Poemas sobre VolĂșpia

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Poemas de volĂșpia escritos por poetas consagrados, filĂłsofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

LĂșcia

(Alfred de Musset)

NĂłs estĂĄvamos sĂłs; era de noite;
Ela curvara a fronte, e a mĂŁo formosa,
Na embriaguez da cisma,
TĂȘnue deixava errar sobre o teclado;
Era um murmĂșrio; parecia a nota
De aura longĂ­nqua a resvalar nas balsas
E temendo acordar a ave no bosque;
Em torno respiravam as boninas
Das noites belas as volĂșpias mornas;
Do parque os castanheiros e os carvalhos
Brando embalavam orvalhados ramos;
OuvĂ­amos a noite, entre-fechada,
A rasgada janela
Deixava entrar da primavera os bĂĄlsamos;
A vĂĄrzea estava erma e o vento mudo;
Na embriaguez da cisma a sĂłs estĂĄvamos
E tĂ­nhamos quinze anos!

LĂșcia era loura e pĂĄlida;
Nunca o mais puro azul de um céu profundo
Em olhos mais suaves refletiu-se.
Eu me perdia na beleza dela,
E aquele amor com que eu a amava – e tanto ! –
Era assim de um irmĂŁo o afeto casto,
Tanto pudor nessa criatura havia!

Nem um som despertava em nossos lĂĄbios;
Ela deixou as suas mĂŁos nas minhas;
TĂ­bia sombra dormia-lhe na fronte,

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O Amor e a Morte

Canção cruel

Corpo de Ăąnsia.
Eu sonhei que te prostrava,
E te enleava
Aos meus mĂșsculos!

Olhos de ĂȘxtase,
Eu sonhei que em vĂłs bebia
Melancolia
De hå séculos!

Boca sĂŽfrega,
Rosa brava
Eu sonhei que te esfolhava
Pétala a pétala!

Seios rĂ­gidos,
Eu sonhei que vos mordia
Até que sentia
VĂłmitos!

Ventre de mĂĄrmore,
Eu sonhei que te sugava,
E esgotava
Como a um cĂĄlice!

Pernas de estĂĄtua,
Eu sonhei que vos abria,
Na fantasia,
Como pĂłrticos!

PĂ©s de sĂ­lfide,
Eu sonhei que vos queimava
Na lava
Destas mĂŁos ĂĄvidas!

Corpo de Ăąnsia,
Flor de volĂșpia sem lei!
NĂŁo te apagues, sonho! mata-me
Como eu sonhei.

A Elvira

(Lamartine)

Quando, contigo a sĂłs, as mĂŁos unidas,
Tu, pensativa e muda; e eu, namorado,
Às volĂșpias do amor a alma entregando,
Deixo correr as horas fugidias;
Ou quando ‘as solidĂ”es de umbrosa selva
Comigo te arrebato; ou quando escuto
—Tão só eu, — teus terníssimos suspiros;
E de meus lĂĄbios solto
Eternas juras de constĂąncia eterna;
Ou quando, enfim, tua adorada fronte
Nos meus joelhos trĂȘmulos descansa,
E eu suspendo meus olhos em teus olhos,
Como Ă s folhas da rosa ĂĄvida abelha;
Ai, quanta vez entĂŁo dentro em meu peito
Vago terror penetra, como um raio!
Empalideço, tremo;
E no seio da glĂłria em que me exalto,
LĂĄgrimas verto que a minha alma assombram!
Tu, carinhosa e trĂȘmula,
Nos teus braços me cinges, — e assustada,
Interrogando em vĂŁo, comigo choras!
“Que dor secreta o coração te oprime?”
Dizes tu, “Vem, confia os teus pesares…
Fala! eu abrandarei as penas tuas!
Fala! Eu consolarei tua alma aflita.”

Vida do meu viver, nĂŁo me interrogues!
Quando enlaçado nos teus níveos braços*
A confissão de amor te ouço,

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O Poema Ensina a Cair

O poema ensina a cair
sobre os vĂĄrios solos
desde perder o chão repentino sob os pés
como se perde os sentidos numa
queda de amor, ao encontro
do cabo onde a terra abate e
a fecunda ausĂȘncia excede

até à queda vinda
da lenta volĂșpia de cair,
quando a face atinge o solo
numa curva delgada subtil
uma vénia a ninguém de especial
ou especialmente a nĂłs uma homenagem
pĂłstuma.

Poema da Auto-estrada

Voando vai para a praia
Leonor na estrada preta.
Vai na brasa, de lambreta.

Leva calçÔes de pirata,
Vermelho de alizarina,
modelando a coxa fina
de impaciente nervura.
Como guache lustroso,
amarelo de indantreno,
blusinha de terileno
desfraldada na cintura.

Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa, de lambreta.

Agarrada ao companheiro
na volĂșpia da escapada
pincha no banco traseiro
em cada volta da estrada.
Grita de medo fingido,
que o receio nĂŁo Ă© com ela,
mas por amor e cautela
abraça-o pela cintura.
Vai ditosa, e bem segura.

Como um rasgĂŁo na paisagem
corta a lambreta afiada,
engole as bermas da estrada
e a rumorosa folhagem.
Urrando, estremece a terra,
bramir de rinoceronte,
enfia pelo horizonte
como um punhal que se enterra.
Tudo foge Ă  sua volta,
o céu, as nuvens, as casas,
e com os bramidos que solta
lembra um demĂłnio com asas.

