Passagens sobre Ouvidos

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Frases sobre ouvidos, poemas sobre ouvidos e outras passagens sobre ouvidos para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Tinha certezas imóveis e, no entanto, agora tenho certezas muito mais imóveis. São estátuas para a eternidade. E também, no entanto, a eternidade onde estiver ri-se de mim. Aquilo que é certo, factual, inquestionável, é que devia ter percebido antes, devia ter ouvido as vozes que tentavam avisar-me daquilo que era evidente, daquilo que é evidente agora.

Gosto de Amar

gosto de amar com os dedos,
encontrar o centímetro em que nasce o orgasmo
em ti, perceber a extensão da forma como te sobressaltas,
e encostar-te o meu ouvido à boca para ouvir a voz de
deus.

gosto de amar com os olhos,
gastar a hipótese do sono e ver-te adormecer,
a noite escura e o silêncio de um abraço,
e se queres que te diga
só te escolhi por engano, queria o amor dos livros
e virei escritor, os dias inteiros à espera do teu corpo
para que as metáforas aconteçam.

gosto de amar com as lágrimas,
praticar o abismo, a largura estreita dos teus lábios,
a sensação de mar excessivo da tua língua,
até a maneira como me percorres o sexo
com a extremidade da tua respiração parada,
e sobretudo submeter-me ao castigo da emoção
de te amar ainda depois do final do prazer,
a pequena morte acabada
e a vida toda outra vez a começar.

gosto de amar com o que me resta,
e tudo o que sei é que me resta amar-te.

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Ultrapassar o Medo

As pessoas vivem com medo. Tu tens medo. Todos temos. Uns mais outros menos, uns de uma forma consciente outros de uma forma inconsciente, uns enfrentam-no outros morrem nas suas mãos. O medo, e repito o que já escrevi no “Arrisca-te a Viver”, é a única emoção que não gera ação. Se entrares em pânico foges, se sentires raiva bates ou gritas, se tiveres medo encolhes-te. O medo algema-te, tolda-te as possibilidades e faz de ti seu prisioneiro.
Porque é que achas que o mundo, o país e a tua própria vida se encontram no estado em que estão? Medo. Muito medo. E nesta matéria, permite-me ser assertivo, se tens medo seja do que for de nada te adianta comprar um cão, sabes porquê? Porque vais educá-lo baseado no medo, logo, vais estragar mais uma vida. Não te chegava a tua? Pobre do animal, merecia melhor sorte. Ora bem, uma educação alicerçada no medo fará com que ele viva no próprio medo e tu com medo que ele te desobedeça. É uma desgraça. Serás incapaz de amá-lo, assim como és incapaz de amar seja quem for, muito menos a ti. E se me disseres que não estás de acordo com o que acabei de escrever,

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Uma vez tomada a decisão de não dar ouvidos mesmo aos melhores contra-argumentos: sinal do carácter forte. Também uma ocasional vontade de se ser estúpido.

Dá Tempo à Tua Vocação

Nunca dês ouvidos àqueles que, no desejo de te servir, te aconselham a renunciar a uma das tuas aspirações. Tu bem sabes qual é a tua vocação, pois a sentes exercer pressão sobre ti. E, se a atraiçoas, é a ti que desfiguras. Mas fica sabendo que a tua verdade se fará lentamente, pois ela é nascimento de árvore e não descoberta de uma fórmula. O tempo é que desempenha o papel mais importante, porque se trata de te tornares outro e de subires uma montanha difícil. Porque o ser novo, que é unidade libertada no meio da confusão das coisas, não se te impõe como a solução de um enigma, mas como um apaziguamento dos litígios e uma cura dos ferimentos. E só virás a conhecer o seu poder, uma vez que ele se tiver realizado. Nada me pareceu tão útil ao homem como o silêncio e a lentidão. Por isso os tenho honrado sempe como deuses por demais esquecidos.

Descrição Da Cidade De Sergipe D’el-Rei

Três dúzias de casebres remendados,
Seis becos, de mentrastos entupidos,
Quinze soldados, rotos e despidos,
Doze porcos na praça bem criados.

Dois conventos, seis frades, três letrados,
Um juiz, com bigodes, sem ouvidos,
Três presos de piolhos carcomidos,
Por comer dois meirinhos esfaimados.

As damas com sapatos de baeta,
Palmilha de tamanca como frade,
Saia de chita, cinta de raqueta.

O feijão, que só faz ventosidade
Farinha de pipoca, pão que greta,
De Sergipe d’El-Rei esta é a cidade.

Camões III

Quando, torcendo a chave misteriosa
Que os cancelos fechava do Oriente,
O Gama abriu a nova terra ardente
Aos olhos da companha valorosa,

Talvez uma visão resplandecente
Lhe amostrou no futuro a sonorosa
Tuba. que cantaria a ação famosa
Aos ouvidos da própria e estranha gente.

E disse: “Se já noutra, antiga idade,
Tróia bastou aos homens, ora quero
Mostrar que é mais humana a humanidade.

Pois não serás herói de um canto fero,
Mas vencerás o tempo e a imensidade
Na voz de outro moderno e brando Homero”.

Um Homem Possui Três Estômagos

– Há muitos tipos dc comida — disse o coronel Mõller enquanto abanava o filho.- Um homem possui três estômagos: um na barriga, outro no peito e outro na cabeça. O da barriga, toda a gente sabe para que serve; o do peito mastiga a respiração, que é a nossa comida mais urgente. Uma pessoa morre sem ar muito mais depressa do que sem água e pão. E por fim há o estômago da cabeça, que se alimenta de palavras e de letras. Os primeiros dois estômagos do homem alimentam-se através da boca c do nariz, ao passo que o terceiro estômago se alimenta principalmente através dos olhos e dos ouvidos, apesar de usar tudo o resto dc um modo mais subtil.
— Para mim — disse o mordomo —, as palavras são uma grande palermice.

