Dostoievski Mais Moderno Que Tolstoi
Qual a razão porque sentimos que o romance de Dostoievski é mais moderno, por exemplo, que o de Tolstoi? Porque os personagens de Tolstoi quase nunca são o próprio Tolstoi, enquanto os personagens de Dostoievski são quase sempre o próprio Dostoievski. Por outras palavras, interessamo-nos mais pelo escritor que pelas suas criaturas. Procurar-se-ia inútilmente em Dostoievski a descrição completa duma sociedade como em Guerra e Paz. O grande problema para ele é o de dar consistência humana aos seus mais misteriosos e contraditórios instintos. É um facto que recentemente tem havido um grande falatório acerca do subconsciente a propósito de Dostoievski. Mas não acreditamos que a psicanálise tenha alguma coisa a ver com a arte, todavia a tentativa de exegese psicanalítica indica a validade de elementos puramente subjectivos perante os quais cai qualquer hipótese de verosimilhança.
Passagens sobre Paz
686 resultadosMaritain disse que o mundo precisava mais de metafísica do que de carvão. Podemos dizer hoje que o mundo precisa mais de poesia do que de petróleo. A poesia é de fato a emoção reelaborada na tranquilidade. É, assim, a síntese da emoção e da paz.
Aspiração
Sinto que há na minha alma um vácuo imenso e fundo,
E desta meia morte o frio olhar do mundo
Não vê o que há de triste e de real em mim;
Muita vez, ó poeta, a dor é casta assim;
Refolha-se, não diz no rosto o que ela é,
E nem que o revelasse, o vulgo não põe fé
Nas tristes comoções da verde mocidade,
E responde sorrindo à cruel realidade.Não assim tu, ó alma, ó coração amigo;
Nu, como a consciência, abro-me aqui contigo;
Tu que corres, como eu, na vereda fatal
Em busca do mesmo alvo e do mesmo ideal.
Deixemos que ela ria, a turba ignara e vã;
Nossas almas a sós, como irmã junto a irmã,
Em santa comunhão, sem cárcere, sem véus.
Conversarão no espaço e mais perto de Deus.Deus quando abre ao poeta as portas desta vida
Não lhe depara o gozo e a glória apetecida;
Tarja de luto a folha em que lhe deixa escritas
A suprema saudade e as dores infinitas.
Alma errante e perdida em um fatal desterro,
Evitai ter vizinhos, se quereis viver em paz com eles.
Os fabricantes de armamento são adeptos da paz, que lhes oferece tranqüilidade para preparar a guerra.
Pouco mais é necessário para erguer um Estado, da mais primitiva barbárie até o mais alto grau de opulência, além de paz, de baixos impostos e de boa administração da justiça: todo o resto corre por conta do curso natural das coisas.
Quem está em boa paz não suspeita de ninguém.
As Esperas
Uma
Esperamos na paz que a si mesma se anula
aquilo que nos possa doar o tempo,
além da passividade a que nos habituámos
e a confusão de sentimentos que move,
incautos, nossos passos pelas ruas.A angústia de saber que não se volta a casa
e para sempre deixamos as fronteiras do país
visita-nos com a sua invalidez irreparável
no instante compassivo em que prenderíamos
as mãos ao pouco que displicentemente amámos.Pois nada nos poderia assombrar sob a coberta,
na intimidade de nossas casas, ao deitarmos
a cabeça na almofada. Não há liturgia da palavra
nem ofertório aos santos que permita a uma existência
ociosa achar no meio do terror área reservada.Assim esperamos, mantendo o porte de cabeça
que nos distingue, sem cartas de despedida,
sem apologia e afixação de editais penitentes,
sem aquinhoar por quem fica os bens de raiz,
o tiro certeiro que nos redima em obra póstuma.
Bom dia, amigo Que a paz seja contigo Eu vim somente dizer Que eu te amo tanto Que vou morrer Amigo… adeus
Não existe um Caminho para a PAZ. A PAZ é o Caminho
O Ofício
Escrevo para sentir nas veias
o voo da pedra.Antecipação da paz
neste país de granadas
moldadas
no silêncio dos frutos.Escrevo como quem escava
no bojo da sombra
um mar de claridade.Pedras vivas de possibilidade
as palavras levantam
o crime, os pássaros do pântanoEscrevo
no grande espaço obscuro
que somos e nos inunda.
À Beleza
Não tens corpo, nem pátria, nem família,
Não te curvas ao jugo dos tiranos.
Não tens preço na terra dos humanos,
Nem o tempo te rói.
És a essência dos anos,
O que vem e o que foi.És a carne dos deuses,
O sorriso das pedras,
E a candura do instinto.
És aquele alimento
De quem, farto de pão, anda faminto.És a graça da vida em toda a parte,
Ou em arte,
Ou em simples verdade.
