Passagens sobre Máximos

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A Dificuldade de Estabelecer e Firmar Relações

A dificuldade de estabelecer e firmar relações. Há uma tĂ©cnica para isso, conheço-a. Nunca pude meter-me nela. Ser «simpático». É realmente fácil: prestabilidade, autodomĂ­nio. Mas. Ser sociável exige um esforço enorme — fĂ­sico. Quem se habituou, já se nĂŁo cansa. Tudo se passa Ă  superfĂ­cie do esforço. Ter «personalidade»: nĂŁo descer um milĂ­metro no trato, mesmo quando por delicadeza se finge. Assumirmos a importância de nĂłs sem o mostrar. Darmo-nos valor sem o exibir. Irresistivelmente, agacho-me. E logo: a pata dos outros em cima. Bem feito. Pois se me pus a jeito. E entĂŁo reponto. O fim. Ser prestável, colaborar nas tarefas que os outros nos inventam. ColĂłquios, conferĂŞncias, organizações de. Ah, ser-se um «inĂştil» (um «parasita»…). Razões profundas — um complexo duplo que vem da juventude: incompreensĂŁo do irmĂŁo corpo e da bolsa paterna. O segundo remediou-se. Tenho desprezo pelo dinheiro. Ligo tĂŁo pouco ao dinheiro que nem o gasto… Mas «gastar» faz parte da «personalidade». SaĂşde — mais difĂ­cil. Este ar apeurĂ© que vem logo ao de cima. A Ăşnica defesa, obviamente, Ă© o resguardo, o isolamento, a medida.
É fácil ser «simpático», difícil é perseverar, assumir o artifício da facilidade. Conservar os amigos. «Não és capaz de dar nada»,

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O Homem Amesquinhado

Apesar do quadro negro de uma cúpula política e intelectual desvairada e grossa e de um povo abandonado a seu próprio destino, ainda havia ali, no país, naquele espantoso verão de 1955, uma considerável energia vital, uma exaltada alegria de viver, acentuada, em alguns lugares e num ou noutro indivíduo, ainda mais possuído do gozo pleno de um extraodinário senso lúdico tropical. Estávamos, poderíamos nos considerar como estando, num dos últimos redutos do ser humano. Depois disso viria o fim, não, como todos pensavam, com um estrondo, mas com um soluço. A densa nuvem desceria, não, como todos pensavam, feita de moléculas radioativas, mas da grosseria de todos os dias, acumulada, aumentada, transmitida, potenciada. O homem se amesquinharia, vítima da mesquinharia do seu semelhante, cada dia menos atento a um gesto de gentileza, a um ato de beleza, a um olhar de amor desinteressado, a uma palavra dita com uma precisa propriedade. E tudo começou a ficar densamente escuro, porque tudo era terrivelmente patrocinado por enlatadores de banha, fabricantes de chouriço e vendedores de desodorante, de modo que toda a pretensa graça da vida se dirigia apenas à barriga dos gordos, à tripa dos porcos, ou, no máximo de finura e elegância,

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Um Mundo de Vidas

NĂłs vivemos da nossa vida um fragmento tĂŁo breve. NĂŁo Ă© da vida geral – Ă© da nossa. É em primeiro lugar a restrita porção do que em cada elemento haveria para viver. Porque em cada um desses elementos há a intensidade com o que poderĂ­amos viver, a profundeza, as ramificações. NĂłs vivemos Ă  superfĂ­cie de tudo na parte deslizante, a que Ă© facilidade e fuga. O resto prende-se irremediavelmente ao escuro do esquecimento e distracção. Mas há sobretudo a zona incomensurável dos possĂ­veis que nĂŁo poderemos viver. Porque em cada instante, a cada opção que fazemos, a cada opção que faz o destino por nĂłs, correspondem as inumeráveis opções que nada para nĂłs poderá fazer. Um golpe de sorte ou de azar, o acaso de um encontro, de um lance, de uma falĂŞncia ou benefĂ­cio fazem-nos eliminar toda uma rede de caminhos para se percorrer um sĂł. Em cada momento há inĂşmeros possĂ­veis, favoráveis ou desfavoráveis, diante de nĂłs. Mas Ă© um sĂł o que se escolheu ou nos calhou.
Assim durante a vida vão-nos ficando para trás mil soluções que se abandonaram e não poderão jamais fazer parte da nossa vida. Regresso à minha infância e entonteço com as milhentas possibilidades que se me puseram de parte.

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A Nulidade como Ideal

A nulidade exige ordem. Tem necessidade de uma hierarquia, de meios de pressão, de agentes e de uma finalidade que se confunda consigo própria. Para manter o ser humano no seu nível mais baixo, onde não corre o risco de fazer ondas, nada melhor que uma organização estruturada com níveis de poder e peões disciplinados capazes de os exercer. Qualquer estrutura deste tipo aguenta-se de pé devido à convicção geral de que não é necessário explicar para se ser obedecido, nem compreender para obedecer. A verdade difunde-se por si só de cima para baixo pelo mero efeito do ascensor hieráriquico. A eficácia é proporcional ao grau de complexidade graças ao qual é mantida a ilusão de uma certa liberdade em todos os níveis de comando.
Quanto mais insignificantes são as engrenagens humanas, mais fácil é convencê-las da sua falsa autonomia. As nulidades fornecem as melhores engrenagens, associando o máximo de inércia intelectual ao máximo de aplicação no exercício de uma ditadura sobre a pequena porção de poder que lhes cabe. Essas estruturas, onde todos têm razão quando estão acima e não a têm quando estão abaixo, realizam uma espécie de ideal humano feito de equilíbrio entre arrogância e humildade.

