Passagens sobre Instantes

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Frases sobre instantes, poemas sobre instantes e outras passagens sobre instantes para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Prelúdio Da Gota D’ Água

Cheio da tua ausência me angustio
a cada hora que passa… a cada instante…
– pelo meu pensamento, como um fio,
és uma gota d’água, tremulante…

Uma gota suspensa e cintilante,
límpida e imóvel como um desafio…
Tua ausência, – é a presença triunfante
daquela gota que ficou no fio. . .

As outras todas, céleres, pingaram,
e caíram na terra onde secaram,
só tu ficaste, última gota, assim

como uma estrela sem ter firmamento,
suspensa ao fio do meu pensamento
e a brilhar, sem cair… dentro de mim…

Ninguém Morre Antes da Hora

Ninguém morre antes da hora. O que deixais de tempo não era mais vosso do que o tempo que se passou antes do vosso nascimento; e tampouco vos importa, Com efeito, considerai como a eternidade do tempo passado nada é para nós (Lucrécio). Termine a vossa vida quando terminar, ela aí está inteira. A utilidade do viver não está no espaço de tempo, está no uso. Uma pessoa viveu longo tempo e no entanto pouco viveu; atentai para isso enquanto estais aqui. Terdes vivido o bastante depende da vossa vontade, não do número de anos. Pensáveis nunca chegar aonde estáveis indo incessantemente? E no entanto não há caminho que não tenha o seu fim. E, se a companhia vos pode consolar, não vai o mundo no mesmo passo em que ides? Todas as coisas seguir-vos-ão na morte (Lucrécio). Tudo não dança a vossa dança? Há coisa que não envelheça convosco? Mil homens, mil animais e mil outras criaturas morrem nesse mesmo instante em que morreis: Pois nunca a noite sucedeu ao dia, nem a aurora à noite, sem ouvir, mesclados aos vagidos da criança, os gritos de dor que acompanham a morte e os negros funerais (Lucrécio).

Meu Calvário

Ando sempre a seguir-te… a buscar-te distante
como a visão que anseio e os olhos me seduz,
– e espero te encontrar, sentir de perto a luz
do teu olhar feliz em êxtase constante…

Mas tu foges de mim, foges a cada instante,
e eu que a este andar eterno já me predispus,
embora às vezes pare, – sigo logo adiante
sem mesmo perceber que esse amor é uma cruz!

Não sei se hás de ser minha! O teu afastamento
cresce à frente de mim, – no entanto, o imaginário
desejo de alcançar-te ergue o meu desalento…

E, após tanto sofrer, sentir-me-ei consolado,
– se ao cair no caminho… e ao fim do meu Calvário
for morrer sobre a cruz dos braços teus pregado!

Sabedoria de Vida é Usufruir o Presente

Não permitir a manifestação de grande júbilo ou grande lamento em relação a qualquer acontecimento, uma vez que a mutabilidade de todas as coisas pode transformá-lo completamente de um instante para o outro; em vez disso, usufruir sempre o presente da maneira mais serena possível: isso é sabedoria de vida. Em geral, porém, fazemos o contrário: planos e preocupações com o futuro ou também a saudade do passado ocupam-nos de modo tão contínuo e duradouro, que o presente quase sempre perde a sua importância e é negligenciado; no entanto, somento o presente é seguro, enquanto o futuro e mesmo o passado quase sempre são diferentes daquilo que pensamos. Sendo assim, iludimo-nos uma vida inteira.
Ora, para o eudemonismo, tudo isso é bastante positivo, mas uma filosofia mais séria faz com que justamente a busca do passado seja sempre inútil, e a preocupação com o futuro o seja com frequência, de modo que somente o presente constitui o cenário da nossa felicidade, mesmo se a qualquer momento se vier a transformar-se em passado e, então, tornar-se tão indiferente como se nunca tivesse existido.

E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos,julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram.

A Inconstância das Nossas Acções

Os que se exercitam a prescrutar as acções humanas, em coisa alguma se acham tão embaraçados como em conjugar umas com as outras e mostrá-las à mesma luz, pois comummente elas se contradizem entre si de modo tão estranho que parece impossível terem todas saído da mesma loja.
(…) Alguma razão parece haver no julgar um homem pelas mais comuns acções da sua vida, mas, atendendo à natural instabilidade dos nossos costumes e opiniões, amiúde se me tem afigurado que mesmo os bons autores erram ao obstinarem-se a conceberem-nos como um todo coerente e constante. Escolhem uma imagem global, segundo a qual classificam e interpretam todas as acções da personagem, e quando não as conseguem conformar a ela, atribuem-nas à dissimulação.
(…) O nosso procedimento habitual é seguir as inclinações do nosso desejo, para a esquerda, para a direita, para cima e para baixo, para onde quer que nos empurrem os ventos das circunstâncias. Não pensamos no que queremos senão no instante em que o queremos, e mudamos como o animal que adquire a cor do local onde o pousam. O que agora mesmo acabámos de projectar, em breve o viremos a alterar, e, pouco mais tarde, voltaremos sobre os nossos passos: tudo não é senão oscilação e inconstância.

