GĂ©nio, Talento e Celebridade
Pode-se supor que a presença no mesmo homem de mais de um elemento intelectual facilitaria a sua imediata celebridade. AtĂ© certo limite Ă© assim, mas o Ă© atĂ© um limite menor do que se poderia conjecturar na ociosidade da hipĂłtese. Um homem dotado ao mesmo tempo de grande gĂ©nio e de grande inteligĂȘncia (como Shakespeare), ou de grande gĂ©nio e grande talento (como Milton), nĂŁo acumula na sua Ă©poca ou na seguinte os resultados do gĂ©nio e os resultados de outra qualidade. Ă que estes diferentes elementos intelectuais estĂŁo misturados por coexistirem no homem, e derrama-se na substĂąncia da inteligĂȘncia ou do talento o sagrado veneno do gĂ©nio; a bebida Ă© amarga, embora retenha algo do seu gosto comum. Os antigos misturavam mel com vinho e achavam isso gostoso; mas o nĂ©ctar nĂŁo pode fazer qualquer vinho gostoso ao paladar da gente comum.
Um homem que pudesse ter em si prĂłprio, em certo grau, gĂ©nio, talento e inteligĂȘncia, estaria preparado para produzir impacto no seu tempo pela sua inteligĂȘncia, na sua Ă©poca pelo seu talento e na generalidade dos futuros tempos e Ă©pocas pelo seu gĂ©nio. Mas como o seu gĂ©nio afectaria o seu talento e o seu talento e o seu gĂ©nio a sua inteligĂȘncia – pois as coisas que coexistem na mente coexistem por interfusĂŁo e nĂŁo por mera continuidade – menor seria o seu talento puro, e menos atrairia geraçÔes mais amplas; e menos seria a sua inteligĂȘncia pura e menos acariciaria a simplicidade de todos os presentes. Qualquer exemplo tornaria isto claro para quem compreende por meio de exemplos. Um homem de espĂrito que, entre os seus pares, faz uma piada, daquelas que um espĂrito talentoso poderia inteligentemente conceber, provoca uma gargalhada geral de apreço. Esta coisa impura Ă© pura inteligĂȘncia. O homem que, no mesmo grupo, faz uma piada com uma alusĂŁo clĂĄssica ou com uma distensĂŁo de espirituosidade intelectual, pode mostrar ao analista que acrescentou aluguma coisa Ă inteligĂȘncia, mas, no efeito moderado que produziu nos ouvintes, ter-lhe-ĂĄ subtraĂdo algo. Se, alĂ©m disso, o mesmo homem for um gĂ©nio e acontecer que faça tal piada em que o seu gĂ©nio claramente se mostre e inunde a sua inteligĂȘncia com a sua cor, terĂĄ de enfrentar o daltonismo de cada ouvinte diante do qual torna ridĂcula a sua sabedoria. SerĂĄ algo de parecido como fazer uma piada em lĂngua estrangeira. O presente nĂŁo tem segunda-visĂŁo e a ponta permanece na bainha.