Os Velhos
Todos nasceram velhos â desconfio.
Em casas mais velhas que a velhice,
em ruas que existiram sempre â sempre
assim como estĂŁo hoje
e nĂŁo deixarĂŁo nunca de estar:
soturnas e paradas e indeléveis
mesmo no desmoronar do JuĂzo Final.
Os mais velhos tĂȘm 100, 200 anos
e lĂĄ se perde a conta.
Os mais novos dos novos,
nĂŁo menos de 50 â enorm’idade.
Nenhum olha para mim.
A velhice o proĂbe. Quem autorizou
existirem meninos neste largo municipal?
Quem infrigiu a lei da eternidade
que não permite recomeçar a vida?
Ignoram-me. NĂŁo sou. Tenho vontade
de ser também um velho desde sempre.
Assim conversarĂŁo
comigo sobre coisas
seladas em cofre de subentendidos
a conversa infindĂĄvel de monossĂlabos, resmungos,
tosse conclusiva.
Nem me vĂȘem passar. NĂŁo me dĂŁo confiança.
Confiança! Confiança!
DĂĄdiva impensĂĄvel
nos semblantes fechados,
nos felpudos redingotes,
nos chapéus autoritårios,
nas barbas de milénios.
Sigo, seco e sĂł, atravessando
a floresta de velhos.
Poemas sobre Meninos de Carlos Drummond de Andrade
3 resultadosFamĂlia
TrĂȘs meninos e duas meninas,
sendo uma ainda de colo.
A cozinheira preta, a copeira mulata,
o papagaio, o gato, o cachorro,
as galinhas gordas no palmo de horta
e a mulher que trata de tudo.A espreguiçadeira, a cama, a gangorra,
o cigarro, o trabalho, a reza,
a goiabada na sobremesa de domingo,
o palito nos dentes contentes,
o gramofone rouco toda a noite
e a mulher que trata de tudo.O agiota, o leiteiro, o turco,
o mĂ©dico uma vez por mĂȘs,
o bilhete todas as semanas
branco! mas a esperança sempre verde.
A mulher que trata de tudo
e a felicidade.
O que se Passa na Cama
O que se passa na cama
Ă© segredo de quem ama.Ă segredo de quem ama
nĂŁo conhecer pela rama
gozo que seja profundo,
elaborado na terra
e tĂŁo fora deste mundo
que o corpo, encontrando o corpo
e por ele navegando,
atinge a paz de outro horto,
noutro mundo: paz de morto,
nirvana, sono do pénis.Ai, cama, canção de cuna,
dorme, menina, nanana,
dorme a onça suçuarana,
dorme a cĂąndida vagina,
dorme a Ășltima sirena
ou a penĂșltima… O pĂ©nis
dorme, puma, americana
fera exausta. Dorme, fulva
grinalda de tua vulva.
E silenciem os que amam,
entre lençol e cortina
ainda hĂșmidos de sĂ©men,
estes segredos de cama.