As mulheres são tão fatais ao género humano, que mesmo as honestas são causa da desgraça dos maridos.
Passagens sobre Género
142 resultadosA Imensa Imoralidade da Existência
Viver era como correr em círculo num grande labirinto, esse género de labirinto para crianças que se vê em certos parques de jogos modernos; em cima de uma pedra no meio do labirinto há uma pedra brilhante; os míudos chegam com as faces coradas, cheios de uma fé inabalável na honestidade do labirinto e começam a correr com a certeza de alcançarem dentro de pouco tempo o seu alvo. Corremos, corremos, e a vida passa, mas continuaremos a correr na convicção de que o mundo acabará por se mostrar generoso para quem correr sem desãnimo, e quando por fim descobrimos que o labirinto só aparentemente tende para o ponto central, é tarde demais – de facto, o construtor do labirinto esmerou-se a desenhar várias pistas diferentes, das quais só uma conduz à pérola, de modo que é o acaso cego e não a justiça lúcida o que determina a sorte dos que correm.
Descobrimos que gastámos todas as nossas forças a realizar um trabalho perfeitamente inútil, mas é muito tarde já para recuarmos. Por isso não é de espantar que os mais lúcidos saiam da pista e suprimam algumas voltas inúteis para atingirem o centro cortando caminho. Se dissermos que se trata de uma acção imoral e maldosa,
O suicídio é um roubo ao género humano.
O Gosto pela Simplicidade
Cansado às vezes do artificialismo que domina hoje em todos os géneros, enfadado com os chistes, os lances espirituosos, com as troças e com todo esse espírito que se quer colocar nas menores coisas, digo comigo mesmo: se eu pudesse encontrar um homem que não fosse espirituoso, com quem não fosse preciso sê-lo, um homem ingénuo e modesto, que falasse somente para se fazer entender e para exprimir os sentimentos do seu coração, um homem que só tivesse a razão e um pouco de naturalidade: com que ardor eu correria para descansar na sua conversa ao invés do jargão e dos epigramas do resto dos homens! Como é que acontece perder-se o gosto pela simplicidade a ponto de não mais se perceber que ele foi perdido? Não há virtudes nem prazeres que dela não retirem encantos e as suas graças mais tocantes.
O género humano sempre meteu a ridículo os próprios dramas. Como é que os poderia ter suportado de outro modo? É por isso que tudo o que o género humano levou a sério releva do lado cómico das coisas.
Não há género algum de preguiça pela qual sejamos tão facilmente seduzidos como aquela que é dignificada pela aparência de ser um negócio.
A Gloriola do Jornal
O jornal estende sobre o mundo as suas duas folhas, salpicadas de preto, como aquelas duas asas com que os iconografistas do século XV representavam a Luxúria ou a Gula: e o Mundo todo se arremessa para o jornal, se quer agachar sob as duas asas que o levem à gloriola, lhe espalhem o nome pelo ar sonoro. E é por essa gloriola que os homens se perdem, e as mulheres se aviltam, e os Políticos desmancham a ordem do Estado, e os Artistas rebolam na extravagância estética, e os Sábios alardeiam teorias mirabolantes, e de todos os cantos, em todos os géneros, surge a horda ululante dos charlatães… (Como me vim tornando altiloquente e roncante!…) Mas e a verdade, meu Bento! Vê quantos preferem ser injuriados a serem ignorados! (Homenzinhos de letras, poetisas, dentistas, etc.). O próprio mal apetece sofregamente as sete linhas que o maldizem. Para aparecerem no jornal, há assassinos que assassinam. Até o velho instinto da conservação cede ao novo instinto da notoriedade – e existe tal maganão, que ante um funeral convertido em apoteose pela abundância das coroas, dos coches e dos prantos oratórios, lambe os beiços, pensativo, e deseja ser o morto.
A Cultura Deve Ser Uma Descoberta Individual de Cada um de Nós
Não se deve intervir, não nos devemos meter nos problemas que cada um tem com a leitura. Não devemos sofrer por causa das crianças que não lêem, perder a paciência. Trata-se da descoberta do continente da leitura. Ninguém deve encorajar nem incitar outra pessoa a ir ver como ele é. Já existe excessiva informação no mundo acerca da cultura. Devemos partir sós para esse continente. Descobri-lo sozinhos. Operarmos sozinhos esse nascimento.
Por exemplo, em relação a Baudelaire, devemos ser os primeiros a descobrir o seu esplendor. E somos os primeiros. E, se não formos os primeiros, nunca seremos leitores de Baudelaire. Todas as obras-primas do mundo deveriam ser encontradas pelas crianças nos despejos públicos, e lidas às escondidas dos pais e dos mestres.