És o cravo vermelho,
Ou a moça no espelho,
Que depois de te ver se persuade.És um verso perfeito
Que traz consigo a força do que diz.
És o jeito
Que tem, antes de mestre, o aprendiz.És a beleza, enfim. És o teu nome.
Um milagre, uma luz, uma harmonia,
Uma linha sem traço…
Mas sem corpo, sem pátria e sem família,
Tudo repousa em paz no teu regaço.
Bondade
É a bondade que te faz formosa,
Que a alma te diviniza e transfigura;
É a bondade, a rosa da ternura,
Que te perfuma com perfume à rosa.Teu ser angelical de luz bondosa
Verte em meu ser a mais sutil doçura,
Uma celeste, límpida frescura,
Um encanto, uma paz maravilhosa.Eu afronto contigo os vampirismos,
Os corruptos e mórbidos abismos
Que em vão busquem tentar-me no Caminho.Na suave, na doce claridade,
No consolo, de amor dessa bondade
Bebo a tu’alma como etéreo vinho.
Incerteza, aridez, paz – todas as coisas passam por aí e desaparecem.
Quero que todos sejam felizes e me deixem em paz.
Mistério
Gosto de ti, ó chuva, nos beirados,
Dizendo coisas que ninguém entende!
Da tua cantilena se desprende
Um sonho de magia e de pecados.Dos teus pálidos dedos delicados
Uma alada canção palpita e ascende,
Frases que a nossa boca não aprende
Murmúrios por caminhos desolados.Pelo meu rosto branco, sempre frio,
Fazes passar o lúgubre arrepio
Das sensações estranhas, dolorosas…Talvez um dia entenda o teu mistério…
Quando, inerte, na paz do cemitério,
O meu corpo matar a fome às rosas!
Insónia
Não durmo, nem espero dormir.
Nem na morte espero dormir.Espera-me uma insónia da largura dos astros,
E um bocejo inútil do comprimento do mundo.Não durmo; não posso ler quando acordo de noite,
Não posso escrever quando acordo de noite,
Não posso pensar quando acordo de noite —
Meu Deus, nem posso sonhar quando acordo de noite!Ah, o ópio de ser outra pessoa qualquer!
Não durmo, jazo, cadáver acordado, sentindo,
E o meu sentimento é um pensamento vazio.
Passam por mim, transtornadas, coisas que me sucederam
— Todas aquelas de que me arrependo e me culpo;
Passam por mim, transtornadas, coisas que me não sucederam
— Todas aquelas de que me arrependo e me culpo;
Passam por mim, transtornadas, coisas que não são nada,
E até dessas me arrependo, me culpo, e não durmo.Não tenho força para ter energia para acender um cigarro.
Fito a parede fronteira do quarto como se fosse o universo.
Lá fora há o silêncio dessa coisa toda.
Um grande silêncio apavorante noutra ocasião qualquer,
Noutra ocasião qualquer em que eu pudesse sentir.
LXXV
Como se moço e não bem velho eu fosse
Uma nova ilusão veio animar-me.
Na minh’alma floriu um novo carme,
O meu ser para o céu alcandorou-se.Ouvi gritos em mim como um alarme.
E o meu olhar, outrora suave e doce,
Nas ânsias de escalar o azul, tornou-se
Todo em raios que vinham desolar-me.Vi-me no cimo eterno da montanha,
Tentando unir ao peito a luz dos círios
Que brilhavam na paz da noite estranha.Acordei do áureo sonho em sobressalto:
Do céu tombei aos caos dos meus martírios,
Sem saber para que subi tão alto…
O homem de Deus é menino pela confiança e é adulto pelo reconhecimento da paz do coração.
Lúcia
(Alfred de Musset)
Nós estávamos sós; era de noite;
Ela curvara a fronte, e a mão formosa,
Na embriaguez da cisma,
Tênue deixava errar sobre o teclado;
Era um murmúrio; parecia a nota
De aura longínqua a resvalar nas balsas
E temendo acordar a ave no bosque;
Em torno respiravam as boninas
Das noites belas as volúpias mornas;
Do parque os castanheiros e os carvalhos
Brando embalavam orvalhados ramos;
Ouvíamos a noite, entre-fechada,
A rasgada janela
Deixava entrar da primavera os bálsamos;
A várzea estava erma e o vento mudo;
Na embriaguez da cisma a sós estávamos
E tínhamos quinze anos!Lúcia era loura e pálida;
Nunca o mais puro azul de um céu profundo
Em olhos mais suaves refletiu-se.
Eu me perdia na beleza dela,
E aquele amor com que eu a amava – e tanto ! –
Era assim de um irmão o afeto casto,
Tanto pudor nessa criatura havia!Nem um som despertava em nossos lábios;
Ela deixou as suas mãos nas minhas;
Tíbia sombra dormia-lhe na fronte,