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Cada um deve ser e proporcionar a si mesmo o melhor e o máximo. Quanto mais for assim e, por conseguinte, mais encontrar em si mesmo as fontes dos seus deleites, tanto mais será feliz.

Música me faz sentir o máximo no palco, e isto é verdade. É como ser um viciado em música.

Alimentar o Ego

Para quem faz do sonho a vida, e da cultura em estufa das suas sensações uma religiĂŁo e uma polĂ­tica, para esse primeiro passo, o que acusa na alma que ele deu o primeiro passo, Ă© o sentir as coisas mĂ­nimas extraordinária — e desmedidamente. Este Ă© o primeiro passo, e o passo simplesmente primeiro nĂŁo Ă© mais do que isto. Saber pĂ´r no saborear duma chávena de chá a volĂşpia extrema que o homem normal sĂł pode encontrar nas grandes alegrias que vĂŞm da ambição subitamente satisfeita toda ou das saudades de repente desaparecidas, ou entĂŁo nos actos finais e carnais do amor; poder encontrar na visĂŁo dum poente ou na contemplação dum detalhe decorativo aquela exasperação de senti-los que geralmente sĂł pode dar, nĂŁo o que se vĂŞ ou o que se ouve, mas o que se cheira ou se gosta — essa proximidade do objecto da sensação que sĂł as sensações carnais — o tacto, o gosto, o olfacto – esculpem de encontro Ă  consciĂŞncia; poder tornar a visĂŁo interior, o ouvido do sonho — todos os sentidos supostos e do suposto — recebedores e tangĂ­veis como sentidos virados para o externo: escolho estas, e as análogas suponham-se,

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A Comédia do Ambicioso

Um homem que aspira a coisas grandes considera todo aquele que encontra no seu caminho, ou como meio, ou como retardamento e impedimento, – ou como um leito de repouso passageiro. A sua “bondade” para com os outros, que o caracteriza e que Ă© superior, sĂł Ă© possĂ­vel quando ele atinge o seu máximo e domina. A impaciĂŞncia e a sua consciĂŞncia de, atĂ© aqui, estar sempre condenado Ă  comĂ©dia – pois mesmo a guerra Ă© uma comĂ©dia e encobre, como qualquer meio encobre o fim -, estraga-lhe todo o convĂ­vio: esta espĂ©cie de homem conhece a solidĂŁo e o que ela tem de mais venenoso.

A formação da linguagem é um paciente, extenso, doloroso e, muitas vezes, desesperante caminho. O erro aparece como uma constante, mas existe a possibilidade de ser sempre menor. Entre um grau máximo e um grau mínimo de erro, situa-se a evolução.

Se quer saber o que estou a ler, nĂŁo lhe digo… seria muito pretensioso. O máximo que se admite que um polĂ­tico diga Ă© que está a ler Eça de QueirĂłs. Ou mesmo talvez um autor mais digno e sĂ©rio: o Herculano, ou o Camilo.

Espírito e carácter: muitos, quanto ao carácter, atingem o seu máximo, mas o espírito não se encontra à altura deste cimo, e em muitos outros sucede inversamente.

Felicidade Simplificada

Se quisermos avaliar a situação de uma pessoa pela sua felicidade, deve-se perguntar não por aquilo que a diverte, mas pelo que a aflige. Quanto mais insignificante for aquilo que, tomado em si mesmo, a aflige, tanto mais ela é feliz, pois é preciso um estado de bem-estar para impressionar-se com bagatelas: na infelicidade, nunca as sentimos.

Guardemo-nos de erguer a felicidade da nossa vida sobre um amplo fundamento, exigindo muito dessa felicidade: pois, estando apoiada sobre tal base, ela desaba mais facilmente, já que oferece muito mais oportunidades para acidentes, que não tardam em faltar. Portanto, a esse respeito, ocorre com o edifício da nossa felicidade o oposto do que ocorre com todos os demais, que se apoiam mais firmemente sobre um amplo fundamento.
Reduzir ao máximo as expectativas em relação aos nossos meios, sejam eles quais forem, é, pois, o caminho mais seguro para escaparmos de uma grande infelicidade.

Nas menores circunstâncias é preciso andar com o máximo cuidado

Nas menores circunstâncias é preciso andar com o máximo cuidado.

A Felicidade Pertence aos que se Bastam a si PrĂłprios

Cada um deve ser e proporcionar a si mesmo o melhor e o máximo. Quanto mais for assim e, por conseguinte, mais encontrar em si mesmo as fontes dos seus deleites, tanto mais será feliz. Com o maior dos acertos, diz Aristóteles: A felicidade pertence aos que se bastam a si próprios. Pois todas as fontes externas de felicidade e deleite são, segundo a sua natureza, extremamente inseguras, precárias, passageiras e submetidas ao acaso; podem, portanto, estancar com facilidade, mesmo sob as mais favoráveis circunstâncias; isso é inevitável, visto que não podem estar sempre à mão.
Na velhice, então, quase todos se esgotam necessariamente, pois abandonam-nos o amor, o gracejo, o prazer das viagens, o prazer da equitação e a propensão para a sociedade. Até os amigos e parentes nos são levados pela morte. É quando, mais do que nunca, importa saber o que alguém tem em si mesmo. Pois isso se conservará por mais tempo. Mas também em cada idade isso é e permanece a única fonte genuína e duradoura da felicidade. Em qualquer parte do mundo, não há muito a buscar: a miséria e a dor preenchem-no, e aqueles que lhes escaparam são espreitados em todos os cantos pelo tédio.

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Se quiser buscar realmente a verdade, é preciso que pelo menos um vez em sua vida você duvide, ao máximo que puder, de todas as coisas.