Poemas sobre Garra

3 resultados
Poemas de garra escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Só os Lábios Respiram

Só os lábios respiram. Simples gesto vivo,
exĂ­lio do som onde se oculta o pavor da
palavra, pátria salgada cerrada no vazio
da casa de velhos deuses ávidos de preces.
Na garra da águia se fecha e rompe a boca,
templo e entranha, prodĂ­gio e anel
do eco, sinal esparso do caĂ­do concerto
da vida. Por estes soberbos montes, estas
rasas colinas, estas águas circulantes,
vai o grito da cegueira, o delĂ­rio lasso
na manhĂŁ, a saciada loucura do escuro
nome nocturno. Como um fragor dos céus,
caminha o canto agudo das árduas cigarras
perseguindo a funesta morte. Por esta
paisagem parda, que lábios me guardam
do próximo desastre, a mudança em ave,
cio ou sal, erva ou peixe, cicatriz ou
mito, veia ou água? Que lábios respiram
na coisa mortal que serei apĂłs o termo
da eterna efemeridade deste meu corpo,
coma de luz, deste desejo, rijo resĂ­duo,
deste pensamento, disfarce ou máscara,
deste rapto do tempo, deste
coração que começa?

Partida

Ao ver escoar-se a vida humanamente
Em suas águas certas, eu hesito,
E detenho-me Ă s vezes na torrente
Das coisas geniais em que medito.

Afronta-me um desejo de fugir
Ao mistério que é meu e me seduz.
Mas logo me triunfo. A sua luz
Não há muitos que a saibam reflectir.

A minh’alma nostálgica de alĂ©m,
Cheia de orgulho, ensombra-se entretanto,
Aos meus olhos ungidos sobe um pranto
Que tenho a fôrça de sumir também.

Porque eu reajo. A vida, a natureza,
Que sĂŁo para o artista? Coisa alguma.
O que devemos Ă© saltar na bruma,
Correr no azul á busca da beleza.

É subir, é subir àlem dos céus
Que as nossas almas sĂł acumularam,
E prostrados resar, em sonho, ao Deus
Que as nossas mãos de auréola lá douraram.

É partir sem temor contra a montanha
Cingidos de quimera e d’irreal;
Brandir a espada fulva e medieval,
A cada hora acastelando em Espanha.

É suscitar côres endoidecidas,
Ser garra imperial enclavinhada,
E numa extrema-unção d’alma ampliada,

Continue lendo…

NĂŁo Fora o Mar!

NĂŁo fora o mar,
e eu seria feliz na minha rua,
neste primeiro andar da minha casa
a ver, de dia, o sol, de noite a lua,
calada, quieta, sem um golpe de asa.

NĂŁo fora o mar,
e seriam contados os meus passos,
tantos para viver, para morrer,
tantos os movimentos dos meus braços,
pequena angĂşstia, pequeno prazer.

NĂŁo fora o mar,
e os seus sonhos seriam sem violĂŞncia
como irisadas bolas de sabĂŁo,
efémero cristal, branca aparência,
e o resto — pingos de água em minha mão.

NĂŁo fora o mar,
e este cruel desejo de aventura
seria vaga mĂşsica ao sol pĂ´r
nem sequer brasa viva, queimadura,
pouco mais que o perfume duma flor.

NĂŁo fora o mar
e o longo apelo, o canto da sereia,
apenas ilusĂŁo, miragem,
breve canção, passo breve na areia,
desejo balbuciante de viagem.

NĂŁo fora o mar
e, resignada, em vez de olhar os astros
tudo o que Ă© alto, inacessĂ­vel, fundo,
cimos, castelos, torres, nuvens, mastros,
iria de olhos baixos pelo mundo.

Continue lendo…