O Teu CĂ©u
É em vida que tens o teu cĂ©u. Mas nĂŁo Ă© um cĂ©u prometido. Um cĂ©u prometido Ă© um cĂ©u precavido, um cĂ©u prevenido – um cĂ©u invertido. O que já sabes que vai ser cĂ©u Ă© um martĂrio. Se sabes que vai ser cĂ©u: entĂŁo Ă© porque nĂŁo Ă© cĂ©u. És tu que, todos os dias, tens de agarrar nas tuas perninhas e no monte de antĂteses de que Ă©s feito. És tu que tens de rezar pelo teu cĂ©u. Mas rezar nĂŁo Ă© de joelhos. Rezar nem sequer Ă© cruzar os dedos e olhar para o cĂ©u Ă espera de que de lá caia alguma coisa. O mais inusitado que podes esperar que caia do cĂ©u sĂŁo perdigotos de quem, como tu, pensa que rezar Ă© dizer meia dĂşzia de palavras com os joelhos dobrados e as mĂŁos unidas em forma de impotĂŞncia. Mas rezar nĂŁo Ă© nada disso. Vou-te explicar o que Ă© rezar. Oremos, irmĂŁo.
Rezar não é ajoelhar nem é falar nem é esperar. Rezar é lutar. Não é por acaso que depois de morrer alguém de quem se gosta se faz o luto. Luto. Ouve bem, lê bem: sente bem. Luto. Luto. Luto de lutar. Porque depois de te morrer quem amas ou simplesmente gostas tens de lutar. Lutar como um cão, como um boi ou como uma vaca. Lutar como todos os animais do mundo lutam para sobreviverem por sobre a morte: por antes da morte. Lutar. Rezar é lutar, mexer, crer: querer. Lutar é acreditar. Mas fazer alguma coisa com esse acreditar. Acreditar de joelhos é parar. E parar é morrer. E morrer é, não tenhas ilusões bacocas, estar morto. Se queres ir para o céu depois de estares morto é porque já estás morto.