Mentir-me não Adianta
Vieram hoje dizer-me
mentiras a meu respeito,
mas nunca podem esconder-me
o que lhes vai lá no peito.Só quero hoje a verdade,
mais nua que ave perdida…
Os sinos tangem-me a idade
na alta torre da vida.Mentiras, fora daqui!
Ide acampar noutra parte!
Existe um espelho que ri,
ao desnudar-vos com arte.Palavras, gestos, partissem,
morressem antes do dia!
Humildes, se diluíssem
na madrugada bem fria.Deixai-me as cordas do sino
de me sentir como sou.
Puxando-as, oiço o menino
que nas entranhas ficou.Idade! Já tenho tanta!
Nasci num dia riscado
do calendário do Tempo.
O meu destino é dobrado,
mentir-me não adianta!
Poemas Exclamativos de Isabel Gouveia
4 resultadosA Teia da Esperança
A teia tecida
nas noites de esperança,
rasgada e ferida,
segue a nossa andança.E juntos, mãos dadas,
olhamos pra ela,
vontades paradas,
quais barcos sem vela.Amigo, que o braço
cansado de tédio
ergamos no espaço!
É esse o remédio.Depois de cerzidas,
não ficam marcadas
profundas feridas
em teias rasgadas!
Culpabilidade
O que é o perdão?
Vivi na esperança
de o ter entre os dedos.
Quem diz que o alcança
só vive de enredos…Fiz mal? Mas a quem?
Que venham contar-me
as mágoas geradas
por meu vil desdém
e as feridas mostrar-me
na carne rasgadas.Fiz mal? Mas a quem?
Fui pedra lançada
no vosso caminho?
Barrei-vos a estrada
com traves de pinho?Só sei que
há vozes gritando
a culpa que sinto
pesar-me na alma,
há ecos cavando
a dor que pressinto
em noites de calma…Só sei que
suspensos enredos
da minha agonia,
urdida ao serão
em grande segredo,
tornaram vazia
a minha intuição.Fiz mal? Sim ou não?
Onde e quando?
Dizei-mo, dizei-mo!Eu sou como a rocha
virada prò norte,
que acolhe a rajada
em concha bem forte
e a atira prò nada…Fiz mal? Sim ou não?
Até os duendes,
escondidos e aduncos,
me negam razão.
Falsos Amigos
Tenho amigos que pensam confundir-me
igualando a loucura à minha ânsia.
Pobrezitos!, que tentam destruir-me
havendo de permeio esta distância.Eu tenho pena de não ser um deles,
ao menos uma vez, por uns momentos.
Gostava de morrer um dia neles,
ressuscitando nos seus pensamentos.Pintar-lhes-ei um dia o rosto a sério,
com talento nascido de neurose
que faça vê-los nus no baptistério
onde lavam a alma da esclerose?Toda a gente rirá desse retrato,
e haverá certamente prò comprar
um novo-rico que lhe admire o fato
e o pendure na sala de jantar.Hei-de pôr-Ihes uns olhos que reluzam,
mas vazios nas órbitas repletas,
profanação nos dedos que se cruzam,
num indigno repouso de poetas.Ah, são eles que procuram destruir-me,
criticando-me as faces controversas!,
mas apenas conseguem reunir-me
nas mil forças que tenho bem dispersas.