Poemas sobre Passado de Hilda Hilst

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Poemas de passado de Hilda Hilst. Leia este e outros poemas de Hilda Hilst em Poetris.

Tateio

Tateio. A fronte. O braço. O ombro.
O fundo sortilégio da omoplata.
Matéria-menina a tua fronte e eu
Madurez, ausĂŞncia nos teus claros
Guardados.

Ai, ai de mim. Enquanto caminhas
Em lúcida altivez, eu já sou o passado.
Esta fronte que Ă© minha, prodigiosa
De nĂşpcias e caminho
É tão diversa da tua fronte descuidada.

Tateio. E a um sĂł tempo vivo
E vou morrendo. Entre terra e água
Meu existir anfĂ­bio. Passeia
Sobre mim, amor, e colhe o que me resta:
Noturno girassol. Rama secreta.

A Vida Ă© LĂ­quida

É crua a vida. Alça de tripa e metal.
Nela despenco: pedra mĂłrula ferida.
É crua e dura a vida. Como um naco de víbora.
Como-a no livro da lĂ­ngua
Tinta, lavo-te os antebraços, Vida, lavo-me
No estreito-pouco
Do meu corpo, lavo as vigas dos ossos, minha vida
Tua unha pĂşmblea, me casaco rosso
E perambulamos de coturno pela rua
Rubras, gĂłticas, altas de corpo e copos.
A vida Ă© crua. Faminta como o bico dos corvos.
E pode ser tão generosa e mítica: arroio, lágrima
Olho d’água, bebida. A vida é liquída.

Também são cruas e duras as palavras e as caras
Antes de nos sentarmos Ă  mesa, tu e eu, Vida
Diante do coruscante ouro da bebida. Aos poucos
Vão se fazendo remansos, lentilhas d’água, diamantes
Sobre os insultos do passado e do agora. Aos poucos
Somos duas senhoras, encharcadas de riso, rosadas
De um amora, um que entrevi no teu hálito, amigo
Quando me permitiste o paraĂ­so. O sinistro das horas
Vai se fazendo olvido. Depois deitadas, a morte
É um rei que nos visita e nos cobre de mirra.

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