Obscuro DomĂnio
Amar-te assim desvelado
entre barro fresco e ardor.
Sorver o rumor das luzes
entre os teus lábios fendidos.Deslizar pela vertente
da garganta, ser mĂşsica
onde o silĂŞncio aflui
e se concentra.IrreprimĂvel queimadura
ou vertigem desdobrada
beijo a beijo,
brancura dilaceradaPenetrar na doçura da areia
ou do lume,
na luz queimada
da pupila mais azul,no oiro anoitecido
entre pétalas cerradas,
no alto e navegável
golfo do desejo,onde o furor habita
crispado de agulhas,
onde faça sangrar
as tuas águas nuas.
Poemas sobre Garganta de Eugénio de Andrade
3 resultadosRosto Afogado
Para sempre um luar de naufrágio
anunciará a aurora fria.
Para sempre o teu rosto afogado,
entre retratos e vendedores ambulantes,
entre cigarros e gente sem destino,
flutuará rodeado de escamas cintilantes.Se me pudesse matar,
seria pela curva doce dos teus olhos,
pela tua fronte de bosque adormecido,
pela tua voz onde sempre amanhecia,
pelos teus cabelos onde o rumor da sombra
era um rumor de festa,
pela tua boca onde os peixes se esqueciam
de continuar a viagem nupcial.
Mas a minha morte Ă© este vaguear contigo
na parte mais débil do meu corpo,
com uma espinha de silĂŞncio
atravessada na garganta.Não sei se te procuro ou se me esqueço
de ti quando acaso me debruço
nuns olhos subitamente acesos
ao dobrar de uma esquina,
na boca dos anjos embriagados
de tanta solidĂŁo bebida pelos bares,
nas mĂŁos levemente adolescentes
poisadas na indolĂŞncia dos joelhos.
Quem me dirá que não é verdade
o teu rosto afogado, o teu rosto perdido,
de sombra em sombra, nas ruas da cidade?
Retrato Ardente
Entre os teus lábios
Ă© que a loucura acode
desce Ă garganta,
invade a água.No teu peito
Ă© que o pĂłlen do fogo
se junta Ă nascente,
alastra na sombra.Nos teus flancos
é que a fonte começa
a ser rio de abelhas,
rumor de tigre.Da cintura aos joelhos
Ă© que a areia queima,
o sol Ă© secreto,
cego o silĂŞncio.Deita-te comigo.
Ilumina meus vidros.
Entre lábios e lábios
toda a mĂşsica Ă© minha.