A Nulidade como Ideal
A nulidade exige ordem. Tem necessidade de uma hierarquia, de meios de pressão, de agentes e de uma finalidade que se confunda consigo própria. Para manter o ser humano no seu nível mais baixo, onde não corre o risco de fazer ondas, nada melhor que uma organização estruturada com níveis de poder e peões disciplinados capazes de os exercer. Qualquer estrutura deste tipo aguenta-se de pé devido à convicção geral de que não é necessário explicar para se ser obedecido, nem compreender para obedecer. A verdade difunde-se por si só de cima para baixo pelo mero efeito do ascensor hieráriquico. A eficácia é proporcional ao grau de complexidade graças ao qual é mantida a ilusão de uma certa liberdade em todos os níveis de comando.
Quanto mais insignificantes são as engrenagens humanas, mais fácil é convencê-las da sua falsa autonomia. As nulidades fornecem as melhores engrenagens, associando o máximo de inércia intelectual ao máximo de aplicação no exercício de uma ditadura sobre a pequena porção de poder que lhes cabe. Essas estruturas, onde todos têm razão quando estão acima e não a têm quando estão abaixo, realizam uma espécie de ideal humano feito de equilíbrio entre arrogância e humildade. Por muito que o maldigam, as sociedades regressam sempre a esse ideal.