Lançamos o barco, sonhamos a viagem: quem viaja é sempre o mar.
Frases de Mia Couto
354 resultadosJá esqueceu falar, outra vez? É da fome isso. Sabe o que você faz? Você engole com força. É, engole saliva, faz conta está entrar comida na garganta. A fome fica confusa, assim.
A dor é uma janela por onde a morte nos espreita.
As ruínas de uma nação começam no lar do pequeno cidadão.
O homem é como a casa: deve ser visto por dentro.
A escrita não é uma técnica e não se constrói um poema ou um conto como se faz uma operação aritmética. A escrita exige sempre a poesia. E a poesia é um outro modo de pensar que está para além da lógica que a escola e o mundo moderno nos ensinam.
Eu também, de vez em quando, afundo a minha canoa e me apresento como o da outra margem. Quando estou em ambientes demasiado literários, puxo do meu chapéu de biólogo. Quando estou entre biólogos que se levam muito a sério, rapidamente puxo do chapéu de escritor.
Ser menino é estar cheio de céu por cima.
Encheram a terra de fronteiras, carregaram o céu de bandeiras, mas só há duas nações – a dos vivos e dos mortos.
Quando me pergunto porque escrevo eu respondo: para me familiarizar com os deuses que eu não tenho. Os meus antepassados estão enterrados em outro lugar distante, algures no Norte de Portugal. Eu não partilho de sua intimidade e, mais grave ainda, eles me desconhecem inteiramente. As duas partes de mim exigiam um médium, um tradutor. A poesia veio em meu socorro para criar essa ponte entre dois mundos. E a cidade, a minha casa, a minha família: esses foram os aconchegos em que a poesia em mim nasceu.
Quem vive num labirinto, tem fome de caminhos.
Que o amor é como o mar: sendo infinito espera ainda em outra água se completar.
A solução para o desfavorecido não é pedir favores. É lutar mais do que os outros. E lutar sobretudo por um mundo onde não seja preciso mais favores.
Existe no nada essa ilusão de plenitude que faz parar a vida e anoitecer as vozes.
O que mais dói na miséria é a ignorância que ela tem de si mesma. Confrontados com a ausência de tudo, os homens abstêm-se do sonho, desarmando-se do desejo de serem outros. Existe no nada essa ilusão de plenitude que faz parar a vida e anoitecer as vozes.
Talvez seja a espessura desse céu que faz os cacimbeiros sonharem tanto. Sonhar é um modo de mentir à vida, uma vingança contra um destino que é sempre tardio e pouco.
Não vê os rios que nunca enchem o mar? A vida de cada um também é assim: está sempre toda por viver.
Quando me viam, parado e recatado, no meu invisível recanto, eu não estava pasmado. Estava desempenhado, de alma e corpo ocupados: tecia os delicados fios com que se fabrica a quietude. Eu era um afinador de silêncios.
Queixamo-nos de que as pessoas não lêem livros. Mas o deficit de leitura é muito mais geral. Não sabemos ler o mundo, não lemos os outros.
A tristeza engorda mais que o caril de mandioca.