Um Dia Bem Passado
De vez em quando acontece, um dia bem passado. Um dia que Ă© o contrĂĄrio da vida, porque desde o primeiro ao Ășltimo momento acordado, passa-se bem, como antigamente se dizia em Angola e cĂĄ.
Um dia bem passado nĂŁo pode ser planeado. Mas tem de ser protegido. Um dia bem passado Ă© um dia que se passa quase Ă s escondidas. Parece mais roubado do que um beijo – e tem razĂŁo.
Um dia bem passado, como foi o Ășltimo dia de Setembro para a minha mulher e para mim, tem de meter pargos, lavagantes, ostras e beijinhos.
Na Praia das Maçãs, nos bonĂssimos restaurantes Neptuno e BĂșzio, as ostras sĂŁo sumptuosas. Mas nĂŁo as vendem Ă dĂșzia e Ă meia-dĂșzia, comme il faut. Ă ao peso, a granel, como eles as compram. Ă uma prĂĄtica que irrita. Mas com toda a delicadeza, claro. Como uma pĂ©rola, formada pela irritação de um grĂŁo de areia dentro de uma ostra. O peso de uma ostra (a concha mais a carne) nada diz sobre o peso do molusco. HĂĄ ostras gordas e suculentas escondidas por conchas minimais e esguias e hĂĄ ostras minimais e esguias escondidas por conchas gordas e suculentas.
Passagens sobre Ostras
4 resultadosAnĂșncio no Ar
CĂ©us, nuvens, ondas, ventos,
dai-me notĂcias do meu amor norueguĂȘs.Elementos da natureza gastos por tantos versos,
ferralha romĂąntica, brilhai de novo
e trazei-me notĂcias do meu amor norueguĂȘs.Aquela que eu amei um verĂŁo na praia
– pĂ©rola cuja ostra era um barco de carvĂŁo,
matrĂcula de Bergen, essa mesma, elementos!,
notĂcias, notĂcias do meu amor norueguĂȘs.A que veio dos fiordes e vivia num barco
encostado ao cais, junto de um guindaste;
a que me acendeu a manhĂŁ do amor,
a que abriu a porta Ă s tempestades,
a que me deu a chave da invenção…
Existe? Fugiu Ă ocupação? Morreu prisioneira?NotĂcias, notĂcias do seu rosto que mal lembro,
do seu corpo de caule adolescente…
NotĂcias do seixo branco que trocĂĄmos
com palavras de amor em inglĂȘs mal decorado.NotĂcias da que foi espiga mal madura,
notĂcias do meu amor norueguĂȘs.
A ostra forma a partir de um ferimento uma pĂ©rola redonda, perfeita e reluzente. O homem recebe ferimentos em forma de doenças, sofrimentos ou problemas familiares, mas esses ferimentos constituem base para fazer da alma uma âpĂ©rola reluzenteâ. Por esta razĂŁo, diz-se que os sofrimentos sĂŁo necessĂĄrios para o progresso da alma.
Toda a arte é autobiogråfica, a pérola é a autobiografia da ostra.