Há Palavras que Nos Beijam
Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraĂdo
No papel abandonado)Palavras que nos transportam
Aonde a noite Ă© mais forte,
Ao silĂŞncio dos amantes
Abraçados contra a morte.
Passagens sobre Mármore
66 resultadosPecadora
Tinha no olhar cetĂneo, aveludado,
A chama cruel que arrasta os corações,
Os seios rijos eram dois brasões
Onde fulgia o simb’lo do Pecado.Bela, divina, o porte emoldurado
No mármore sublime dos contornos,
Os seios brancos, palpitantes, mornos,
Dançavam-lhe no colo perfumado.No entanto, esta mulher de grã beleza,
Moldada pela mĂŁo da Natureza,
Tornou-se a pecadora vil. Do fado,Do destino fatal, presa, morria
Uma noute entre as vascas da agonia
Tendo no corpo o verme do pecado!
Em Memória de Angélica
Quantas vidas possĂveis já descansam
Nesta bem pobre e diminuta morte,
Quantas vidas possĂveis que outra sorte
Daria ao esquecimento ou à lembrança!Quando eu morrer, morrerá um passado;
Com esta flor, morreu sĂł um futuro
Nas águas que o ignoram, o mais puro
Porvir hoje pios astros arrasado.Eu, como ela, morro em infinitos
Destinos que já não me oferece o acaso;
Procura a minha sombra os gastos mitosDe uma pátria que sempre deu a face.
Um breve mármore diz a sua memória;
Sobre nĂłs todos cresce, atroz, a histĂłria.
Liberta o Homem, e Ele Criará
Eu hei-de esculpir o futuro ao jeito do criador que extrai a obra de mármore a golpes de cinzel. E caem uma a uma as escamas que escondiam o rosto do deus. E os outros dirĂŁo: Este mármore continha este deus. Ele o que fez foi encontrá-lo. E o gesto dele nĂŁo passava de um meio. Mas eu cá digo que ele nĂŁo calculava, ele forjava a pedra. O sorriso do rosto está muito longe de ser feito de suor, de faĂscas, de golpes de cinzel e de mármore. O sorriso nĂŁo Ă© da pedra, mas sim do criador. Liberta o homem, e ele criará.
N. H.
Tu nĂŁo Ă©s de Romeu a doce amante,
A triste Julieta, que suspira,
Solto o cabelo aos ventos ondeante,
Inquietas cordas de suspensa lira.Não és Ofélia, a virgem lacrimante,
Que ao luar nos jardins vaga e delira,
E é levada nas águas flutuante,
Como em sonho de amor que cedo expira.És a estátua de mármore de rosa;
Galatéia acordando voluptuosa
Do grego artista ao fogo de mil beijos…És a lânguida JĂşlia que desmaia,
És Haidéia nos côncavos da praia;
Fosse eu o Dom JoĂŁo dos teus desejos!…
Retrato
Pintar o rosto de Márcia
Com tal primor determino,
Que seja logo seu rosto
Pela pinta conhecido.
Anda doudo de prazer
Seu cabelo por tĂŁo lindo,
Pois mal lhe vai uma onda,
Quando outra já lhe tem vindo.
Sua testa com seus arcos
Do Turco Império castigo
Vencido tem SolimĂŁo,
Meias Luas tem vencido.
Dormidos seus olhos sĂŁo,
Porém Planetas tão ricos
Nunca já foram sonhados,
Bem que sempre sĂŁo dormidos.
A dormir creio se lançam
Por ter de mortais, e vivos
TĂŁo boa fama cobrado,
Nome tĂŁo grande adquirido.
Entre seus raios se mostra
O grande nariz bornido,
Por final que entre seus raios
Prova o nariz de aquilino.
Nas taças de suas faces
Feitas do metal mais limpo,
Como certos Reverendos,
Mistura o branco co’tinto.
As perlas dos dentes alvos,
Os rubins dos beiços finos
Tem desdentado o marfim,
E a cor mais viva comido.
O passadiço da voz
Nem Ă© neve, nem Ă© vidro,
Nem mármore, nem marfim,
Nem cristal, mas passadiço.