Sim, nada mais sou do que um viajante, um peregrino sobre a terra! E você é alguma coisa mais do que isso?
Passagens sobre Peregrinos
54 resultadosPost Coitum Animal Triste
Em ti o poema, o amplo tecido da água ou a forma
do segredo. Outrora conheceste a margem abandonada
do desejo, a sua extensão e principias a entregar
os vasos alongados para receberes as mãos das chuvas.Apagaram-se junto dos teus olhos as praias, as árvores
que se ergueram um dia sobre as estradas romanas,
o vestígio dos últimos peregrinos, aves nuas
que já desceram, cansadas, pelo interior do teu peito.Uma voz, no silêncio calmo das águas, esquece
a mentira das primeiras colheitas, onde os nossos gestos
perderam os sorrisos ou o orvalho que os cerca.Serenamente, começaram a fechar-se os sonhos de Deus
no interior de novos frutos e, abandonado, fico
junto do teu corpo, onde principia a sombra deste poema.
O Cego Do Harmonium
Esse cego do harmonium me atormenta
E atormentando me seduz, fascina.
A minh’alma para ele vai sedenta
Por falar com a sua alma peregrina.O seu cantar nostálgico adormenta
Como um luar de mórbida neblina.
O harmonium geme certa queixa lenta,
Certa esquisita e lânguida surdina.Os seus olhos parecem dois desejos
Mortos em flor, dois luminosos beijos
Fanados, apagados, esquecidos…Ah! eu não sei o sentimento vário
Que prende-me a esse cego solitário,
De olhos aflitos como vãos gemidos!
Grande Amor
Grande amor, grande amor, grande mistério
Que as nossas almas trêmulas enlaça…
Céu que nos beija, céu que nos abraça
Num abismo de luz profundo e sério.Eterno espasmo de um desejo etéreo
E bálsamo dos bálsamos da graça,
Chama secreta que nas almas passa
E deixa nelas um clarão sidéreo.Cântico de anjos e de arcanjos vagos
Junto às águas sonâmbulas de lagos,
Sob as claras estrelas desprendido…Selo perpétuo, puro e peregrino
Que prende as almas num igual destino,
Num beijo fecundado num gemido.
Eu Passava Na Vida Errante E Vago
Eu passava na vida errante e vago
Como o nauta perdido em noite escura,
Mas tu te ergueste peregrina e pura
Como o cisne inspirado em manso lago,Beijava a onda, num soluço mago,
Das moles plumas a brilhante alvura,
E a voz ungida de eternal doçura
Roçava as nuvens em divino afago.Vi-te; e nas chamas de fervor profundo
A teus pés afoguei a mocidade
Esqueci de mim, de Deus, do mundo ! …Mas ai! Cedo Fugiste ! … da saudade,
Hoje te imploro desse amor tão fundo
Uma idéia, uma queixa, uma saudade!
Eu queria escrever luxuoso. Usar palavras que rebrilhassem molhadas e fossem peregrinas. Às vezes solenes em púrpura, às vezes abismais esmeraldas, às vezes leves na mais fina seda macia.
XI
Formosa é Daliana; o seu cabelo,
A testa, a sobrancelha é peregrina;
Mas nada tem, que ver coa bela Eulina,
Que é todo o meu amor, o meu desvê-lo:Parece escura a nove em paralelo
Da sua branca face; onde a bonina
As cores misturou na cor mais fina,
Que faz sobressair seu rosto belo.Tanto os seus lindos olhos enamoram,
Que arrebatados, como em doce encanto,
Os que a chegam a ver, todos a adoram.Se alguém disser, que a engrandeço tanto
Veia, para desculpa dos que choram
Veja a Eulina; e então suspenda o pranto.
