Natal
Mais uma vez, cĂĄ vimos
Festejar o teu novo nascimento,
NĂłs, que, parece, nos desiludimos
Do teu advento!Cada vez o teu Reino Ă© menos deste mundo!
Mas vimos, com as mĂŁos cheias dos nossos pomos,
Festejar-te, â do fundo
Da miséria que somos.Os que à chegada
Te vimos esperar com palmas, frutos, hinos,
Somos â nĂŁo uma vez, mas cada â
Teus assassinos.Ă tua mesa nos sentamos:
Teu sangue e corpo Ă© que nos mata a sede e a fome;
Mas por trinta moedas te entregamos;
E por temor, negamos o teu nome.Sob escĂĄrnios e ultrajes,
Ao vulgo te exibimos, que te aclame;
Te rojamos nas lajes;
Te cravejamos numa cruz infane.Depois, a mesma cruz, a erguemos,
Como um farol de salvação,
Sobre as cidades em que ferve extremos
A nossa corrupção.Os que em leilão a arrematamos
Como sagrada peça Ășnica,
Somos os que jogamos,
Para comĂ©rcio, a tua tĂșnica.Tais somos, os que, por costume,
Vimos, mais uma vez,
Aquecer-nos ao lume
Que do teu frio e solidĂŁo nos dĂȘs.Como Ă© que ainda tens a infinita paciĂȘncia
De voltar, â e te esqueces
De que a nossa indigĂȘncia
Recusa Tudo que lhe ofereces?Mas, se um ano tu deixas de nascer,
Se de vez se nos cala a tua voz,
Se enfim por nĂłs desistes de morrer,
Jesus recém-nascido!, o que serå de nós?!