Poemas sobre Repente de Fernando Pessoa

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Poemas de repente de Fernando Pessoa. Leia este e outros poemas de Fernando Pessoa em Poetris.

Teus Olhos Entristecem

Teus olhos entristecem
Nem ouves o que digo.
Dormem, sonham esquecem…
NĂŁo me ouves, e prossigo.

Digo o que jĂĄ, de triste,
Te disse tanta vez…
Creio que nunca o ouviste
De tĂŁo tua que Ă©s.

Olhas-me de repente
De um distante impreciso
Com um olhar ausente.
Começas um sorriso.

Continuo a falar.
Continuas ouvindo
O que estĂĄs a pensar,
JĂĄ quase nĂŁo sorrindo.

Até que neste ocioso
Sumir da tarde fĂștil,
Se esfolha silencioso
O teu sorriso inĂștil.

O Maestro Sacode a Batuta

O maestro sacode a batuta,
A lĂąnguida e triste a mĂșsica rompe …

Lembra-me a minha infĂąncia, aquele dia
Em que eu brincava ao pé dum muro de quintal
Atirando-lhe com, uma bola que tinha dum lado
O deslizar dum cĂŁo verde, e do outro lado
Um cavalo azul a correr com um jockey amarelo …

Prossegue a mĂșsica, e eis na minha infĂąncia
De repente entre mim e o maestro, muro branco,
Vai e vem a bola, ora um cĂŁo verde,
Ora um cavalo azul com um jockey amarelo…

Todo o teatro Ă© o meu quintal, a minha infĂąncia
EstĂĄ em todos os lugares e a bola vem a tocar mĂșsica,
Uma mĂșsica triste e vaga que passeia no meu quintal
Vestida de cĂŁo verde tornando-se jockey amarelo…
(TĂŁo rĂĄpida gira a bola entre mim e os mĂșsicos…)

Atiro-a de encontra Ă  minha infĂąncia e ela
Atravessa o teatro todo que estå aos meus pés
A brincar com um jockey amarelo e um cĂŁo verde
E um cavalo azul que aparece por cima do muro
Do meu quintal…

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Sorriso AudĂ­vel das Folhas

Sorriso audĂ­vel das folhas
NĂŁo Ă©s mais que a brisa ali
Se eu te olho e tu me olhas,
Quem primeiro Ă© que sorri?
O primeiro a sorrir ri.

Ri e olha de repente
Para fins de nĂŁo olhar
Para onde nas folhas sente
O som do vento a passar
Tudo é vento e disfarçar.

Mas o olhar, de estar olhando
Onde nĂŁo olha, voltou
E estamos os dois falando
O que se nĂŁo conversou
Isto acaba ou começou?

Mensagem – Mar PortuguĂȘs

MAR PORTUGUÊS

Possessio Maris

I. O Infante

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, jĂĄ nĂŁo separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.

Quem te sagrou criou-te portuguĂȘs.
Do mar e nĂłs em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!

II. Horizonte

Ó mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
’Splendia sobre as naus da iniciação.

Linha severa da longínqua costa —
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em ĂĄrvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, hĂĄ aves,

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O Infante

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, jĂĄ nĂŁo separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.

Quem te sagrou criou-te portuguĂȘs.
Do mar e nĂłs em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!

Abismo

Olho o Tejo, e de tal arte
Que me esquece olhar olhando,
E sĂșbito isto me bate
De encontro ao devaneando —
O que é sério, e correr?
O que Ă© estĂĄ-lo eu a ver?

Sinto de repente pouco,
VĂĄcuo, o momento, o lugar.
Tudo de repente Ă© oco —
Mesmo o meu estar a pensar.
Tudo — eu e o mundo em redor —
Fica mais que exterior.

Perde tudo o ser, ficar,
E do pensar se me some.
Fico sem poder ligar
Ser, idéia, alma de nome
A mim, Ă  terra e aos cĂ©us…

E sĂșbito encontro Deus.

Em Plena Vida e ViolĂȘncia

Em plena vida e violĂȘncia
De desejo e ambição,
De repente uma sonolĂȘncia
Cai sobre a minha ausĂȘncia.
Desce ao meu próprio coração.

SerĂĄ que a mente, jĂĄ desperta
Da noção falsa de viver,
VĂȘ que, pela janela aberta,
HĂĄ uma paisagem toda incerta
E um sonho todo a apetecer ?