É frágoa, que devora o fogo ardente.É um triste penar entre lamentos;
É um não acabar sempre penando;
É um andar metido em mil tormentos.É suspiros lançar de quando em quando;
É quem me causa eternos sentimentos.
É quem me mata e vida me está dando.[Imitando Camões]
Um tímido pudor activos fogos
Contrariava em vão, em vão retinha
Ignotos medos, sôfregos desejos.
Suspensa e curiosa, eu esperava
Gostosa cena, em que prolixas noites
Pensando o que seria, despendera.
A velha fábula de Prometeu que roubou o fogo do céu para comer os cadáveres dos animais cozinhados, eis a base em que assenta toda a errónea conduta da humanidade.
A Dança Da Psiquê
A dança dos encéfalos acesos
Começa. A carne é fogo. A alma arde. A espaços
As cabeças, as mãos, os pés e os braços
Tombara, cedendo à ação de ignotos pesos!É então que a vaga dos instintos presos
– Mãe de esterilidades e cansaços –
Atira os pensamentos mais devassos
Contra os ossos cranianos indefesos.Subitamente a cerebral coréa
Pára. O cosmos sintético da Idéa
Surge. Emoções extraordinárias sinto…Arranco do meu crânio as nebulosas.
E acho um feixe de forças prodigiosas
Sustentando dois monstros: a alma e o instinto!
Inominado Nome
Persigo-o no ininteligível arbítrio
dos astros, na clandestina linfa
que percorre os túrgidos corredores
do indecifrável, nos falsos indícios
que, de fogos fátuos, escurecema persistente incógnita do nome.
Em persegui-lo persisto onde, bem
sei, não lograrei achá-lo, que nunca
achado será em tempo ou espaço
que excedam meu limite e dimensão.Um nome, ainda obscuro, pressinto
no sal da boca amarga, Conheço-lhe
o rosto familiar, desfocado embora,
no halo do tempo e da distância.
É, creio, a face indefectível de tudoquanto tenho de calar. Este nome
(este rosto) habita-me silente, contra
a recusa, a mentira, ou a calúnia.
Na epiderme, nos nervos e na carne,
sobre a língua e o palato, adivinho-lheforma, sabor e propósito. Ouço-o
dentro de mim, mau grado
o queira ou não, que em mim
só está sofrê-lo porque em mim
vive e dura, enquanto eu dure e viva.E não por meu mal, que meu
mal seria, mais que perdê-lo,
sem ele viver.
Um rosto persigo,
um nome guardo no sal da bocaamarga,
Não se pode arrancar uma página da vida, somente jogar o livro inteiro no fogo.