Sempre os que dizem de antemão que lutam em nome de Deus são pessoas menos pacíficas do mundo: como crêem que recebem mensagens celestiais, têm os ouvidos surdos para qualquer palavra de humanidade.

O Deus Pã não Morreu

O Deus Pã não morreu,
Cada campo que mostra
Aos sorrisos de Apolo
Os peitos nus de Ceres —
Cedo ou tarde vereis
Por lá aparecer
O deus Pã, o imortal.

Não matou outros deuses
O triste deus cristão.
Cristo é um deus a mais,
Talvez um que faltava.
Pã continua a ciar
Os sons da sua flauta
Aos ouvidos de Ceres
Recumbente nos campos.

Os deuses são os mesmos,
Sempre claros e calmos,
Cheios de eternidade
E desprezo por nós,
Trazendo o dia e a noite
E as colheitas douradas
Sem ser para nos dar o dia e a noite e o trigo
Mas por outro e divino
Propósito casual.

As orações dos homens
Subam eternamente aos teus ouvidos;
Eternamente aos teus ouvidos soem
Os cânticos da terra.

No turvo mar da vida,
Onde aos parcéis do crime a alma naufraga,
A derradeira bússola nos seja,
Senhor, tua palavra.

A melhor segurança
Da nossa íntima paz, Senhor, é esta;
Esta a luz que há de abrir à estância eterna
O fulgido caminho.

Ah ! feliz o que pode,
No extremo adeus às cousas deste mundo,
Quando a alma, despida de vaidade,
Vê quanto vale a terra;

Quando das glórias frias
Que o tempo dá e o mesmo tempo some,
Despida já, — os olhos moribundos
Volta às eternas glórias;

Feliz o que nos lábios,
No coração, na mente põe teu nome,
E só por ele cuida entrar cantando
No seio do infinito.

Encarar a Morte

É talvez sinal de prisão ao mundo dos fenómenos o terror e a dor ante a chegada da morte ou a serena mas entristecida resignação com que a fizeram os gregos uma doce irmã do sono; para o espírito liberto ela deve ser, como o som e a cor, falsa, exterior e passageira; não morre, para si próprio nem para nós, o que viveu para a ideia e pela ideia, não é mais existente, para o que se soube desprender da ilusão, o que lhe fere os ouvidos e os olhos do que o puro entender que apenas se lhe apresenta em pensamento; e tanto mais alto subiremos quando menos considerarmos a morte como um enigma ou um fantasma, quanto mais a olharmos como uma forma entre as formas.

Em caso de divergências, nunca se atreve a julgar até que você tenha ouvido o outro lado.

Soneto V

Eu cantarei de amor tão novamente,
Se me ouve aquela de quem sempre canto,
Que de mim dor e magoa, e dela espanto
Terá a mais fera, inculta e dura gente.

E ela que assi tão crua e indinamente
Dura aos meus choros é, surda ao meu canto,
Algüa parte crerá (se não for tanto
Como eu desejo) do que esta alma sente.

Mas como esperarei achar piedade
De mim nem em mim mesmo, se ela nega
(Não peço brandos já) duros ouvidos?

Se nega um volver de olhos com que cega
A luz e dá só escuro claridade,
Como serão meus danos nunca cridos?

Os Feitos Simples são os Mais Elogiados e Lembrados

Duas pátrias produziram dois heróis: de Tebas saiu Hércules; de Roma saiu Catão. Foi Hércules aplauso da orbe, foi Catão enfado de Roma. A um admiraram todos, ao outro esquivaram-se os romanos. Não admite controvérsia a vantagem que levou Catão a Hércules, pois o excedeu em prudência; mas ganhou Hércules a Catão em fama. Mais de árduo e primoroso teve o assunto de Catão, pois se empenhou em sujeitar os monstros dos costumes, e Hércules os da natureza; mas teve mais de famoso o do tebano. A diferença consistiu em que Hércules empreendeu façanhas plausíveis e Catão odiosas. A plausibilidade do cargo levou a glória de Alcides (nome anterior de Hércules) aos confins do mundo, e passará ainda além deles caso se alarguem. O desaprezível do cargo circunscreveu Catão ao interior das muralhas de Roma.
Com tudo isto, preferem alguns, e não os menos judiciosos, o assunto primoroso ao mais plausível, e pode mais com eles a admiração de poucos que o aplauso de muitos, sendo vulgares. Os milagres de ignorantes apelam aos empenhos plausíveis. O árduo, o primoroso de um superior assunto poucos o percebem, embora eminentes, sendo assim raros os que nele acreditam. A facilidade do plausível permite-se a todos,

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Retrospecto

Vinte e seis anos, trinta amores: trinta
vezes a alma de sonhos fatigada.
e, ao fim de tudo, como ao fim de cada
amor, a alma de amor sempre faminta!

Ó mocidade que foges! brada
aos meus ouvidos teu futuro, e pinta
aos meus olhos mortais, com toda a tinta,
os remorsos da vida dissipada!

Derramo os olhos por mim mesmo… E, nesta
muda consulta ao coração cansado,
que é que vejo? que sinto? que me resta?

Nada: ao fim do caminho percorrido,
o ódio de trinta vezes ter jurado
e o horror de trinta vezes ter mentido!

Nos foram dadas duas pernas para andar, as duas mãos para segurar, dois ouvidos para ouvir, dois olhos para ver; mas por que só um coração? Porque o outro foi dado a alguém para nos encontrar.