O Antagonismo Racial
O elemento puramente instintivo não constitui senão uma pequena parte do ódio racial e não é difícil de vencer. O medo do que é estrangeiro, que é a sua principal essência, desaparece com a familiaridade. Se nenhum outro elemento o formasse, toda a perturbação desapareceria logo que pessoas de raças diferentes se habituassem umas às outras. Mas há sempre pretextos para se odiarem os grupos estrangeiros. Os seus hábitos são diferentes dos nossos e portanto (em nossa opinião) piores. Se triunfam, é porque nos roubam as oportunidades; se não triunfam, é porque são miseráveis vagabundos. A actual população do mundo descende dos sobreviventes de longos séculos de guerras e por instinto está à espreita de ocasiões de hostilidade colectiva.
O desejo de ter um inimigo fixa-se no coração desse instinto racista e constrói à sua volta um edifício monstruoso de crueldade e de loucura. Tais conflitos representam hoje uma catástrofe universal e não já somente, como outrora, um desastre para os vencidos: daí as inquietações do nosso tempo. É por isso que é mais importante do que nunca conseguir um certo grau de domínio racional sobre os nossos sentimentos destruidores.
Em geral o ódio racial tem duas origens, aparentemente opostas mas na realidade intimamente ligadas entre si: por um lado o desejo de se sentir superior, pelo outro o receio de ser inferior. O homem natural deseja sentir-se importante: tem portanto tendências para desprezar uma sociedade a que não pertence. Os homens menosprezam as mulheres – não são elas incapazes de raciocinar? As mulheres desprezam os homens – não são eles somente crianças crescidas? O inglês costuma desprezar o francês – não comem eles rãs? O francês por sua vez despreza o inglês – não se embebedam eles com cerveja? Quando tais sentimentos de superioridade são sinceros, podemos sentir uma simpatia ao mesmo tempo afável e desdenhosa por um grupo de fãs de que não façamos parte.
Mas quando esse sentimento de superioridade, ameaçado, é substituído, em parte ou completamente, por um sentimento de inferioridade, uma sensação mais profunda entra em jogo: a hostilidade medrosa que todos os animais gregários sentem em relação aos membros dos outros grupos. Strindberg odiava as mulheres porque tinha medo delas. As mulheres que têm somente preocupações domésticas nada têm a recear dos homens, pois no seu domínio a sua autoridade é incontestada. Mas quando as feministas começaram a interessar-se pela política, viram-se obrigadas a odiar os homens, porque eles desfrutavam, nessa esfera, de um poder superior.
Sucedeu o mesmo com os proprietários de escravos. Enquanto estes se contentaram com a sua situação inferior, os senhores podiam tratá-los com uma familiaridade condescendente; mas logo que os escravos reclamaram a igualdade, tornaram-se inquietantes e despertaram o ódio.
As causas de fricção entre raças diferentes são muito variadas e vão desde o cego instinto biológico, ao cálculo absolutamente consciente do interesse egoísta.