A Precisão da Escrita não Faz o Bom Escritor
Como escritor, poderá alguém fazer a experiência de que quanto mais precisa, esmerada e adequadamente se expressar, tanto mais difícil de entender será o resultado literário, ao passo que quando o faz de forma laxa e irresponsável se vê recompensado com uma segura inteligibilidade. De nada serve evitar asceticamente todos os elementos da linguagem especializada e todas as alusões a esferas culturais não estabelecidas. O rigor e a pureza da textura verbal, inclusive na extrema simplicidade, criam antes um vazio. O desmazelo, o nadar com a corrente familiar do discurso, é um sinal de vinculação e de contacto: sabe-se o que se quer porque se sabe o que o outro quer. Enfrentar a coisa na expressão, em vez da comunicação, é suspeitoso: o específico, o que não está acolhido no esquematismo, parece uma desconsideração, um sintoma de excentricidade, quase de confusão. A lógica do nosso tempo, que tanto se ufana da sua claridade, acolheu ingenuamente tal perversão na categoria da linguagem quotidiana.
A expressão vaga permite a quem a ouve ter uma ideia aproximada do que é que lhe agrada e do que, de qualquer modo, opina. A rigorosa exige a univocidade da concepção, o esforço do conceito, qualidades de que os homens conscientemente se desacostumam, e encoraja-os à suspensão dos juízos correntes perante todo o conteúdo e, assim, a uma automarginalização a que energicamente resistem. É-lhes inteligível só o que não precisam de compreender; só o verdadeiramente alienado, a palavra cunhada pelo comércio, os afecta como familiar que é. Poucas coisas há que tanto contribuam para a desmoralização dos intelectuais. Quem pretender evitá-la deverá, em todo o conselho de atender só à comunicação, vislumbrar uma traição ao comunicado.