O Homem que LĂŞ
Eu lia há muito. Desde que esta tarde
com o seu ruĂdo de chuva chegou Ă s janelas.
AbstraĂ-me do vento lá fora:
o meu livro era difĂcil.
Olhei as suas páginas como rostos
que se ensombram pela profunda reflexĂŁo
e em redor da minha leitura parava o tempo. —
De repente sobre as páginas lançou-se uma luz
e em vez da tĂmida confusĂŁo de palavras
estava: tarde, tarde… em todas elas.
Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já
as longas linhas, e as palavras rolam
dos seus fios, para onde elas querem.
EntĂŁo sei: sobre os jardins
transbordantes, radiantes, abriram-se os céus;
o sol deve ter surgido de novo. —
E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança:
o que está disperso ordena-se em poucos grupos,
obscuramente, pelos longos caminhos vĂŁo pessoas
e estranhamente longe, como se significasse algo mais,
ouve-se o pouco que ainda acontece.E quando agora levantar os olhos deste livro,
nada será estranho, tudo grande.
AĂ fora existe o que vivo dentro de mim
e aqui e mais além nada tem fronteiras;
Poemas sobre Noite de Rainer Maria Rilke
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SolidĂŁo
A solidĂŁo Ă© como uma chuva.
Ergue-se do mar ao encontro das noites;
de planĂcies distantes e remotas
sobe ao céu, que sempre a guarda.
E do cĂ©u tomba sobre a cidade.Cai como chuva nas horas ambĂguas,
quando todas as vielas se voltam para a manhĂŁ
e quando os corpos, que nada encontraram,
desiludidos e tristes se separam;
e quando aqueles que se odeiam
tĂŞm de dormir juntos na mesma cama:entĂŁo, a solidĂŁo vai com os rios…
Tradução de Maria João Costa Pereira