Por vezes, o facto de se ver alguém a ler um livro no metro, com grande atenção, pode provocar a compra desse livro. Mas não quanto aos romances populares. Aí, ninguém se engana quanto à natureza do livro. Os dois géneros nunca estão juntos nas mesmas mãos. Os romances populares são impressos em milhões de exemplares. Com a mesma grelha aplicada, em princípio, há uns cinquenta anos, os romances populares desempenham a sua função de identificação sentimental ou erótica.
O meu sonho de felicidade seria não haver necessidade de poesia como género literário por ela se achar já realizada na vida.
É preciso ousar em todo o género de coisas; mas a dificuldade está em ousar com acerto.
O saber é um género da ignorância humana que distingue o homem estudioso.
Confesso que o género humano não é tão mau como certas pessoas o apregoam na esperança de o governar.
As mulheres são as primeiras educadoras do género humano.
Tudo o que se realiza em função de outra coisa é feito apenas de maneira parcial, e a verdadeira excelência só pode ser alcançada, em obras de todos os géneros, quando elas foram produzidas em função de si mesmas e não como meios para fins ulteriores.
O Saber Oral
O novo saber que o género humano vai adquirindo não compensa o saber que se propaga apenas pela transmissão oral directa, o qual, uma vez perdido, nunca mais se pode readquirir e retransmitir: nenhum livro pode ensinar aquilo que apenas se pode aprender na infância, se se entrega o ouvido e o olho atentos ao canto e ao voo dos pássaros e se se encontra então alguém que pontualmente lhes saiba dar um nome.
As Mulheres São Mais Fortes
Para começar, gosto das mulheres. Acho que elas são mais fortes, mais sensíveis e que têm mais bom senso que os homens. Nem todas as mulheres do mundo são assim, mas digamos que é mais fácil encontrar qualidades humanas nelas do que no género masculino. Todos os poderes políticos, económicos, militares são assunto de homens. Durante séculos, a mulher teve de pedir autorização ao seu marido ou ao seu pai para fazer fosse o que fosse.
Se eu conhecesse alguma coisa que fosse útil à minha pátria, mas prejudicial à Europa, ou que fosse útil à Europa, mas prejudicial ao género humano, considerá-la-ia um crime.
Sê modesto! É o género de orgulho que menos desagrada.
A Cultura Portuguesa e o Provincianismo
A cultura portuguesa tem um amor fatal pelo provincianismo. O provincianismo é a forma mais «engagée» de existir socialmente e literariamente. Daí a impossibilidade, ou melhor, o medo de se realizar sequer um realismo a sério, porquanto este exige uma descida ao inferno e não vejo por aí quem se atreva além do purgatório. Fica-se assim na meia tinta do naturalismo, retratando quadros convencionais de uma sociedade provinciana onde, além da já muito conhecida injustiça social (reparável pela economia e não pela literatura), nada se capta que possa sugerir a simples violência de se estar no mundo. Provincianismo chama-se ainda àquela nossa atitude que toma muito a sério ou, ainda, solenemente, tudo o que faz, tornando inviável uma literatura que desmonte eficazmente a engrenagem humana e social pela incomplacente investida de um humor cruel. Houve recentes tentativas queirozianas para denunciar as fraquezas do meio. Conseguiu-se fazer realismo desta vez? Também não, porque se fez realismo de empréstimo, de segunda mão, colhido no «diz-se diz-se» das esquinas. Escreveu-se razoavelmente má-língua, mas não se agitaram as pessoas e as instituições de forma a tornar visível o lodo depositado no fundo. Isto quanto aos que fazem profissão de fé de realismo social ou burguês.
Os Verdadeiros Males
Vejo uma objecção a qualquer esforço para melhorar a condição humana: é que os homens são talvez indignos dele. Mas repilo-a sem dificuldade: enquanto o sonho de Calígula se mantiver irrealizável e todo o género humano se não reduzir a uma única cabeça oferecida ao cutelo, teremos que o tolerar, conter e utilizar para os nossos fins; sem dúvida que o nosso interesse será servi-lo. O meu processo baseava-se numa série de observações feitas desde há muito tempo em mim próprio: toda a explicação lúcida me convenceu sempre, toda a delicadeza me conquistou, toda a felicidade me tornou moderado. E nunca prestei grande atenção às pessoas bem intencionadas que dizem que a felicidade excita, que a liberdade enfraquece e que a humanidade corrompe aqueles sobre quem é exercida. Pode ser: mas, no estado habitual do mundo, é como recusar a alimentação necessária a um homem emagrecido com receio de que alguns anos depois ele possa sofrer de superabundância. Quando se tiver diminuído o mais possível as servidões inúteis, evitado as desgraças desnecessárias, continuará a haver sempre, para manter vivas as virtudes heróicas do homem, a longa série de verdadeiros males, a morte, a velhice, as doenças incuráveis, o amor não correspondido,