Poemas sobre Força de Miguel Torga

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Poemas de força de Miguel Torga. Leia este e outros poemas de Miguel Torga em Poetris.

À Beleza

NĂŁo tens corpo, nem pĂĄtria, nem famĂ­lia,
NĂŁo te curvas ao jugo dos tiranos.
Não tens preço na terra dos humanos,
Nem o tempo te rĂłi.
És a essĂȘncia dos anos,
O que vem e o que foi.

És a carne dos deuses,
O sorriso das pedras,
E a candura do instinto.
És aquele alimento
De quem, farto de pĂŁo, anda faminto.

És a graça da vida em toda a parte,
Ou em arte,
Ou em simples verdade.
És o cravo vermelho,
Ou a moça no espelho,
Que depois de te ver se persuade.

És um verso perfeito
Que traz consigo a força do que diz.
És o jeito
Que tem, antes de mestre, o aprendiz.

És a beleza, enfim. És o teu nome.
Um milagre, uma luz, uma harmonia,
Uma linha sem traço…
Mas sem corpo, sem pĂĄtria e sem famĂ­lia,
Tudo repousa em paz no teu regaço.

InocĂȘncia

Vou aqui como um anjo, e carregado
De crimes!
Com asas de poeta voa-se no cĂ©u…
De tudo me redimes,
PenitĂȘncia
De ser artista!
Nada sei,
Nada valho,
Nada faço,
E abre-se em mim a força deste abraço
Que abarca o mundo!

Tudo amo, admiro e compreendo.
Sou como um sol fecundo
Que adoça e doira, tendo
Calor apenas.
Puro,
Divino
E humano como os outros meus irmĂŁos,
Caminho nesta ingénua confiança
De criança
Que faz milagres a bater as mĂŁos.

Paz

Calado ao pé de ti, depois de tudo,
Justificado
Como o instinto mandou,
Ouço, nesta mudez,
A força que te dobrou,
Serena, dizer quem Ă©s
E quem sou.

Vida

Do que a vida ĂȘ capaz!
A força dum alento verdadeiro!
O que um dedal de seiva faz
A rasgar o seu negro cativeiro !

Ser!
Parece uma renĂșncia que ali vai,
— E Ă© um carvalho a nascer
Da bolota que cai!

Ode

Eis-me nu e singelo!
Areia branca e o meu corpo em cima.
Um puro homem, natural e belo,
De carne que nĂŁo peca e que nĂŁo rima.

A linha do horizonte Ă© um nĂ­vel quieto;
As velas, de cansaço, adormeceram;
E penas brancas, que eram luto preto,
Perderam-se no azul de onde vieram.

Sol e frescura em toda a grande praia
Onde nĂŁo pode haver agricultura;
Esterilidade limpa, que nĂŁo caia
De pĂŁo e vinho a cĂłsmica fartura.

Dançam toninhas lĂșdicas no cĂ©u
Que visitam ligeiras e felizes;
Uma força sonùmbula as ergueu,
Mas seguras Ă  seiva das raĂ­zes.

Nem paz, nem guerra, nem desarmonia;
O sexo alegre, mas a repousar;
Um pleno, largo e caudaloso dia,
Sem horas e minutos a passar.

Vem até mim, onda que trazes vida!
Soro da redenção!
Vem como o sangue doutra mĂŁe pedida
Na hora de dar mundo ao coração!