Passagens sobre Negros

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Frases sobre negros, poemas sobre negros e outras passagens sobre negros para ler e compartilhar. Leia as melhores citaçÔes em Poetris.

Ornitologia

Chegado o Outono, o conhecimento concentra-se nas asas
dos pĂĄssaros que pousam lentos sobre as cores dos frutos.
Sem sentimentos, as aves entregam-se ao sabor do vento
e deixam que no cérebro cresça a febre negra das urzes.
Aquieta-os a experiĂȘncia que conservam do espaço
e que todas as tardes os inibe de partir para continentes
mais prósperos e seguros. Sustém-os um atavismo
apenas explicĂĄvel pelo saber dos signos e o seu desejo
colectivo de suicĂ­dio. Porque nĂŁo escolhem antes
perder-se na tempestade? Talvez visto do ar,
aos seus olhos o mundo se torne mais pesado
e o pensamento se confunda, na memĂłria,
com uma paisagem festiva de piras fĂșnebres.
E contudo, apesar do carĂĄcter cerrado da atmosfera,
o seu peso parece ter-se jĂĄ deixado de sentir
sobre o discurso. Virados para dentro,
as imagens em que se reflectem sĂŁo
as de um mundo banhado pela penĂșmbra.
Afogado na sua razĂŁo de ser. MediĂșnico.
Imagine-se agora o caçador a entrar
paisagem dentro para abater as peças
de que se compÔe o cenårio uma a uma:
vista de dentro,

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Raios não Peço ao Criador do Mundo

LX

Raios não peço ao Criador do Mundo,
Tormentas nĂŁo suplico ao Rei dos Mares,
VulcÔes à terra, furacÔes aos ares,
Negros monstros ao bĂĄratro profundo:

NĂŁo rogo ao deus de amor que furibundo
Te arremesse do pé de seus altares;
Ou que a peste mortal voe a teus lares,
E murche o teu semblante rubicundo.

Não imploro em teu dano, ainda que os laços
Urdidos pela fé, com vil mudança
Fizeste, ingrata Nise, em mil pedaços:

Não quero outro despique, outra vingança,
Mais que ver-te em poder de indignos braços,
E dizer quem te perde, e quem te alcança.

Alucinação À Beira-Mar

Um medo de morrer meus pés esfriava.
Noite alta. Ante o telĂșrico recorte,
Na diuturna discĂłrdia, a equĂłrea coorte
Atordoadoramente ribombava!

Eu, ególatra céptico, cismava
Em meu destino!… O vento estava forte
E aquela matemĂĄtica da Morte
Com os seus nĂșmeros negros me assombrava!

Mas a alga usufructuĂĄria dos oceanos
E os malacopterĂ­gios subraquianos
Que um castigo de espécie emudeceu,

No eterno horror das convulsÔes marítimas
Pareciam também corpos de vítimas
Condenadas Ă  Morte, assim como eu!

A Negra FĂșria CiĂșme

Morre a luz, abafa os ares
Horrendo, espesso negrume,
Apenas surge do Averno
A negra fĂșria CiĂșme.

Sobre um sĂłlio cor da noite
Jaz dos Infernos o Nurne,
E a seus pés tragando brasas
A negra fĂșria CiĂșme.

Crespas vĂ­boras penteia,
Dos olhos dardeja lume,
Respira veneno e peste
A negra fĂșria CiĂșme.

Arrancando Ă  Morte a fouce
De buĂ­do, ervado gume,
Vem retalhar coraçÔes
A negra fĂșria CiĂșme.

Ao cruel sĂłcio de Amor
Escapar ninguém presume,
Porque a tudo as garras lança
A negra fĂșria CiĂșme.

Todos os males do Inferno
Em si guarda, em si resume
O mais horrĂ­vel dos monstros,
A negra fĂșria CiĂșme.

Amor inda Ă© mais suave,
Que das rosas o perfume,
Mas envenena-lhe as graças
A negra fĂșria CiĂșme.

Nas asas de Amor voamos
Do prazer ao ĂĄureo cume,
Porém de lå nos arroja
A negra fĂșria CiĂșme.

Do férreo cålix da Morte
Prova o funesto azedume
Aquele a quem ferve n’alma
A negra fĂșria CiĂșme.