Na confusĂŁo dos sentidos
jĂĄ nem percebe, Leonor,
se o que lhe chega aos ouvidos
sĂŁo ecos de amor perdidos
se os rugidos do motor.

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II Bacio

O Beijo! malva-rosa em jardim de carĂ­cias!
Vivo acompanhamento no piano dos dentes
Dos refrĂŁos que Amor canta nas almas ardentes
Com a sua voz de arcanjo em lĂąnguidas delĂ­cias!

Divino e gracioso Beijo, tĂŁo sonoro!
VolĂșpia singular, ĂĄlcool inenarrĂĄvel!
O homem, debruçado na taça adoråvel,
Deleita-se em venturas que nunca se esgotam.

Como o vinho do Reno e a mĂșsica, embalas
E consolas a mĂĄgoa, que expira em conjunto
Com os lĂĄbios amuados na prega purpĂșrea…
Que um maior, Goethe ou Will, te erga um verso clĂĄssico.

Quanto a mim, trovador franzino de Paris,
Só te ofereço um bouquet de estrofes infantis:
SĂȘ benĂ©volo e desce aos lĂĄbios insubmissos
De Uma que eu bem conheço, Beijo, e neles ri.

Tradução de Fernando Pinto do Amaral

DivĂłrcio

Cidade muda, rente a meu lado,
Como um fantasma sob a neblina…
HĂĄ cem mil rostos. Tanto soldado
E tanto abraço desesperado
Nesta cidade tĂŁo masculina!

Cidade muda como um soldado.

Cidade cega. Todos os dias,
A nossa vida fica mais breve,
As nossas mĂŁos ficam mais frias…
Todos os dias, todos os dias,
A morte paga, paga a quem deve.

Cidade cega todos os dias.

Cidade oblĂ­qua. Sexo pesado.
Rio de cinza, lĂșgubre e lento…
Bandeira negra, barco parado,
Nunca o teu nome foi baptizado
Nem o teu beijo foi casamento!

Cidade minha, do meu pecado…

Cidade estranha, sabes que existo?
Os homens passam… Para onde vĂŁo?
SĂł tem amores quem nĂŁo for visto.
Por isso canto, sĂł porque insisto
Em dar combates à tentação.

Oh! a volĂșpia de nĂŁo ser visto!

Nossa MemĂłria

Nossa memĂłria sempre foi a memĂłria
dos monstros nosso enigmĂĄtico testamento
de altas labaredas sempre foi
o caminho
devastado pelo sangue pela circuncisa memĂłria
dos mortos pelo perfil
dos astros — nossa colorida volĂșpia
sempre foi dos monstros
a mais crua linguagem hĂșmida fuga
desolada
através do tempo através do medo
de nĂŁo sermos belos de nĂŁo sabermos
esculpir na cinza o sopro
de tanta luz tão prostituída —

Visio

Eras pĂĄlida. E os cabelos,
AĂ©reos, soltos novelos,
Sobre as espĂĄduas caĂ­am…
Os olhos meio cerrados
De volĂșpia e de ternura
Entre lĂĄgrimas luziam…
E os braços entrelaçados,
Como cingindo a ventura,
Ao teu seio me cingiam…

Depois, naquele delĂ­rio,
Suave, doce martĂ­rio
De pouquĂ­ssimos instantes,
Os teus lĂĄbios sequiosos,
Frios, trĂȘmulos, trocavam
Os beijos mais delirantes,
E no supremo dos gozos
Ante os anjos se casavam
Nossas almas palpitantes…

Depois… depois a verdade,
A fria realidade,
A solidĂŁo, a tristeza;
Daquele sonho desperto,
Olhei… silĂȘncio de morte
Respirava a natureza —
Era a terra, era o deserto,
Fora-se o doce transporte,
Restava a fria certeza.

Desfizera-se a mentira:
Tudo aos meus olhos fugira;
Tu e o teu olhar ardente,
LĂĄbios trĂȘmulos e frios,
O abraço longo e apertado,
O beijo doce e veemente;
Restavam meus desvarios,
E o incessante cuidado,
E a fantasia doente.

E agora te vejo. E fria
TĂŁo outra estĂĄs da que eu via
Naquele sonho encantado!

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Alegria

De passadas tristezas, desenganos
amarguras colhidas em trinta anos,
de velhas ilusÔes,
de pequenas traiçÔes
que achei no meu caminho…,
de cada injusto mal, de cada espinho
que me deixou no peito a nĂłdoa escura

duma nova amargura…
De cada crueldade
que pĂŽs de luto a minha mocidade…
De cada injusta pena
que um dia envenenou e ainda envenena
a minha alma que foi tranquila e forte…
De cada morte
que anda a viver comigo, a minha vida,
de cada cicatriz,
eu fiz
nem tristeza, nem dor, nem nostalgia
mas herĂłica alegria.

Alegria sem causa, alegria animal
que nenhum mal
pode vencer.
Doido prazer
de respirar!
VolĂșpia de encontrar
a terra honesta sob os pés descalços.

Prazer de abandonar os gestos falsos,
prazer de regressar,
de respirar
honestamente e sem caprichos,
como as ervas e os bichos.
Alegria voluptuosa de trincar
frutos e de cheirar rosas.

Alegria brutal e primitiva
de estar viva,
feliz ou infeliz
mas bem presa Ă  raĂ­z.

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