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Esta Palavra Saudade

Junto de um catre vil, grosseiro e feio,
por uma noite de luar saudoso,
Camões, pendida a fronte sobre o seio,
cisma, embebido num pesar lutuoso…

Eis que na rua um cântico amoroso
subitâneo se ouviu da noite em meio:
Já se abrem as adufas com receio…
Noites de amores! Que trovar mimoso!

Camões acorda e à gelosia assoma;
e aquele canto, como um antigo aroma,
ressuscita-lhe os risos do passado.

Viu-se moço e feliz, e ah! nesse instante,
no azul viu perpassar, claro e distante,
de Natércia gentil o vulto amado…

Para Ser Lido Mais Tarde

Um dia
quando já não vieres dizer-me Vem
jantar

quando já não tiveres dificuldade
em chegar ao puxador
da porta quando

já não vieres dizer-me Pai
vem ver os meus deveres

quando esta luz que trazes nos cabelos
já não escorrer nos papéis em que trabalho

para ti será o começo de tudo

Uma outra vida haverá talvez para os teus sonhos
um outro mundo acolherá talvez enfim a tua oferenda

Hás-de ter alguma impaciência enquanto falo
Ouvirás com encanto alguém que não conheço
nem talvez ainda exista neste instante

Mas para mim será já tão frio e já tão tarde

E nem mesmo uma lembrança amarga
ou doce ficará
desta hora redonda
em que ninguém repara

O Mal e o Bem em Função da Vaidade

É raro o mal, de que não venha a nascer algum bem, nem bem, que não produza algum mal: como só o presente é nosso, por isso não nos serve de alívio o bem futuro, nem nos inquieta o mal que ainda não sentimos; um infeliz não se persuade, que a sua sorte possa ter mudança; um venturoso não crê, que possa deixar de o ser; a este a vaidade tira o menor receio; àquele o abatimento priva de esperança. Se fizermos reflexão, havemos de admirar o pouco que basta para fazer o nosso bem, ou o nosso mal: de um instante a outro mudamos da alegria para a tristeza, e muitas vezes sem outro algum motivo, que o de uma vaidade mais, ou menos satisfeita.
Os homens não são todos igualmente sensíveis ao bem, e ao mal; a uns penetra mais vivamente a dor, a outros só faz uma impressão ligeira; o bem não acha em todos o mesmo grau de contentamento. Nas almas deve de haver a mesma diferença, que há nos corpos: umas mais débeis, e outras mais robustas; por isso em umas obra mais o sentimento, e acha mais resistência em outras; em umas domina a vaidade com império,

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Vive o Dia de Hoje!

Não penses para amanhã. Não lembres o que foi de ontem. A memória teve o seu tempo quando foi tempo de alguma coisa durar. Mas tudo hoje é tão efémero. Mesmo o que se pensa para amanhã é para já ter sido, que é o que desejamos que seja logo que for. É o tempo de Deus que não tem futuro nem passado. Foi o que dele nós escolhemos no sonho do nosso absoluto. Não penses para amanhã na urgência de seres agora. Mesmo logo à tarde é muito tarde. Tudo o que és em ti para seres, vê se o és neste instante. Porque antes e depois tudo é morte e insensatez. Não esperes, sê agora. Lê os jornais. O futuro é o embrulho que fizeres com eles ou o papel urgente da retrete quando não houver outro.

Que não Arrefeça em Nós

Que não arrefeça em nós
nem a luz nem o fogo
e que a fome entardecida
pela penumbra da fadiga dos olhos
nunca renuncie ao sabor dos frutos
ou à febre da sede dos lábios.
Assim se faça tudo, amor,
à medida do que se ama,
que o corpo prostrado pelo êxtase
não conhece tréguas nem assombro.
Desenha-me na paz dos azulejos
com o meu perfil de ave anoitecida
e inaugura no meu peito
a festa circular dos dedos
tatuando ilhas em redor do coração.
Esquiva, demoras-te no verso
o instante de lume de uma revelação
e quando voltas é sempre
com uma promessa de partida
e quando partes é sempre
com um anúncio de caos, de temor
na clara água do olhar. Deixo-te agora
amar, indefesa, para resgate da alma.

Onde Estará aquele Velho Álbum?

