Nada é Verdadeiramente Satisfatório
Nada é verdadeiramente satisfatório. Mesmo a arte a que um artista é vocacionado, e sobre a qual e para a qual vive, está sempre aquém do seu desejo. Nunca atinge aquele nível, aquele andar que desejaria. Está sempre a tentar, a aproximar-se do limite das possibilidades. No fundo, do absoluto. Um absoluto que se não atinge, [que se] ignora mesmo. A única coisa que sabemos ao certo é: ninguém nasce senão para morrer. Morrer mais cedo ou morrer mais tarde. Tem esse privilégio: acabar com a vida antes do fim natural dela. Se estiver desesperado, acontece. Justamente quando perde a esperança. Quando perde a esperança, perdeu tudo, e então liquida-se.
[Pensou alguma vez? Houve algum momento na sua vida tão desesperançado? Teve tantos reveses…]
Não. Suponho que ninguém deixa de pensar na morte. E quando se chega à minha idade, está-se mais consciente de que se aproxima o fim. Portanto, ele tem que se preparar para esse final. Há muita gente que conheci que se suicidou por isto ou por aquilo. E há o problema da eutanásia, quando o sofrimento é muito grande, a experiência é nula e as pessoas não podem sequer matar-se, têm que pedir que alguém as mate. O sofrimento é uma coisa terrível. Eu não tenho medo da morte, mas temo o sofrimento. A gente medita sobre a morte, prepara-se para ela, quer deixar tudo em condições, para poder morrer descansado. Hoje tenho essa preocupação.
[O que é isso de deixar as coisas preparadas? É morrer com que sensação?]
Não é morrer com sensação nenhuma, a sensação da morte só se tem quando se morre! Quero dizer, deixar a vida regulada, não deixar problemas para os filhos, os netos, os amigos, a sociedade. Deixar um bom nome.
[Deixar um bom nome é muito importante?]
Naturalmente, limpar tudo. Deixar uma vida inteira. É uma reflexão que se faz sobre a vida toda que passou. É a isso que chamo morrer descansado.