Canção Póstuma
Fiz uma canção para dar-te;
porém tu já estavas morrendo.
A Morte Ă© um poderoso vento.
E Ă© um suspiro tĂŁo tĂmido, a Arte…É um suspiro tĂmido e breve
como o da respiração diária.
Choro de pomba. E a Morte é uma águia
cujo grito ninguém descreve.Vim cantar-te a canção do mundo,
mas estás de ouvidos fechados
para os meus lábios inexatos,
— atento a um canto mais profundo.E estou como alguém que chegasse
ao centro do mar, comparando
aquele universo de pranto
com a lágrima da sua face.E agora fecho grandes portas
sobre a canção que chegou tarde.
E sofro sem saber de que Arte
se ocupam as pessoas mortas.Por isso Ă© tĂŁo desesperada
a pequena, humana cantiga.
Talvez dure mais do que a vida.
Mas Ă Morte nĂŁo diz mais nada.
Poemas sobre Mortos de CecĂlia Meireles
3 resultadosLei
O que Ă© preciso Ă© entender a solidĂŁo!
O que Ă© preciso Ă© aceitar, mesmo, a onda amarga
que leva os mortos.O que Ă© preciso Ă© esperar pela estrela
que ainda não está completa.O que é preciso é que os olhos sejam cristal sem névoa,
e os lábios de ouro puro.O que é preciso é que a alma vá e venha;
e ouça a notĂcia do tempo,
e. entre os assombros da vida e da morte,
estenda suas diáfanas asas,
isenta por igual.
de desejo e de desespero.
MĂşsica
Noite perdida,
nĂŁo te lamento:
embarco a vidano pensamento,
busco a alvorada
do sonho isento,puro e sem nada,
– rosa encarnada,
intacta, ao vento.Noite perdida,
noite encontrada,
morta, vivida,e ressuscitada…
(Asa da lua
quase parada,mostra-me a sua
sombra escondida,
que continuaa minha vida
num chĂŁo profundo!
– raiz prendidaa um outro mundo.)
Rosa encarnada
do sonho isento,muda alvorada
que o pensamento
deixa confiadaao tempo lento…
Minha partida,
minha chegada,Ă© tudo vento…
Ai da alvorada!
Noite perdida,
noite encontrada…