ImplacĂĄveis devem ser os furacĂ”es, que nos forçam a buscar paz de espĂrito na boca de uma arma.
Passagens sobre FuracÔes
11 resultadosO DilĂșvio
HĂĄ muitos dias jĂĄ, hĂĄ jĂĄ bem longas noites
que o estalar dos vulcÔes e o atroar das torrentes
ribombam com furor, quais råbidos açoites,
ao crebro rutilar dos coriscos ardentes.Pradarias, vergéis, hortos, vinhedos, matos,
tudo desapar’ceu ao rude desabar
das constantes, hostis, raivosas cataratas,
que fizeram da Terra um grande e torvo mar.Ă flor do torvo mar, verde como as gangrenas,
onde homens e leÔes bóiam agonizantes,
imprecando com fĂșria e angĂșstia, erguem-se apenas,
quais monstros colossais, as montanhas gigantes.Ă aĂ que, ululando, os homens como as feras
refugiar-se vĂŁo em trĂĄgicos cardumes,
O mar sobe, o mar cresce. e os homens e as panteras,
crianças e reptis caminham para os cumes.Os fortes, sem haver piedade que os sujeite,
arremessam ao chĂŁo pobres velhos cansados.
e as mães largam. cruéis, os filhinhos de leite,
que os que seguem depois pisam, alucinados.Um sinistro pavor; crescente e sufocante,
desnorteia, asfixia a turba pertinaz:
ouvem-se urros de dor, e os que vĂŁo adiante
lançam pedras brutais aos que ficam pra trås.
Podes, Ăł Tempo, Entrar: Eu Te Convido
Podes, Ăł Tempo, entrar: eu te convido
A ser hóspede meu, que eu nunca faço
Distinção quando és bom ou mau, pois passo
Os meus dias, de ti nunca esquecido.Ou me batas Ă porta, enfurecido,
Envolto em furacÔes, com torvo braço,
Ou entres brandamente, passo a passo,
Cum sorriso na boca apetecido:Ou me sejas contrĂĄrio, ou venturoso,
Eu me acomodo a ti e a pouco custo,
Se visitar-me vens, tempestuoso.Ăs tuas intençÔes sempre me ajusto.
Tu, a quem pensa, Ă©s sempre proveitoso:
Feliz quem te ama sem pavor nem susto.
O CĂ©u, de Opacas Sombras Abafado
O céu, de opacas sombras abafado,
Tornando mais medonha a noite fea,
Mugindo sobre as rochas, que saltea,
O mar, em crespos montes levantado;Desfeito em furacÔes o vento irado;
Pelos ares zunindo a solta area;
O pĂĄssaro nocturno, que vozea
No agoireiro cipreste alĂ©m pousado;Formam quadro terrĂvel, mas aceito,
Mas grato aos olhos meus, grato Ă fereza
Do ciĂșme e saudade, a que ando afeito.Quer no horror igualar-me a Natureza;
Porém cansa-se em vão, que no meu peito
HĂĄ mais escuridade, hĂĄ mais tristeza.
Flor da Mocidade
Eu conheço a mais bela flor;
Ăs tu, rosa da mocidade,
Nascida, aberta para o amor.
Eu conheço a mais bela flor.
Tem do céu a serena cor,
E o perfume da virgindade.
Eu conheço a mais bela flor,
Ăs tu, rosa da mocidade.Vive Ă s vezes na solidĂŁo,
Coma * filha da brisa agreste.
Teme acaso indiscreta mĂŁo;
Vive Ă s vezes na solidĂŁo.
Poupa a raiva do furacĂŁo
Suas folhas de azul celeste.
Vive Ă s vezes na solidĂŁo,
Como filha da brisa agreste.Colhe-se antes que venha o mal,
Colhe-se antes que chegue o inverno;
Que a flor morta jĂĄ nada val.
Colhe-se antes que venha o mal.
Quando a terra Ă© mais jovial
Todo o bem nos parece eterno.
Colhe-se antes que venha o mal,
Colhe-se antes que chegue o inverno.
Comparar-te a um Dia de VerĂŁo?
Comparar-te a um dia de verĂŁo?
HĂĄ mais ternura em ti, ainda assim:
um maio em flor Ă s mĂŁos do furacĂŁo,
o foral do verão que chega ao fim.Por vezes brilha ardendo o olhar do céu;
outras, desfaz-se a compleição doirada,
perde beleza a beleza; e o que perdeu
vai no acaso, na natureza, em nada.Mas juro-te que o teu humano verĂŁo
serĂĄ eterno; sempre crescerĂĄs
indiferente ao tempo na canção;e, na canção sem morte, viverås:
Porque o mundo, que vĂȘ e que respira,
te verå respirar na minha lira.Tradução de Carlos de Oliveira
Minha Ărvore
Olha: Ă um triĂąngulo estĂ©ril de Ănvia estrada!
