O Primeiro Filho
(Carta ao amigo Bernardo Pindela)
Entre tanta miséria e tantas coisas vis
Deste vil grĂŁo de areia,
Ainda tenho o condĂŁo de me sentir feliz
Com a ventura alheia.Ă€ minha noite triste, Ă noite tormentosa,
Onde busco a verdade,
Chegou com asas d’oiro a canção cor-de-rosa
Da tua felicidade.És pai, viste nascer um fragmento d’aurora
Da tua alma, de ti…
Oh, momento divino em que o sorriso chora,
E em que o pranto sorri!Que ventura radiante! oh que ventura infinda!
OlĂmpicos amores
Ter frutos em Abril com o vergel ainda
Carregado de flores!Deslumbramento!… ver num berço o teu futuro
Sorrindo ao teu presente!…
Ter a mulher e a mĂŁe: juntar o beijo puro
Com o beijo inocente!…Eu que vou, javali de flanco ensanguentado,
Pelos rudes caminhos
Ajoelho quando escuto Ă beira dum valado
Os murmĂşrios dos ninhos!Em tudo que alvorece há um sorriso d’esperança,
Candura imaculada!…
E quer seja na flor, quer seja na criança
Sente-se a madrugada.Quando,
Poemas sobre Aroma de Guerra Junqueiro
2 resultadosCarta (a um Amigo que me Pediu Versos)
Como hei-de ser um Petrarca,
Cantar como um rouxinol,
Se o meu termĂłmetro marca
Quarenta e dois graus ao sol!Da lira bárbara e tosca
Nem saem trovas d’Alfama.
Enxota o PĂ©gaso a mosca,
E eu durmo a sesta na cama.A hipocondria maciça
Conduzo-a, não há remédio,
Na jumenta da preguiça
Pelas charnecas do tédio.Eu trago a inspiração oca,
Ando abatido, ando mono;
Meus versos abrem a boca,
Como os porteiros com sono.NĂŁo tenho a rima imprevista,
Os guizos d’oiro ou de opala,
Que Ă asa da estrofe o artista
Sublime prende ao largá-la.P’ra lapidar Ă vontade
Um belo verso radiante,
Falta-me a tenacidade,
Que Ă© como o pĂł do diamante.A musa foi-se-me embora;
Para onde foi nem me lembro;
SĂł a torno a ver agora
Lá para os fins de Setembro.Anda talvez nas florestas
Fazendo orgias pagĂŁs,
Entre os aromas das giestas
E os braços dos Egipãs.Deixá-la andar lá dois meses
Colhendo imagens e flores,