Soneto
Brancas Aparições, Visões renanas,
Imagens dos Ascetas peregrinos,
Hinos nevoentos, neblinosos hinos
Das brumosas igrejas luteranas.Vago mistério das regiões indianas,
Sonhos do Azul dos astros cristalinos,
Coros de Arcanjos, claros sons divinos
Dos Arcanjos, nas tiorbas soberanas.Tudo ressurge na minh’alma e vaga
Num fluido ideal que me arrebata e alaga,
No abandono mais lânguido mais lasso…Quando lá nos sacrários do Cruzeiro
A lua rasga o trêmulo nevoeiro,
Magoada de vigílias e cansaço…
Avena Pastoral
Harmonia de coxas protetora
do presente esperado como prêmio
antevéspera és, a domadora
dos gestos apressados no proscêniodo palco em que inauguro-te pastora
de ovelha desgarrada,vil boêmio,
peregrino da noite assoladora,
a solar no teu corpo um abstêmiocanto, de partitura tão antiga,
em que tecidos sons alucinados
são sedas de silêncio na cantiga.Uma cantiga em gozo emparelhado.
E tu na flauta tocas pra que eu siga
lambendo o sal no lago desgarrado.
Em Viagem
Pelo caminho estreito, aonde a custo
Se encontra uma só flor, ou ave, ou fonte,
Mas só bruta aridez de áspero monte
E os soes e a febre do areal adusto,Pelo caminho estreito entrei sem susto
E sem susto encarei, vendo-os defronte,
Fantasmas que surgiam do horizonte
A acommeter meu coração robusto…Quem sois vós, peregrinos singulares?
Dor, Tédio, Desenganos e Pesares…
Atraz d’eles a Morte espreita ainda…Conheço-vos. Meus guias derradeiros
Sereis vós. Silenciosos companheiros,
Bemvindos, pois, e tu, Morte, bemvinda!
I
Para cantar de amor tenros cuidados,
Tomo entre vós, ó montes, o instrumento;
Ouvi pois o meu fúnebre lamento;
Se é, que de compaixão sois animados:Já vós vistes, que aos ecos magoados
Do trácio Orfeu parava o mesmo vento;
Da lira de Anfião ao doce acento
Se viram os rochedos abalados.
Bem sei, que de outros gênios o Destino,
Para cingir de Apolo a verde rama,
Lhes influiu na lira estro divino:O canto, pois, que a minha voz derrama,
Porque ao menos o entoa um peregrino,
Se faz digno entre vós também de fama.
Faz Tempo que Aportei Aqui
Faz tempo que aportei aqui,
nesta vida gorda, de algibeira rasa.
Peão de sonhos, pastor de auroras,
os reinos conquistados foram meus.
Vesti-me de certeza, de ousadias,
fui peregrino silente entre silêncios.
Meus cantares ecoaram nas planícies,
vibraram meus acenos noutros céus.
Se as tardes floresciam nos vergéis,
luzes ali ardentes se acendiam.
Já distante, embora,
este sol radiante
sucumbe, agora,
ao punhal do tempo.
Desaires Da Formosura.
Rubi, concha de perlas peregrina,
Animado cristal, viva escarlata,
Duas safiras sobre lisa prata,
Ouro encrespado sobre prata fina.Este o rostinho é de Caterina;
E porque docemente obriga e mata,
Não livra o ser divina em ser ingrata
E raio a raio os corações fulmina.Viu Fábio uma tarde transportado
Bebendo admirações, e galhardias
A quem já tanto amor levantou aras:Disse igualmente amante e magoado:
Ah muchacha gentil, que tal serias
Se sendo tão formosa não cagaras!
Vénus
I
À flor da vaga, o seu cabelo verde,
Que o torvelinho enreda e desenreda…
O cheiro a carne que nos embebeda!
Em que desvios a razão se perde!Pútrido o ventre, azul e aglutinoso,
Que a onda, crassa, num balanço alaga,
E reflui (um olfato que se embriaga)
Como em um sorvo, murmura de gozo.O seu esboço, na marinha turva…
De pé flutua, levemente curva;
Ficam-lhe os pés atrás, como voando…E as ondas lutam, como feras mugem,
A lia em que a desfazem disputando,
E arrastando-a na areia, co’a salsugem.II
Singra o navio. Sob a água clara
Vê-se o fundo do mar, de areia fina…
_ Impecável figura peregrina,
A distância sem fim que nos separa!Seixinhos da mais alva porcelana,
Conchinhas tenuemente cor de rosa,
Na fria transparência luminosa
Repousam, fundos, sob a água plana.E a vista sonda, reconstrui, compara,
Tantos naufrágios, perdições, destroços!
_ Ó fúlgida visão, linda mentira!Róseas unhinhas que a maré partira…
Dentinhos que o vaivém desengastara…