O divórcio é tão natural que em muitas casas dorme todas as noites entre os cônjuges.
Passagens sobre Naturais
507 resultadosAs Quatro Canções que Seguem
As quatro canções que seguem
Separam-se de tudo o que eu penso,
Mentem a tudo o que eu sinto,
São do contrário do que eu sou …Escrevi-as estando doente
E por isso elas são naturais
E concordam com aquilo que sinto,
Concordam com aquilo com que não concordam…
Estando doente devo pensar o contrário
Do que penso quando estou são.
(Senão não estaria doente),
Devo sentir o contrário do que sinto
Quando sou eu na saúde,
Devo mentir à minha natureza
De criatura que sente de certa maneira
Devo ser todo doente — idéias e tudo.
Quando estou doente, não estou doente para outra cousa.Por isso essas canções que me renegam
Não são capazes de me renegar
E são a paisagem da minha alma de noite,
A mesma ao contrário.
Entender os Nossos Impulsos
O domínio de si próprio, embora eu não negue de forma alguma a sua necessidade em muitas circunstâncias, não é a melhor forma de conseguir que um ser humano se conduza bem. Tem o inconveniente de diminuir a energia e as faculdades criadoras. É como uma pesada armadura que ao mesmo tempo que impede o vosso braço de bater nos vossos vizinhos, o torna igualmente incapaz de um movimento útil. Os que não têm outro apoio além da disciplina que se impõem a si próprios, tornam-se obstinados e timoratos com receio de si próprios.
Mas os impulsos aos quais eles não permitem qualquer saída, continuam a existir neles a tal como os rios represados, cedo ou tarde transbordarão. As forças a que nós contrariamos a função natural que é o desabrochar da nossa própria vida, ou se atrofiam ou acabam por ter uma saída perturbando a vida de outrem. Elas procurarão qualquer saída do género das que não representam nenhum perigo para nós, por exemplo, a tirania doméstica. Se essa saída não for suficiente, há outras que o podem ser. Há sempre condenados e párias a quem a sociedade permite torturar e isso não comporta nenhum risco.
Esses párias,
Cerca de um terço do sofrimento que devo suportar é inteiramente inevitável por ser inerente à própria condição humana. Representa o preço que todos temos que pagar pelo fato de sermos dotados de sensibilidade; embora sedentos de libertação, nos sujeitamos às leis naturais que nos obrigam a continuar caminhando (sem poder retroceder) através de um mundo inteiramente indiferente ao nosso bem-estar. Caminhando em direção à decrepitude e à certeza da morte. Os outros dois terços são ‘confeccionados em casa’ e o Universo os considera inteiramente supérfluos.
Ode
Eis-me nu e singelo!
Areia branca e o meu corpo em cima.
Um puro homem, natural e belo,
De carne que não peca e que não rima.A linha do horizonte é um nível quieto;
As velas, de cansaço, adormeceram;
E penas brancas, que eram luto preto,
Perderam-se no azul de onde vieram.Sol e frescura em toda a grande praia
Onde não pode haver agricultura;
Esterilidade limpa, que não caia
De pão e vinho a cósmica fartura.Dançam toninhas lúdicas no céu
Que visitam ligeiras e felizes;
Uma força sonâmbula as ergueu,
Mas seguras à seiva das raízes.Nem paz, nem guerra, nem desarmonia;
O sexo alegre, mas a repousar;
Um pleno, largo e caudaloso dia,
Sem horas e minutos a passar.Vem até mim, onda que trazes vida!
Soro da redenção!
Vem como o sangue doutra mãe pedida
Na hora de dar mundo ao coração!
Soneto XXXIII
Nunca se viu tão duro coração
Que sentindo chorar não distilasse
Lágrimas fervorosas, nem mostrasse
Que tinha do que via compaixão.Não espalhou Orfeu seus ais em vão,
Mas antes acabara que chorasse,
E que outro novo pranto levantasse,
Quem nunca se doera de aflição.Como não chorará com larga veia
Meu mal quem mo causou, e pouco o estima,
Pois chorá-lo te vê tão tristemente,Sendo mui natural que mais lastima
Quem chora como sua a pena alheia,
Que quem a pena própria chora, e sente.
Testamento
Na taça que eu lavrei quero que bebas
O segredo profundo dos meus dias;
E, dona do que é meu, de mim recebas
Toda a riqueza que não conhecias.A taça é branca como um véu sem cor,
E o segredo nimbado de vazio;
Quero que a veja pois o teu amor,
E bebas só dum trago o luar frio.Quero, depois, que quebres o cristal
De encontro à fraga dura da lembrança
Do Poeta que fui ao natural
Junto de ti a trabalhar na herança.
