Flores Velhas
Fui ontem visitar o jardinzinho agreste,
Aonde tanta vez a lua nos beijou,
E em tudo vi sorrir o amor que tu me deste,
Soberba como um sol, serena como um vĂ´o.Em tudo cintilava o lĂmpido poema
Com Ăłsculos rimado Ă s luzes dos planetas:
A abelha inda zumbia em torno da alfazema;
E ondulava o matiz das leves borboletas.Em tudo eu pude ver ainda a tua imagem,
A imagem que inspirava os castos madrigais;
E as vibrações, o rio, os astros, a paisagem,
Traziam-me Ă memĂłria idĂlios imortais.E nosso bom romance escrito num desterro,
Com beijos sem ruĂdo em noites sem luar,
Fizeram-mo reler, mais tristes que um enterro,
Os goivos, a baunilha e as rosas-de-toucar.Mas tu agora nunca, ah! Nunca mais te sentas
Nos bancos de tijolo em musgo atapetados,
E eu nĂŁo te beijarei, Ă s horas sonolentas,
Os dedos de marfim, polidos e delgados…Eu, por nĂŁo ter sabido amar os movimentos
Da estrofe mais ideal das harmonias mudas,
Eu sinto as decepções e os grandes desalentos
E tenho um riso meu como o sorrir de Judas.
Poemas sobre Escravos de Cesário Verde
2 resultadosDesastre
Ele ia numa maca, em ânsias, contrafeito,
Soltando fundos ais e trĂŞmulos queixumes;
CaĂra dum andaime e dera com o peito,
Pesada e secamente, em cima duns tapumes.A brisa que balouça as árvores das praças,
Como uma mĂŁe erguia ao leito os cortinados,
E dentro eu divisei o ungido das desgraças,
Trazendo em sangue negro os membros ensopados.Um preto, que sustinha o peso dum varal,
Chorava ao murmurar-lhe: “Homem nĂŁo desfaleça!”
E um lenço esfarrapado em volta da cabeça,
Talvez lhe aumentasse a febre cerebral.***
Findara honrosamente. As lutas, afinal,
Deixavam repousar essa criança escrava,
E a gente da provĂncia, atĂ´nita, exclamava:
“Que providĂŞncias! Deus! Lá vai para o hospital!”Por onde o morto passa há grupos, murmurinhos;
Mornas essĂŞncias vĂŞm duma perfumaria,
E cheira a peixe frito um armazém de vinhos,
Numa travessa escura em que nĂŁo entra o dia!Um fidalgote brada e duas prostitutas:
“Que espantos! Um rapaz servente de pedreiro!”
Bisonhos, devagar, passeiam uns recrutas
E conta-se o que foi na loja dum barbeiro.