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É sua fotografia tanto quanto sua histĂłria, que me comove. Olhando sua fotografia ‘reconheço’ sua vida. É uma mulher muito negra [
], com os olhos espantados e ofendidos dos pobres inteligentes. SĂł olhando a fotografia podemos saber que ela Ă© o Ășnico meio de sustento dos filhos, pois o pescoço Ă© tĂŁo rĂ­gido quanto os traços sĂŁo suaves [
] na minha imaginação ela Ă© a primeira das nossas mĂŁes arrastadas, maltratadas e resistindo sempre, para a AmĂ©rica.

Na Rua

Veijo-a sempre passar séria, constante,
– Às vezes, inclinada na janella, –
Tranquilla, fria, e pallido o semblante,
Como uma santa triste de capella.

Seu riso sem callor como o brilhante
No nosso labio o proprio riso gella,
E ella nasceu para chorar diante
D’um Christo n’uma estreita e escura cella.

Seu olhar virginal como as crianças
Jamais disse do amor as cousas mansas;
Jamais vergou da Força ao choque rude.

Abrasa-a um fogo divinal secreto! –
eu sinto, mal a avisto, ao seu aspecto,
O brio intenso e negro da Virtude.

Vida Obscura

Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro,
Ó ser humilde entre os humildes seres.
Embriagado, tonto dos prazeres,
O mundo para ti foi negro e duro.

Atravessaste num silĂȘncio escuro
A vida presa a trĂĄgicos deveres
E chegaste ao saber de altos saberes
Tornando-te mais simples e mais puro.

NinguémTe viu o sentimento inquieto,
Magoado, oculto e aterrador, secreto,
Que o coração te apunhalou no mundo.

Mas eu que sempre te segui os passos
Sei que cruz infernal prendeu-te os braços
E o teu suspiro como foi profundo!

Noturno

Pesa o silĂȘncio sobre a terra. Por extenso
Caminho, passo a passo, o cortejo funéreo
Se arrasta em direção ao negro cemitĂ©rio…
À frente, um vulto agita a caçoula do incenso.

E o cortejo caminha. Os cantos do saltério
Ouvem-se. O morto vai numa rede suspenso;
Uma mulher enxuga as lågrimas ao lenço;
Chora no ar o rumor de misticismo aéreo.

Uma ave canta; o vento acorda. A ampla mortalha
Da noite se ilumina ao resplendor da lua…
Uma estrige soluça; a folhagem farfalha.

E enquanto paira no ar esse rumor das calmas
Noites, acima dele em silĂȘncio, flutua
O lausperene mudo e sĂșplice das almas.

Águas Da Saudade Para Dirson Costa Que O Musicou

Sou apenas um homem na paisagem
na tarde de silĂȘncio e de mormaço.
SĂł o vento me anima na passagem
deixando no seu rosto o seu compasso.

Sou apenas um poeta na viagem
olhando pelo olhar dos olhos baços
a distĂąncia que abriga vaga margem
das ĂĄguas da saudade nos meus passos.

Bem me quis esta vila que me habita,
e bem me dei de encantos nos seus becos.
Contudo, nĂŁo cantei sua desdita.

Dessa Manaus distante, restam crespas
pegadas, chĂŁo de rugas; minha pista
banhada em banzeiros do Rio Negro.

Com um sorriso satĂąnico em seu rosto, o jovem judaico de cabelos negros esconde-se na espera da garota inocente que ele suja com seu sangue, roubando-a assim de sua gente.

A informação banaliza os acontecimentos. Dou um exemplo: a primeira vez que se viram na televisão imagens de uma criança negra cheia de fome e com moscas a rodeå-la foi um momento marcante, só que agora jå ninguém lhes liga devido à vulgarização. Alguém no outro dia proibia a divulgação de imagens dessas crianças negras com moscas à volta porque a sua repetição era perigosa. As pessoas habituam-se.

Varanda de Pilatos

Não hå tempo. Hå o espaço. O sol e as nossas voltas.
Os bocejos da lua, o clĂŁ dos astros.
Os buracos negros.
Ó mãe! Para onde foram os seres vivos de ainda
HĂĄ pouco em todo o seu esplendor?
Mortos como tu, a natureza recebe-os.
A Terra, essa criança atroz, destrói os seus brinquedos
Numa rotina mecĂąnica.
Quantas noites me faltam? Quantos beijos no escuro?
Quanta luz me cabe ainda nas pupilas?
Os anos nĂŁo me matam, nĂŁo me ferem os meses,
As horas nĂŁo me guilhotinam.
As células vão ardendo nos seus mapas
De nervos, o sangue demora sempre mais um pouco
A chegar ao seu destino orgĂąnico.
Devagar, devagar, a cabeça amolece.
Devagar no colo do sono.
Ó mãe. Um ninho. Uma cama macia no teu ventre.
Uma exposição de sinais. Uma geometria
Que me liga ao saber acumulado.

