Eu, que sou feio…
Eu, que sou feio, sĂłlido, leal,
A ti, que és bela, frágil, assustada,
Quero estimar-te, sempre, recatada
Numa existência honesta, de cristal.Sentado à mesa dum café devasso.
Ao avistar-te, há pouco, fraca e loura.
Nesta Babel tĂŁo velha e corruptora,
Tive tenções de oferecer-te o braço.E, quando socorreste um miserável,
Eu que bebia cálices de absinto,
Mandei ir a garrafa, porque sinto
Que me tornas prestante, bom, saudável.«Ela aà vem!» disse eu para os demais;
E pus-me a olhar, vexado e suspirando,
O teu corpo que pulsa, alegre e brando,
Na frescura dos linhos matinais.Via-te pela porta envidraçada;
E invejava, – talvez nĂŁo o suspeites!-
Esse vestido simples, sem enfeites,
Nessa cintura tenra, imaculada.Ia passando, a quatro, o patriarca.
Triste eu saĂ. DoĂa-me a cabeça.
Uma turba ruidosa, negra, espessa,
Voltava das exéquias dum monarca.Adorável! Tu muito natural,
Seguias a pensar no teu bordado;
Avultava, num largo arborizado,
Uma estátua de rei num pedestal.
Poemas sobre Miseráveis de Cesário Verde
3 resultadosA DĂ©bil
Eu, que sou feio, sĂłlido, leal,
A ti, que és bela, frágil, assustada,
Quero estimar-te sempre, recatada
Numa existência honesta, de cristal.Sentado à mesa dum café devasso,
Ao avistar-te, há pouco, fraca e loura,
Nesta Babel tĂŁo velha e corruptora,
Tive tenções de oferecer-te o braço.E, quando socorreste um miserável,
Eu, que bebia cálices de absinto,
Mandei ir a garrafa, porque sinto
Que me tornas prestante, bom, saudável.“Ela aĂ vem!” disse eu para os demais;
E pus-me a olhar, vexado e suspirando,
O teu corpo que pulsa, alegre e brando,
Na frescura dos linhos matinais.Via-te pela porta envidraçada;
E invejava, — talvez que nĂŁo o suspeites! –
Esse vestido simples, sem enfeites,
Nessa cintura tenra, imaculada.Ia passando, a quatro, o patriarca.
Triste eu saĂ. DoĂa-me a cabeça.
Uma turba ruidosa, negra, espessa,
Voltava das exéquias dum monarca.Adorável! Tu, muito natural,
Seguias a pensar no teu bordado;
Avultava, num largo arborizado,
Uma estátua de rei num pedestal.Sorriam, nos seus trens,
ImpossĂvel
NĂłs podemos viver alegremente,
Sem que venham com fĂłrmulas legais,
Unir as nossas mĂŁos, eternamente,
As mĂŁos sacerdotais.Eu posso ver os ombros teus desnudos,
Palpá-los, contemplar-lhes a brancura,
E até beijar teus olhos tão ramudos,
Cor de azeitona escura.Eu posso, se quiser, cheio de manha,
Sondar, quando vestida, pra dar fé,
A tua camisinha de bretanha,
Ornada de crochet.Posso sentir-te em fogo, escandescida,
De faces cor-de-rosa e vermelhĂŁo,
Junto a mim, com langor, entredormida,
Nas noites de verĂŁo.Eu posso, com valor que nada teme,
Contigo preparar lautos festins,
E ajudar-te a fazer o leite-creme,
E os mélicos pudins.Eu tudo posso dar-te, tudo, tudo,
Dar-te a vida, o calor, dar-te cognac,
Hinos de amor, vestidos de veludo,
E botas de duraqueE até posso com ar de rei, que o sou!
Dar-te cautelas brancas, minha rola,
Da grande loteria que passou,
Da boa, da espanhola,Já vês, pois, que podemos viver juntos,
Nos mesmos aposentos confortáveis,
Comer dos mesmos bolos e presuntos,