Podemos enfrentar as leis humanas, mas não podemos resistir às leis naturais.
O desejo de conquista é algo muito natural e comum; aqueles que obtêm êxito na conquista são sempre louvados, e jamais censurados; os que não têm condições de conquistar, mas querem fazê-lo a qualquer custo, cometem um erro que merece ser recriminado.
A fé é uma espécie de coma. Deixamos de raciocinar, deixamos de duvidar. Deixamos de questionar. É natural, pois se estas são as funções da nossa mente, quando elas desaparecem, a nossa mente pára. Se não é usada, acumula lixo, e porque a dúvida não é permitida torna-se cada vez mais lenta.
É a Conformidade que Torna a Convivência Agradável
Aqueles que se contentam em recitar os antigos não tornam a sociedade mais ágil. Mas, quando se busca e se diz uma quantidade de coisas que não provém de quem quer que seja, é possível ao menos encontrar alguma que a sociedade não sabia. Pois é um grande erro imaginar que não se pode dizer nada que não tenha sido dito. (…) Estraga-se frequentemente aquilo que se deseja muito polir e muito embelezar. O meio de evitar esse inconveniente, tanto para bem escrever como para bem falar, é ter ainda mais cuidado com a simplicidade do que com a perfeição das coisas.
O ar nobre e natural é o principal atractivo da eloquência, e entre a gente da sociedade, o que provém do estudo é quase sempre mal acolhido. Deve-se até mesmo conter o espírito em muitas ocasiões, e evitar o que se sabe de maior valor. Admiramos facilmente as coisas que estão acima de nós, e que perdemos de vista; mas apenas as amamos raramente, e isso é o que importa. Os animais buscam apenas os animais da sua espécie, e não seguem os mais perfeitos. É a conformidade que torna a convivência agradável, e que faz amar com uma afeição recíproca.
Somos Todos Casos Excepcionais
Somos todos casos excepcionais. Todos queremos apelar de qualquer coisa! Cada qual exige ser inocente, a todo o custo, mesmo que para isso seja preciso inculpar o género humano e o céu. Contentaremos mediocremente um homem, se lhe dermos parabéns pelos esforços graças aos quais se tornou inteligente ou generoso. Pelo contrário, ele rejubilará, se se admirar a sua generosidade natural. Inversamente, se disssermos a um criminoso que o seu crime nada tem com a sua natureza, nem com o seu carácter, mas com infelizes circunstâncias, ele ficar-nos-á violentamente reconhecido. Durante a defesa, escolherá mesmo este momento para chorar. No entanto, não há mérito nenhum em ser-se honesto, nem inteligente, de nascença! Como se não é certamente mais responsável em ser-se criminoso por natureza que em sê-lo devido às circunstâncias. Mas estes patifes querem a absolvição, isto é, a irresponsabilidade, e tiram, sem vergonha, justificações da natureza ou desculpas das circunstâncias, mesmo que sejam contraditórias. O essencial é que sejam inocentes, que as suas virtudes, pela graça do nascimento, não possam ser postas em dúvida, e que os seus crimes, nascidos de uma infelicidade passageria, nunca sejam senão provisórios. Já lhe disse, trata-se de escapar ao julgamento. Como é difícil escapar e melindroso fazer,
Deixo-me Ir Como Me Apraz
A ciência e a verdade podem residir em nós sem juízo, e este pode habitar-nos desacompanhado delas: o reconhecimento da própria ignorância é um dos mais belos e seguros testemunhos de juízo que conheço. Não tenho outro sargento para pôr em ordem os meus escritos além da fortuna. À medida que as divagações me ocorrem, eu as empilho; ora se atropelam em bando, ora se dispõem em fila. Quero que todos vejam o meu passo natural e simples, por irregular que ele seja. Deixo-me ir como me apraz, e estes não são assuntos que não seja permitido a um homem ignorar ou tratar de maneira ligeira e casual
Bem que eu desejaria ter conhecimento mais perfeito das coisas, mas não quero comprá-lo por ser muito caro. O meu desejo é passar airada e não laborosiamente o tempo que me resta de vida. Bem nenhum existe que seja capaz de levar-me a quebrar a cabeça por ele, nem mesmo a ciência, por valiosa que seja. Não procuro nos livros senão alcançar prazer mediante um divertimento honesto, ou, se estudo, não busco senão a ciência que trata do conhecimento de nós próprios, e que me ensina a morrer e a viver bem.