Como que a erva tem dor… Roem-na amarguras
Talvez humanas, e entre rochas duras
Mostra ao Cosmos a face degradada!Entre os pedrouços maus dessa morada
Ă que, Ă s apalpadelas e Ă s escuras,
Hão de encontrar as geraçÔes futuras
SĂł, minha ĂĄrvore humana desfolhada!Mulher nenhuma afagarĂĄ meu tronco!
Eu nĂŁo me abalarei, nem mesmo ao ronco
Do furacĂŁo que, rĂĄbido, remoinha…Folhas e frutos, sobre a terra ardente
HĂŁo de encher outras ĂĄrvores! Somente
Minha desgraça hå de ficar sozinha!
Raios não Peço ao Criador do Mundo
LX
Raios não peço ao Criador do Mundo,
Tormentas nĂŁo suplico ao Rei dos Mares,
VulcÔes à terra, furacÔes aos ares,
Negros monstros ao bĂĄratro profundo:NĂŁo rogo ao deus de amor que furibundo
Te arremesse do pé de seus altares;
Ou que a peste mortal voe a teus lares,
E murche o teu semblante rubicundo.Não imploro em teu dano, ainda que os laços
Urdidos pela fé, com vil mudança
Fizeste, ingrata Nise, em mil pedaços:Não quero outro despique, outra vingança,
Mais que ver-te em poder de indignos braços,
E dizer quem te perde, e quem te alcança.
NĂŁo se Pode Viver Assim!
Temos na natureza muitas coisas contra as quais lutar, mas hĂĄ um inimigo pior que todos os furacĂ”es e terramotos, o prĂłprio ser humano. A natureza com todos os seus vulcĂ”es, terramotos, furacĂ”es e inundaçÔes nĂŁo causou tantos mortos como a humanidade causou a si prĂłpria. Lutas de toda a ordem: guerras religiosas, guerras de interesses materiais, guerras absolutamente absurdas e estĂșpidas, como as dinĂĄsticas.
Soneto de Natal
«E o terceiro Anjo derramou a sua taça nos rios
e nas fontes, ficando a ågua da cor do sangue.»
Apocalipse, 16:4NĂŁo anuncio a paz, mas sim a guerra.
Um. Anjo vingador comigo vem.
Hå dois milénios que percorro a Terra
repetindo a mensagem de Belém.O coração humano endureceu
à força de sentir a Fé perdida.
E o espĂrito do Bem? Ensurdeceu
no furacão das ambiçÔes da vida.Por isso trago um Anjo vingador
para ferir de morte a semelhança
do lobo disfarçado de cordeiro:â Que se cuide quem nĂŁo sentir Amor
pois matarå em si essa criança
inocente que um dia foi primeiro.
RaĂzes
Ehrenburg, que lia e traduzia os meus versos, repreendia-me: demasiada raiz, demasiadas raĂzes, nos teus versos. PorquĂȘ tantas? Ă verdade. As terras fronteiriças do Chile infiltraram as suas raĂzes na minha poesia e nunca puderam sair dela. A minha vida Ă© uma longa peregrinação que anda sempre Ă s voltas, que retorna sempre ao bosque austral, Ă selva perdida.
Ali, Ă© certo, as grandes ĂĄrvores eram por vezes tombadas por setecentos anos de vida poderosa, ou arrancadas pelo furacĂŁo, ou queimadas pela neve, ou destruĂdas pelo incĂȘndio. Senti muitas vezes cair na profundidade da floresta as ĂĄrvores titĂąnicas: o roble que tomba com estrondo de catĂĄstrofe surda, como se batesse com mĂŁo colossal Ă s portas da terra pedindo sepultura. As raĂzes, porĂ©m, ficavam a descoberto, entregues ao tempo inimigo, Ă humidade, aos lĂquenes, ao aniquilamento progressivo.
Nada mais belo que aquelas grandes mĂŁos abertas, feridas e queimadas, que numa vereda do bosque nos indicam o segredo da ĂĄrvore enterrada, o enigma que a folhagem mantinha, os mĂșsculos profundos do domĂnio vegetal. TrĂĄgicas e hirsutas, mostram-nos uma nova beleza: sĂŁo esculturas da profundidade â obras-primas secretas da natureza.Certa vez, caminhando com Rafael Alberti entre cascatas, matagais e bosques,