Passagens de LuĂ­s de Montalvor

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Frases, pensamentos e outras passagens de LuĂ­s de Montalvor para ler e compartilhar. Os melhores escritores estĂŁo em Poetris.

Baby!

Baby! Sossega a tua voz. NĂŁo digas mais
Essas cançÔes do Mundo. Deixa que eu esqueço
Que fui menino ao colo de seus pais.
Deixa! Que o coração em si mesmo o adormeço…

Com olhos de criança olho os desiguais
Dias e nuvens, sĂłs, passando, e empalideço…
Canto de Prometeu todo desfeito em ais!
E a vida, a vida atĂ©, brinquedo que aborreço…

Mundo dos meus enganos como a desventura!
ExperiĂȘncia, – pobre fumo! Anela o meu cabelo
E pĂ”e-me o bibe azul e antigo da Ternura…

Que a vida, essa Babel desfeita que se embala,
ainda Ă© para mim – criança de Deus, pesadelo
Da infĂąncia das fanfarras, fogo de Bengala!

Infante

DĂĄ-me o sol a minha fronte. Doloridos
e chagados meus pĂ©s descalços vĂŁo fugindo…
– MemĂłrias dos meus doidos passos incontidos!
– Ó meu rumor do mundo em pĂ©talas abrindo!

Ó corças que correis pela tarde desferindo
o balido ligeiro que alonga os ouvidos…
– Tarde de Ă©cloga e mel silvestre reluzindo…
– Minhas vinhas de vinhos de oiro nĂŁo bebidos…

Desfolham-se ilusĂ”es e vĂŁo-se sem apegos…
Murchou a flor dos meus desejos com que pude
a vida transformar em Ăłcios e sossegos…

Que lucrei, eu, Senhor! com horas execrĂĄveis
dum sonho que perdeu meu corpo de virtude?
– o prĂłdigo que fui dos erros inefĂĄveis!

Entardecer

Sol-posto ungindo o mar: incensos de ouro!

Recolhe funda a tarde em sonho e mĂĄgoa.
Surdina fluida: anda o silĂȘncio a orar –
E hĂĄ crepĂșsculos de asas e, na ĂĄgua,
O céu é mårmore extåtico a cismar!

E nas faces marmĂłreas dos rochedos
Esboçam-se perfis,
– CintilaçÔes,
Penumbra de segredos!

Ó painĂ©is de nuvens sobre a terra,
Ogivas delirantes
Na água refractando

Encheis de sombra o mar de espumas rasas,
Iniciando
A hora pĂąnica das asas!

E, Ă  meia luz da tarde,
Na areia requeimada,
SĂŁo vultos sonolentos
As proas dos navios


Ó tristeza dos balĂ”es
Iluminando,
Na ĂĄgua prateada,
Os pegos e baixios


Dormentes constelaçÔes
Que, em fundos lacustres
E musgosos,
Pondes reverberaçÔes
Em nossos olhos ansiosos.

Ó tardes de aquático esplendor,
Descendo em meu olhar!

Num sonho de regresso,
Numa Ăąnsia de voltar,
Em mim todo me esqueço
E fico-me a cismar.

A tarde Ă© toda um sonho moribundo.
É já olor da cor que amorteceu.

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