Onde estará aquele velho álbum? A cena
das fiandeiras sob as trombetas que o fechavam.
Os ancestrais esperam… Seria um mero encontro
não houvesse a consciências das coisas deixadas para trás.
Pompéia desenterrada. O valor menos notado
também assombra a idade. Afinal, para que encontrarmos
humanos petrificados embaixo de um tempo
que só poderia existir dentro daquilo mesmo?
O amor não foi maior ou menor para eles. Ontem
ninguém autorizou essa exibição nem a de uma família
embaixo da ponte. Mas essa parte de pedra
que nunca podemos entender e que teríamos
depois de séculos pode ainda enterrar
todos os nossos sonhos num instante.

A Eternidade é o Nosso Signo

Sim, a eternidade é o nosso signo. Não começámos a existir nem o fim da existência o entendemos como fim. Por isso não sentimos que não existimos antes de começarmos a existir mas apenas que tudo isso que aconteceu antes de termos existido foi apenas qualquer coisa a que por acaso não assistimos como a muito do que acontece no nosso tempo. E à morte invencivelmente a ultrapassamos para nos pormos a existir depois dela. O prazer que nos dá a história do passado, sobretudo os documentos que no-lo dão flagrantemente, vem de nos sentirmos prolongados até lá, de nos sentirmos de facto presentes nesse modo de ser contemporâneos. Mas sobretudo há em nós uma memória-limite, uma memória absoluta que não tem nada de referenciável e se prolonga ao sem fim. Do mesmo modo há o futuro que é pura projecção de nós, apelo irreprimível a um amanhã sem termo ou sem amanhã. Por isso a morte nos angustia e sobretudo nos intriga por nos provar à evidência o que profundamente não conseguimos compreender. Mas sobretudo a eternidade é o que se nos impõe no instante em que vivemos. O tempo não passa por nós e daí vem a impossibilidade de nos sentirmos envelhecer.

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Sonho Vago

Um sonho alado que nasceu um instante,
Erguido ao alto em horas de demência…
Gotas de água que tombam em cadência
Na minh’alma tristíssima, distante…

Onde está ele, o Desejado? O Infante?
O que há-de vir e amar-me em doida ardência?
O das horas de mágoa e penitência?
O Príncipe Encantado? O Eleito? O Amante?

E neste sonho eu já nem sei quem sou…
O brando marulhar dum longo beijo
Que não chegou a dar-se e que passou…

Um fogo-fátuo rútilo, talvez…
E eu ando a procurar-te e já te vejo!
E tu já me encontraste e não me vês!…

Além-Tédio

Nada me expira já, nada me vive –
Nem a tristeza nem as horas belas.
De as não ter e de nunca vir a tê-las,
Fartam-me até as coisas que não tive.

Como eu quisera, emfim de alma esquecida,
Dormir em paz num leito de hospital…
Cansei dentro de mim, cansei a vida
De tanto a divagar em luz irreal.

Outrora imaginei escalar os céus
À força de ambição e nostalgia,
E doente-de-Novo, fui-me Deus
No grande rastro fulvo que me ardia.

Parti. Mas logo regressei à dor,
Pois tudo me ruiu… Tudo era igual:
A quimera, cingida, era real,
A propria maravilha tinha côr!

Ecoando-me em silêncio, a noite escura
Baixou-me assim na queda sem remédio;
Eu próprio me traguei na profundura,
Me sequei todo, endureci de tedio.

E só me resta hoje uma alegria:
É que, de tão iguais e tão vazios,
Os instantes me esvoam dia a dia
Cada vez mais velozes, mais esguios…

Ausência Misteriosa

Uma hora só que o teu perfil se afasta,
Um instante sequer, um só minuto
Desta casa que amo — vago luto
Envolve logo esta morada casta.

Tua presença delicada basta
Para tudo tornar claro e impoluto…
Na tua ausência, da Saudade escuto
O pranto que me prende e que me arrasta…

Secretas e sutis melancolias
Recuadas na Noite dos meus dias
Vêm para mim, lentas, se aproximando.

E em toda casa, nos objetos, erra
Um sentimento que não é da Terra
E que eu mudo e sozinho vou sonhando…

Aureliano o reconheceu, perseguiu os caminhos ocultos da sua descendência e encontrou o instante da sua própria concepção entre os escorpiões e as borboletas amarelas de um banheiro crepuscular, onde um operário saciava a sua luxúria com uma mulher que se entregava a ele por rebeldia.

Ela

À beleza tão pura do semblante,
à luz sublime que há nos olhos dela,
– pergunto-me a mim mesmo a todo instante,
como tão simples pode ser tão bela…

Diferente das outras, diferente
dos moldes tão comuns de uma mulher,
– ela me faz pensar num mundo ausente
deste que a gente sem querer já quer…

Bem que a quis esquecer – e noutro amor
procurei me enganar, acreditando
ser do meu pobre coração, senhor…

Em vão tentei… Em vão… Vendo-a naquela
doce e pura expressão – fico pensando
que é impossível não pensar mais nela!…