Dúvida
Amas-me a mim? Perdoa,
É impossível! Não,
Não há quem se condoa
Da minha solidão.Como podia eu, triste,
Ah! inspirar-te amor
Um dia que me viste,
Se é que me viste… flor!Tu, bela, fresca e linda
Como a aurora, ou mais
Do que a aurora ainda,
Mal ouves os meus ais!Mal ouves, porque as aves
Só saltam de manhã
Seus cânticos suaves;
E tu és sua irmã!De noite apenas trina
O triste rouxinol:
Toda a mais ave inclina
O colo ao pôr do Sol.Porquê? Porque é ditosa!
Porquê? Porque é feliz!
E a que sorri a rosa?
Ao mesmo a que sorris…À luz dourada e pura
Do astro criador:
À noite, não, que é escura,
Causa-lhe a ela horror.Ora uma nuvem negra,
Uma pesada cruz,
Uma alma que se alegra
Só quando vê a luzDe que ele, o Sol, inunda
O mar, quando se põe,
Imagem moribunda
De um coração que foi…
Poemas sobre Galantes
4 resultadosPastelaria
Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escuraAfinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócioAfinal o que importa não é ser novo e galante
– ele há tanta maneira de compor uma estante!Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vícioNão é verdade, rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parolaQue afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que comeQue afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora! – rir de tudoNo riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra
Não!
Tenho-te muito amor,
E amas-me muito, creio:
Mas ouve-me, receio
Tomar-te desgraçada:
O homem, minha amada,
Não perde nada, goza;
Mas a mulher é rosa…
Sim, a mulher é flor!Ora e a flor, vê tu
No que ela se resume…
Faltando-lhe o perfume,
Que é a essência dela,
A mais viçosa e bela
Vê-a a gente e… basta.
Sê sempre, sempre, casta!
Terás quanto possuo!Terás, enquanto a mim
Me alumiar teu rosto,
Uma alma toda gosto,
Enlevo, riso, encanto!
Depois terás meu pranto
Nas praias solitárias…
Ondas tumultuárias
De lágrimas sem fim!À noite, que o pesar
Me arrebatar de cada,
Irei na campa rasa
Que resguardar teus ossos,
Ah! recordando os nossos
Tão venturosos dias,
Fazer-te as cinzas frias
Ainda palpitar!Mil beijos, doce bem,
Darei no pó sagrado,
Em que se houver tornado
Teu corpo tão galante!
Com pena, minha amante,
De não ter a morte
Caído a mim em sorte…
Caído em mim também!
Novas da Corte
As damas nunca parecem
os galantes poucos são
cousas de prazer esquecem
os negócios vêm e vão
nunca minguam, sempre crescem.
Não há já nenhum folgar
nem manhas exercitar
é tanto o requerimento
que ninguém não traz o tento
senão em querer medrar.Mil pessoas achareis
menos das que cá leixastes
doutras vos espantareis
porque vê-las não cuidastes
da maneira que vereis.
Uns acabam outros vem
e uns tem outros não tem
e os mais polo geral
folgam muito d’ouvir mal
e pouco de dizer bem.Se cá sois bem ensinado
cada feira valeis menos
e se mal sois estranhado
dous dias e logo vemos
ficardes mais estimado.
E vai isto de maneira
que na capela cadeira
d’espaldas tem escudeiros
e consentem-lh’os porteiros
estarem na dianteira.Anda tudo tão danado
que o que menos merece
se mostra mais agravado
e d’homens que não conhece
é el rei emportunado.
E estes que Deos padeça
hão de cobrir a cabeça
perant’ele no serão
e só por isso lá vão
sem haver quem os conheça.