Nascerão Saudades de Meu Bem
Alegres campos, verdes arvoredos,
Claras e frescas águas de cristal,
Que em vós os debuxais ao natural,
Discorrendo da altura dos rochedos;Silvestres montes, ásperos penedos
Compostos de concerto desigual;
Sabei que, sem licença de meu mal,
Já não podeis fazer meus olhos ledos.E pois já me não vedes como vistes,
Não me alegrem verduras deleitosas,
Nem águas que correndo alegres vêm.Semearei em vós lembranças tristes,
Regar-vos-ei com lágrimas saudosas,
E nascerão saudades de meu bem.
O Mérito só Existe se Enaltecido por Outros
O relato das conversas de Sócrates que os seus amigos nos legaram tem a nossa aprovação apenas porque nos sentimos intimidados pela aprovação geral delas. Não se trata de uma coisa que venha do nosso conhecimento; uma vez que não se adaptam às nossas práticas; se alguma coisa de semelhante viesse a ser produzida nos nossos dias poucos haveria que as tivessem em grande consideração. Não somos capazes de apreciar qualquer honra que não esteja salientada, inflaccionada e aumentada pelo artíficio. Tais honras que tantas vezes surgem disfarçadas com a ingenuidade e a simplicidade, dificilmente seriam notadas por uma visão interior tão grosseira como a nossa… Para nós não será a ingenuidade um parente próximo da simplicidade de espírito e uma qualidade merecedora de censura? Sócrates fazia mover a sua alma com o movimento natural das pessoas comuns: assim fala um camponês, assim fala uma mulher… As suas induções e comparações são retiradas das mais comuns e mais conhecidas actividades do homem; qualquer pessoa é capaz de as compreender. Sob uma forma tão comum nos nossos dias nunca teríamos sido capazes de discernir a nobreza e esplendor destes conceitos espantosos; nós que estamos habituados a criticar todo aquele que não esteja inchado pela erudição para ser base e lugar-comum e que não temos consciência dos ricos a não ser quando pomposamente exibidos.
‘Se preparaste a cama, deves deitar’ – diz um ditado. Parafraseando este ditado, afirmamos: ‘Se gostas de ficar deitado, é natural que fiques doente’.
Penso no acto de escrever. O real é uma retrospectiva: registar recolher nomear esquecer. A mão obedece é uma bobina de seis pontas quando escreve. Esse é o mundo natural do escritor.
O Mal da Cidade
O Homem pensa ter na Cidade a base de toda a sua grandeza e só nela tem a fonte de toda a sua miséria. Vê, Jacinto! Na Cidade perdeu ele a força e beleza harmoniosa do corpo, e se tornou esse ser ressequido e escanifrado ou obeso e afogado em unto, de ossos moles como trapos, de nervos trémulos como arames, com cangalhas, com chinós, com dentaduras de chumbo, sem sangue, sem fibra, sem viço, torto, corcunda – esse ser em que Deus, espantado, mal pode reconhecer o seu esbelto e rijo e nobre Adão! Na cidade findou a sua liberdade moral: cada manhã ela lhe impõe uma necessidade, e cada necessidade o arremessa para uma dependência: pobre e subalterno, a sua vida é um constante solicitar, adular, vergar, rastejar, aturar; rico e superior como um Jacinto, a Sociedade logo o enreda em tradições, preceitos, etiquetas, cerimónias, praxes, ritos, serviços mais disciplinares que os dum cárcere ou dum quartel… A sua tranquilidade (bem tão alto que Deus com ela recompensa os Santos) onde está, meu Jacinto? Sumida para sempre, nessa batalha desesperada pelo pão, ou pela fama, ou pelo poder, ou pelo gozo, ou pela fugidia rodela de ouro!
Alegria como a haverá na Cidade para esses milhões de seres que tumultuam na arquejante ocupação de desejar –
Ser desnaturado é frequentemente sinal de grandeza. Ser natural é por norma sinal de estupidez.
A Um Gérmen
Começaste a existir, geléia crua,
E hás de crescer, no teu silêncio, tanto
Que, é natural, ainda algum dia, o pranto
Das tuas concreções plásmicas flua!A água, em conjugação com a terra nua,
Vence o granito, deprimindo-o … O espanto
Convulsiona os espíritos, e, entanto,
Teu desenvolvimento continua!Antes, geléia humana, não progridas
E em retrogradações indefinidas,
Volvas à antiga inexistência calma!…Antes o Nada, oh! gérmen, que ainda haveres
De atingir, como o gérmen de outros seres,
Ao supremo infortúnio de ser alma!