Teu SĂł Sossego aqui Contigo Ausente
Teu sĂł sossego aqui contigo ausente
Na casa que te veste Ă justa de paredes,
Tenho-te em mĂłveis, nos perfumes, na semente
Dos cuidados que deixas ao partir,
A doce estância toda povoada
Dos mĂnimos sinais, dos sapatos de plinto
Que te elevam, TerpsĂcore ou MnemĂłsine,
Como uma estátua fiel ao labirinto.
Aqui, androceu da flor, o cálice abre aromas,
Farmácia chamo à tua colecção de vidros
Onde, Ă margem de planos e de somas,
Tenho remédio para os meus alvidros.
O chá é forte e adstringente,
O leite grosso sabe Ă ordenha,
E até nos quadros vive gente
Ă€ espera que a dona venha.
Porque tudo nos tectos Ă© coroa,
No chão as traînes, os passinhos salpicados
Como o vento ainda longe de Lisboa
Escolheu a gaivota do balanço
Que no cais engolfado melhor voa:
Um vácuo, enfim, que o não será — tão logo
Chegues no ar medido e a aço propulso:
Por isso um pouco de fogo
Bate sanguĂneo em meu pulso,
Pois o amor de quem espera
É uma graça a vencer.
Poemas sobre Longe de Vitorino Nemésio
3 resultadosMaio de Minha MĂŁe
O primeiro de Maio de minha MĂŁe
NĂŁo era social, mas de favas e giestas.
Uma cadeira de pau, flor dos dedos do AvĂ´
— Polimento, esquadria, engrade, olhá-la ao longe —
Dava assento a Florália, o meu primeiro amor.Já não se usa poesia descritiva,
Mas como hei-de falar da Maromba de Maio
Ou, se era macho, do litro de vinho na sua mĂŁo?
O primeiro de Maio nas Ilhas, morno como uma rosa,
Algodoado de cĂşmulos, lento no mar e rapioqueiro
Como Baco em Camões,
LĂmpido de azeviche
E, afinal de contas, do ponto de vista proletário,
Mais de mĂŁos na algibeira do que Lenine em Zurich.
(Porque foi por esta Ă©poca: eu Ă© que nĂŁo sabia!)A minha Maromba tinha barriga de palha como as massas
E a foice roçadoira da erva das cabras do Ribeiro
Que se pegou, esquecida, no banco do martelo de meu AvĂ´
Cujas quedas iguais, gravĂficas, profundasMuito prego em cunhal deixaram,
Muita madeira emalhetaram,
Muita estrela atraĂram ao bico da foice do Ribeiro
Nas noites de luar em que roçava erva às cabras.
Um Dia Ă© Pouco ao PĂ© de Margarida
A nossa intimidade a trĂŞs ou quatro Ă© constrangida.
Tenho medo no ângor e uma urtiga no pé.
Um dia é pouco ao pé de Margarida:
A ausĂŞncia Ă© menos sozinha,
A muita companhia dá bandos longe. Até
A vida
É
Se tua, já menos minha:
Se prĂłpria de meu, repartida,
Por muitos na atenção, nem tua é.
SĂł nossa solidĂŁo dual e penetrada
Evita o perigo do nada
A que, por condição, setas, as nossas pernas
Apontam na cavidade inexorável,
Fim de molécula qualquer.
Mas, entretanto, Margarida amável
Será flor, ou mulher?