Viola Chinesa
Ao longo da viola morosa
Vai adormecendo a parlenda,
Sem que, amadornado, eu atenda
A lengalenga fastidiosa.Sem que o meu coração se prenda,
Enquanto, nasal, minuciosa,
Ao longo da viola morosa,
Vai adormecendo a parlenda.Mas que cicatriz melindrosa
Há nele, que essa viola ofenda
E faz que as asitas distenda
Numa agitação dolorosa?Ao longo da viola, morosa…
Poemas sobre Prendas
8 resultadosDeus é a Nossa Mulher-a-Dias
Deus é a nossa
mulher-a-dias
que nos dá prendas
que deitamos fora
como a vida
porque achamos
que não prestaDeus é a nossa
mulher-a-dias
que nos dá prendas
que deitamos fora
como a fé
porque achamos
que é pirosa
Canção
A pastorinha morreu, todos estão a chorar. Ninguem a conhecia e todos estão a chorar.
A pastorinha morreu, morreu de seus amôres. Á beira do rio nasceu uma arvore e os braços da arvore abriram-se em cruz.
As suas mãos compridas já não acenam de alêm. Morreu a pastorinha e levou as mãos compridas.
Os seus olhos a rirem já não troçam de ninguem. Morreu a pastorinha e os seus olhos a rirem.
Morreu a pastorinha, está sem guia o rebanho. E o rebanho sem guia é o enterro da pastorinha.
Onde estão os seus amôres? Ha prendas para Lhe dar. Ninguem sabe se é Elle e ha prendas para Lhe dar.
Na outra margem do rio deu á praia uma santa que vinha das bandas do mar. Vestida de pastora p’ra se não fazer notar. De dia era uma santa, à noite era o luar.
A pastorinha em vida era uma linda pastorinha; a pastorinha mórta é a Senhora dos Milagres.
O Natal de Minha Mãe
A abstracção não precisa de mãe nem pai
nem tão pouco de tão tolo infantemas o natal de minha mãe é ainda o meu natal
com restos de Beira Altaano após ano via surgir figura nova nesse
presépio de vaca burro banda de músicaribeiro com patos farrapos de algodão muito
musgo percorrido por ovelhas e pastoresmultidão de gente judaizante estremenha pela
mão de meu pai descendo de montes contandomoedas azenhas movendo água levada pela estrela
de Belémum galo bate as asas um frade está de acordo
com a nossa circuncisão galinhas debicam milhode mistura com um porco a que minha avó juntava
sempre um gato para dar sorte era pretoassim íamos todos naquela figuração animada
até ao dia de Reis aí estãoum de joelhos outro em pé
e o rei preto vinha sentado nocamelo. Era o mais bonito.
depois eram filhoses o acordar de prenda nosapato tudo tão real como o abrir das lojas no dia
de feirae eu ia ao Sanguinhal visitar a minha prima que
tinha um cavalo debaixo do quartosubindo de vales descendo de montes
acompanhando a banda do carvalhal com ferrinhose roucas trompas o meu Natal é ainda o Natal de
minha mãe com uns restos de canela e Beira Alta.
Descante
Nunca te pedirei
o que não possas dar,
ai — pedir sombra ao sol,
doçura ao mar?Tampouco pedirei
mimo que não tenha preço,
ai — de pobre que sou
bem me conheço.Não saberia aliás
que prenda acrescentar,
brilho ao sol, talvez,
salina ao mar…E nem te valeria
a espera na promessa,
ai — eterno é o que passa
mais depressa.
Do meu vagar
Já não há mais o vagar
de quando se comia sentado
e devagar se caminhava
até chegar a qualquer lado
agora vai toda a gente
sempre de mão na buzina
sempre na linha da frente
a tremer de adrenalinaDo meu vagar não traço rotas
não tenho trilho que me prenda
não tiro dados nem notas
não encho uma linha de agenda
do meu vagar não chego a Meca
não faço nada num só dia
não corto a fita da meta
não vejo Roma nem PaviaDo meu vagar
sei que nunca hei-de ir longe
vou aonde for preciso
vou indo do meu vagar
em busca do tempo perdido
e se um dia o encontrar
o longe não faz sentidoDo meu vagar há um nicho
um pico de ilha insubmersa
onde há lugar para o capricho
que dá pelo nome de conversa
do meu vagar a paisagem
ainda tem beleza em bruto
e vale mais uma palavra
que mil imagens por minutoDo meu vagar
sei que nunca hei-de ir longe
vou aonde for preciso
vou indo do meu vagar
em busca do tempo perdido
e se um dia o encontrar
o longe não faz sentido
Bom é Sorrires
Bom é sorrires, olhar
em mim: não vês
o inimigo, o rival
jamais.
Na caça, não serás
a presa; não serás,
no jogo, a prenda.
Partilharemos, sem meias
medidas,
a espera, o arroubo, o gesto,
o salto, o pouso e o sono
e o gosto desse rir
dentro e fora do tempo
sempre que nova
mente
acordares
Os Amantes
Amor, é falso o que dizes;
Teu bom rosto é contrafeito;
Busca novos infelizes
Que eu inda trago no peito
Mui frescas as cicatrizes;O teu meu é mel azedo,
Não creio em teu gasalhado,
Mostras-me em vão rosto ledo;
Já estou muito escaldado,
Já d’águas frias hei medo.Teus prémios são pranto e dor;
Choro os mal gastados anos
Em que servi tal senhor,
Mas tirei dos teus enganos
O sair bom pregador.Fartei-te assaz a vontade;
Em vãos suspiros e queixas
Me levaste a mocidade,
E nem ao menos me deixas
Os restos da curta idade?És como os cães esfaimados
Que, comendo os troncos quentes
Por destro negro esfolados,
Levam nos ávidos dentes
Os ossos ensanguentados.Bem vejo a aljava dourada
Os ombros nus adornar-te;
Amigo, muda de estrada,
Põe a mira em outra parte
Que daqui não tiras nada.Busca algum fofo morgado
Que, solto já dos tutores,
Ao domingo penteado,
Vá dizendo à toa amores
Pelas pias encostado;