Poemas sobre Estradas de Mia Couto

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Poemas de estradas de Mia Couto. Leia este e outros poemas de Mia Couto em Poetris.

Horário do Fim

morre-se nada
quando chega a vez

é só um solavanco
na estrada por onde já não vamos

morre-se tudo
quando não é o justo momento

e não é nunca
esse momento

Fala de Mãe e Filho

«Meu filho:
onde vais
que tens do rio o caminhar?»

Não espreites a estrada, mãe,
que eu nasci
onde o tempo se despenhou.

«Meu filho:
onde te posso lembrar
se apenas te dei nome para te embalar ?»

Mãe, minha mãe:
não te pese saudade
que eu voltarei sempre
como quem chega do mar.

«Meu filho:
onde te posso nascer
se meu ventre seco
nunca ninguém gerou?»

Mãe, nascerás sempre
na pedra em que te escuto:
a tua ausência, meu luto,
teu corpo para sempre insepulto.

Versos para a Patrícia

1. Ilha

Tenho a sede das ilhas
e esquece-me ser terra

Meu amor, aconchega-me
meu amor, mareja-me

Depois, não
me ensines a estrada.

A intenção da água é o mar
a intenção de mim és tu.

2. Véspera

Há um perfume
que trabalha em mim
e me acende,
antigo,
sobre a poeira

Há um rosto
que regressa à fonte
água readormecendo

E só hoje reparo
o labor das nuvens
corais solares
arquitectando o céu

Pássaros brancos
vão pousando
na varanda dos teus olhos

Só hoje enfrento o sol
fogo imóvel,
labareda de água

Andemos, meu amor,
de coração descalço sobre o sol