Por uma Noite de Outomno
Por uma noite de outomno
Lá n’essa nave sombría,
Hei-de contigo deitar-me,
Mulher branca e muda e fria!Hei-de possuir na morte
O teu corpo de marfim,
Mulher que nunca me olhaste,
Que nunca pensaste em mim…E quando, no fim do mundo,
A trombêta, além, se ouvir,
Apertar-te-hei mais ainda,
– Não te deixarei partir!A tua boca formosa
Será sempre dos meus beijos;
E o teu corpo a minha patria,
A patria dos meus desejos.
Poemas sobre Fim de António Botto
3 resultadosAndáva a Lua nos Céus
Andáva a lua nos céus
Com o seu bando de estrellas.Na minha alcova,
Ardiam vellas,
Em candelabros de bronze.Pelo chão, em desalinho,
Os velludos pareciam
Ondas de sangue e ondas de vinho.Elle olhava-me scismado;
E eu,
Placidamente, fumava,
Vendo a lua branca e núa
Que pelos céus caminhava.Aproximou-se; e em delirio
Procurou ávidamente,
E ávidamente beijou
A minha boca de cravo
Que a beijar se recusou.Arrastou-me para Elle,
E, encostado ao meu hombro,
Fallou-me d’um pagem loiro
Que morrêra de Saudade,
Á beira-mar, a cantar…Olhei o céu!
Agora, a lua, fugia,
Entre nuvens que tornavam
A linda noite sombría.Déram-se as bocas n’um beijo,
– Um beijo nervoso e lento…
O homem cede ao desejo
Como a nuvem cede ao vento.Vinha longe a madrugada.
Por fim,
Largando esse corpo
Que adormecêra cansado
E que eu beijára loucamente
Sem sentir,
Bebia vinho, perdidamente,
Bebia vinho… até cahir.
Passei o Dia Ouvindo o que o Mar Dizia
Eu hontem passei o dia
Ouvindo o que o mar dizia.Chorámos, rimos, cantámos.
Fallou-me do seu destino,
Do seu fado…Depois, para se alegrar,
Ergueu-se, e bailando, e rindo,
Poz-se a cantar
Um canto molhádo e lindo.O seu halito perfuma,
E o seu perfume faz mal!Deserto de aguas sem fim.
Ó sepultura da minha raça
Quando me guardas a mim?…Elle afastou-se calado;
Eu afastei-me mais triste,
Mais doente, mais cansado…Ao longe o Sol na agonia
De rôxo as aguas tingia.«Voz do mar, mysteriosa;
Voz do amôr e da verdade!
– Ó voz moribunda e dôce
Da minha grande Saudade!
Voz amarga de quem fica,
Trémula voz de quem parte…»
. . . . . . . . . . . . . . . .E os poetas a cantar
São echos da voz do mar!