De repente o cĂ©u fica negro, o vento sopra forte, as sĂ©ries aparecem, trazendo ondas assustadoras. É o mar separando os homens dos meninos.

VĂȘ Minha Vida Ă  Luz da Protecção

VĂȘ minha vida Ă  luz da protecção
que dĂĄs disposta a dar-se por amor
e quando a mĂŁe te deu Ă  luz com dor
o espĂ­rito adensou-se nela entĂŁo

o mesmo que em espigas pelo verĂŁo
a negra fronte bela foi compor
de inverno em voz amarga acusador
a cuja vista as lĂĄgrimas virĂŁo

Meu amor em teu corpo se cinzela
e dele os outros seres recebem vida
perante ti criança os que da ferida

sangram exposta ao mundo que flagela
A mim foste mais bålsamo porém
do que as curas balsĂąmicas que tem.

Tradução de Vasco Graça Moura

A Partir da AusĂȘncia

Imaginar a forma
doutro ser Na lĂ­ngua,
proferir o seu desejo
O toque inteiro

NĂŁo existir

Se o digo acendo os filamentos
desta nocturna lĂąmpada
A pedra toco do silĂȘncio densa
Os veios de um sangue escuro

Um muro vivo preso a mil raĂ­zes

Mas nĂŁo o vinho lĂ­mpido
de um corpo
A lucidez da terra
E se respiro a boca nĂŁo atinge
a nudez una
onde começo

Era com o sol E era
um corpo

Onde agora a mĂŁo se perde
E era o espaço

Onde nĂŁo Ă©

O que resta do corpo?
Uma matéria negra e fria?
Um hausto de desejo
retém ainda o calor de uma sílaba?

As palavras soçobram rente ao muro
A terra sopra outros vocĂĄbulos nus
Entre os ossos e as ervas,
uma outra mão ténue
refaz o rosto escuro
doutro poema

Tatuagens Complicadas Do Meu Peito

Tatuagens complicadas do meu peito:
TrofĂ©us, emblemas, dois leĂ”es alados…
Mais, entre coraçÔes engrinaldados,
Um enorme, soberbo, amor-perfeito…

E o meu brasĂŁo… Tem de oiro, num quartel
Vermelho, um lis; tem no outro uma donzela,
Em campo azul, de prata o corpo, aquela
Que é no meu braço como que um broquel.

Timbre: rompante, a megalomania…
Divisa: um ai, – que insiste noite e dia
Lembrando ruĂ­nas, sepulturas rasas…

Entre castelos serpes batalhantes,
E ĂĄguias de negro, desfraldando as asas,
Que realça de oiro um colar de besantes!

As Tuas MĂŁos Terminam Em Segredo

As tuas mĂŁos terminam em segredo.
Os teus olhos sĂŁo negros e macios
Cristo na cruz os teus seios (?) esguios
E o teu perfil princesas no degredo…

Entre buxos e ao pé de bancos frios
Nas entrevistas alamedas, quedo
O vendo pÔe o seu arrastado medo
Saudoso o longes velas de navios.

Mas quando o mar subir na praia e for
Arrasar os castelos que na areia
As crianças deixaram, meu amor,

SerĂĄ o haver cais num mar distante…
Pobre do rei pai das princesas feias
No seu castelo Ă  rosa do Levante !

Toda a pessoa normal se sente tentada, de vez em quando, a cuspir nas mãos, içar a bandeira negra e sair por aí cortando gargantas.

Hå uma espécie de pobreza espiritual na riqueza que a torna semelhante à mais negra miséria.

Cansa Sentir Quando se Pensa

Cansa sentir quando se pensa.
No ar da noite a madrugar
HĂĄ uma solidĂŁo imensa
Que tem por corpo o frio do ar.

Neste momento insone e triste
Em que nĂŁo sei quem hei de ser,
Pesa-me o informe real que existe
Na noite antes de amanhecer.

Tudo isto me parece tudo.
E Ă© uma noite a ter um fim
Um negro astral silĂȘncio surdo
E nĂŁo poder viver assim.

(Tudo isto me parece tudo.
Mas noite, frio, negror sem fim,
Mundo mudo, silĂȘncio mudo –
Ah, nada Ă© isto, nada Ă© assim!)